Texto Estação do Autor com Folha de S.Paulo
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Ainda que seja um dos líderes mundiais em transplantes, o Brasil enfrenta altas taxas de recusa e outros obstáculos para a doação de órgãos. São cerca de 3.000 mortes anuais de pessoas que aguardam por esse procedimento. No primeiro semestre deste ano, foram 1.793 mortes, incluindo 46 crianças. A discordância familiar é uma das principais razões para a não doação de órgãos no País agravada pela falta de preparo das equipes médicas.
Reportagem de Cláudia Collucci para a Folha de S.Paulo (assinantes) informa que em 2023 o Brasil realizou apenas um quarto dos transplantes cardíacos necessários. Isso significa que 138 pacientes morreram enquanto esperavam por um coração novo.
De janeiro a junho, foram feitos 4.579 transplantes, 8.260 de córnea e 1.613 de medula óssea. Até junho, 64.265 adultos e 1.284 crianças estavam na lista de espera do Sistema Nacional de Transplantes, segundo dados da ABTO (Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos).
Para Rafael Paim, presidente da Adote (Aliança Brasileira pela Doação de Órgãos e Tecidos), fatores envolvidos na recusa familiar poderiam ser evitados com algumas medidas entre elas reduzir a demora na liberação do corpo. Segundo ele, alguns centros de transplante fazem acordos com os familiares dando garantias de que o corpo será liberado em até 24 horas. Caso contrário, eles podem voltar atrás no processo de doação.
O médico Valter Garcia, da Santa Casa de Porto Alegre (RS) e um dos fundadores da ABTO, entende que a decisão é dramática para as famílias. Questões como percepções negativas sobre o processo e o atendimento no hospital influenciam a decisão. O treino adequado da equipe médica é essencial para garantir uma abordagem positiva.
Existem ainda outros fatores que prejudicam o número de transplantes no País, como a detecção da morte encefálica. A taxa no Brasil está entre 100 e 110 dessas mortes por milhão de população. A meta é que, em seis anos, o País atinja 77 mortes por milhão.
Uma iniciativa para tentar agilizar as doações é a Aedo (Autorização Eletrônica de Doação de Órgãos), lançada em abril. Em três meses de funcionamento, mais de 7.000 pessoas se inscreveram como doadoras. Porém, 55% delas não havia concluído o registro até julho.
A falta de estrutura dos hospitais para atender as regras do CFM (Conselho Federal de Medicina) na determinação de morte encefálica é um dos entraves que levam à subnotificação dos casos, afirma Garcia. Por exemplo, é preciso ter dois especialistas, com experiência e capacitação específica, e acesso a exames de imagens, como o doppler, e profissionais treinados para interpretá-los.