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{ ARTIGO }

Conversas de ½ minuto

Escritor e jurista José Paulo Cavalcanti Filho conta boas histórias envolvendo jornalistas, do Brasil e de Portugal

José Paulo Cavalcanti Filho, escritor, membro da Academia Brasileira de Letras (ABL) e colaborador do Espaço Democrático

Edição: Scriptum

 

Lisboa. Lembro conversas de livro que estou escrevendo (Conversas de ½ minuto).

Álvaro Maia, chefe da secção Estrangeiro no Diário de Notícias, de Lisboa. Em 18 de novembro de 1922 morreu, na distante Paris, Marcel Proust, consagrado autor de À la recherche du temps perdu (Em busca do tempo perdido). De pneumonia, com só 51 anos, e logo enterrado no Père Lachaise. Dia seguinte, à noitinha, chega no jornal informação suscinta da agência Havas:

– Morreu o romancista Marcel Proust, que obteve o prêmio Goncourt em 1919 (não constava da notícia, mas foi por seu romance À sombra das raparigas em flor).

Ocorre que Proust era, na época, um desconhecido em Portugal. E o jornalista Acúrcio Pereira, famoso por seu “temperamento irascível” (palavras do mestre António Valdemar, no artigo Proust em Portugal), acreditou tratar-se de Marcel Prévost (autor de Demi-vierges et les anges gardiens). Decidindo os dois, ele e Maia, noticiar a morte de Prévost. Para isso, transcreveram o texto da agência com um complemento

– Onde se lê Proust, deve-se ler Prévost. Se assim é, a França perde um dos seus romancistas mais estimados.

Na manhã seguinte, os telégrafos confirmaram a morte de Proust. Notícia boa, para Prévost, que morreria só em 1941. E Álvaro Maia consertou a rata da véspera dando, em primeira página, essa manchete:

Marcel Prévost não morreu.

Mais, no meio do jornal, modesta referência ao pobre do Proust: “O falecido romancista tem um estilo que se embrulha e ninguém entende”.

Por essas e outras, dizia Fernando Pessoa (Álvaro de Campos, Manifesto), da imprensa de sua época:

– Ora porra!

Então a imprensa portuguesa é

que é a imprensa portuguesa?

Então é esta merda que temos

que beber com os olhos?

Filhos da puta! Não, que nem

há puta que os parisse.

 

Barbosa Lima Sobrinho, presidente da ABI. Sempre que nos encontrávamos:

– Como vai?, dr. Barbosa.

E ele, invariavelmente:

– Como um velho (morreu com 103 anos), meu filho, desejando que todos os órgãos envelheçam ao mesmo tempo.

 

Carlos Alberto Sardenberg, jornalista. No Clube dos Ingleses, depois do tênis, os jogadores conversavam. Ele:

– O homem precisa de mulher para tudo.

E Betina, do grupo, completou:

– Até pra ser corno.

 

Duda Guennes, filósofo. Inauguração do supermercado Pingo Doce, no Rato, pertinho de seu apartamento na Rua da Alegria. Foi cobrir o evento, como jornalista de A Bola, e o diretor do estabelecimento:

– O que está a achar?

– Muito bom. Porque tem tudo que não preciso.

 

João Alberto Sobral, cronista. O fotógrafo Pedro Luiz, por sugestão de João Alberto, bateu retrato de certa dama. Quando foi entregar, dia seguinte, soube que havia morrido na noite anterior. A história passou a ser conhecida, nos jornais. Certo dia, chega cidadão e pede:

– Quero lhe contratar para tirar uma foto de minha sogra.

 

Por falar em sogras o jornal Poder, edição de 27 de abril de 2022, deu manchete sobre Francisco:

– O Papa elogia as sogras.

Mais, por baixo, esse comentário

– É porque ele nunca teve uma.

 

O que faz lembrar Cantoria de Pé de Parede em que o grande Louro Branco recebeu mote, Na casa que sogra mora/ Não tem um genro feliz, e cantou assim:

Minha sogra sem respaldo

Diz nos pensamentos seus

Que meus filhos não são meus

Que tem um do Lourinaldo.

Que o primeiro é de Geraldo

E o segundo é de Diniz.

Será meu Deus que eu não fiz

Um menino até agora?

Na casa que sogra mora

Não tem um genro feliz!

 

José Nêumanne Pinto, jornalista. Chegou para conversar com o paraibano (como ele) José Amer… Aqui um problema, que todos se referem a esse grande escritor apenas como Zé 3 Pancadas. Dado que pronunciar seu nome completo é prenúncio de catástrofe. Toda gente conhece a praga. Se o amigo leitor ainda não sabe de quem se trata basta procurar, na internet, quem seria o autor de A bagaceira. Nêumanne:

‒ Como nasceu essa relação entre você e o azar?

‒ Acho até graça. O avião caiu no mar e eu já quase cego, e aleijado, fiquei sentadinho na asa. Enquanto Antenor Navarro, campeão de natação, afundou. E dizem, ainda, que sou azarado…

‒ Não, Zé, dizem que você dá é azar nos outros.

‒ Aí pode ser.

 

Maria Luiza Borges, jornalista. No Vaticano, sala Paulo VI, ela e a mãe, a grande Mariêta Borges (em cadeira de rodas). Tudo para ver Francisco. Informaram que os cadeirantes iriam para a primeira fila; e seus acompanhantes, que receberiam laços vermelhos, ficariam ao lado. Dando-se que notório deputado estadual de Pernambuco, então presidente da Assembleia Legislativa, apossou-se da cadeira de Mariêta e disparou, até lá, na esperança de bater foto com o Papa. Foi quando Maria Luiza saiu correndo atrás dele, aos berros,

– Devolva minha mãe!, devolva minha mãe!.

 

Nelson Cunha, jornalista. No teatro Aliança Francesa, Raul Cortez interpretava um vip de São Paulo. Sentado em poltrona, o ator pegou o Estadão e disse:

– Vou ver quem morreu.

Foi quando alguém junto de Nelson, na plateia, gritou:

– Hoje não morreu ninguém.

 

Olbiano Silveira, jornalista e editor. Seu avô, Vicente Januário, tinha uma bodega na periferia de Mossoró (RN), especializada em fumo de rolo. Certo dia chegou por lá dona Etelvina, cliente antiga,

– Seu Vicente, o sinhô tem fumo dos forte?

O velho entregou uma nasca, para ela provar.

– Descurpe, tem mais forte?

Só que, depois de mastigar, soltou um pum daqueles históricos, monumentais. Como se não fosse a responsável, continuou

– Será que tem ainda mais forte?

– Não, senhora, o de cagar já acabou.

 

Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de as diversas tendências do pensamento contemporâneo. estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir


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