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Pacote antifacção mostra timing eleitoral do governo

Sociólogo Tulio Kahn, especialista em segurança pública, analisou proposta do governo para combater o crime organizado

Tulio Kahn: “Esta é uma bandeira da direita bolsonarista que a esquerda está abraçando porque boa parte da população quer”

Redação Scriptum

O chamado Pacote Antifacção que o governo federal prepara para enfrentar as organizações criminosas é uma peça com timing eleitoral, para servir de apoio à disputa presidencial do ano que vem, da qual o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já antecipou que participará. Esta é uma das conclusões do debate realizado nesta segunda-feira (28), em São Paulo, durante a reunião semanal do Espaço Democrático – a fundação para estudos e formação política do PSD. O sociólogo Tulio Kahn, especialista em segurança com larga experiência pública, avaliou o escopo inicial do projeto de lei, que segundo ele tem muitos pontos obscuros e forte viés político.

Apresentado pelo ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, e enviado na semana passada para avaliação do presidente Lula, o pacote é revelador em um aspecto, segundo Kahn: “É uma resposta política, o PT se rendeu ao discurso das leis mais duras”, apontou. “Esta é uma bandeira da direita bolsonarista que a esquerda está abraçando porque boa parte da população quer”. A mais recente pesquisa sobre o tema, a Atlas-Intel/Bloomberg, divulgada no final de agosto, mostra que 46,5% das pessoas ouvidas aponta a criminalidade e o tráfico de drogas como o principal problema brasileiro.

Kahn observa que a proposta acerta na ideia de mirar no crime organizado de forma estratégica, pensando no financiamento das organizações. “Hoje, especialmente nos Estados, a tendência é privilegiar as PMs e o policiamento ostensivo, em operações como as que são feitas contra o tráfico de drogas nas favelas, o que se faz há 40 anos no Brasil com os resultados que conhecemos”, disse. “É um avanço pensar em atacar a estrutura das organizações”.

Ele destacou pontos que considera problemáticos no projeto. Um deles é o que trata da infiltração de policiais, já prevista pela Lei nº 12.850/2013, que regula o combate a organizações criminosas, e que é ampliada e flexibilizada no pacote apresentado por Lewandowski. Segundo Kahn, há risco de abuso e violação de garantias fundamentais à medida em que o projeto pressupõe sigilo, manipulação de provas e atuação sem controle social direto. “Isto pode levar a arbitrariedades como infiltrações motivadas politicamente ou em investigações sem justa causa”, pontua. Outro fator de risco é a corrupção reversa: “Há precedentes de agentes infiltrados cooptados por organizações criminosas, dada a vulnerabilidade psicológica e moral associada ao trabalho encoberto”, afirmou.

Outro ponto preocupante, de acordo com o sociólogo, é a proposta que permite a perda patrimonial antes do trânsito em julgado com base em indícios de origem ilícita. Embora o objetivo seja enfraquecer o poder econômico das facções, a medida, para Kahn, levanta riscos constitucionais e práticos, como a violação do processo legal e a presunção de inocência, o impacto sobre terceiros de boa-fé e o risco de seletividade e uso político.

Reunião do Espaço Democrático debateu o Pacote Antifacção

Por fim, ele chama a atenção para o ponto do projeto que prevê a gravação de conversas no sistema prisional. “Mesmo pessoas presas mantêm direitos fundamentais que só podem ser restringidos por lei específica e sob controle judicial”, aponta. A gravação irrestrita de visitas familiares, segundo ele, violaria o núcleo essencial do direito à privacidade. Ele pergunta: “Como ficaria a conversa do advogado com o seu cliente? Nenhum estado democrático pode gravar conversas entre advogado e cliente, o sigilo é um pilar da ampla defesa e do processo legal”.

Participaram da reunião semanal do Espaço Democrático os economistas Luiz Alberto Machado e Roberto Macedo, os cientistas políticos Rubens Figueiredo e Rogério Schmitt, os gestores públicos Mário Pardini e Januario Montone, o médico sanitarista e ambientalista Eduardo Jorge, a secretária do PSD Mulher nacional, Ivani Boscolo, e o jornalista Eduardo Mattos.

 


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