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Góis Monteiro e a doutrina da ingerência militar na política

General defendeu doutrina que mantinha a ingerência militar na política, mas sem a partidarização da tropa

  [caption id="attachment_32679" align="aligncenter" width="568"] A doutrina de Góis Monteiro tinha a missão manter a ingerência militar na política e evitar a partidarização da tropa.[/caption]  

O general Góis Monteiro publicou, em 1934, o livro intitulado A Revolução de 30 e a finalidade política do Exército.

Embora, do ponto de vista da elaboração teórica, deixe a desejar, sem dúvida alguma reflete o novo ponto de vista relativo à ingerência militar na política. A doutrina precedente seria da lavra de Benjamin Constant e focalizava, preferentemente, a questão do progresso, como então se entendia o desenvolvimento econômico. Constant associava-o ao estado positivo idealizado por Comte. Naquela altura, não chega a adquirir conteúdo explícito. Ainda que seriam os positivistas a dar conta da tarefa, tal ocorreria muito mais tarde. Vargas explicitaria que se tratava de empreender a revolução industrial, com o que o Brasil preencheria um dos requisitos ao ingresso no Primeiro Mundo.

O outro lado dessa ingerência dizia respeito à forma de governo e que papel caberia, nesse sistema, às Forças Armadas. Constant não viveria o suficiente para expressar o seu ponto de vista a respeito. Levando em conta que empenhou seu prestígio, no governo, à convocação de eleições para a Constituinte, admite-se que não teria as prevenções de Comte contra o sistema democrático-representativo. O certo, entretanto, é que se afastou do governo, vindo a falecer em janeiro de 1891, pouco antes da promulgação da Carta. Na prática, naquela primeira década republicana, derrotados os partidários da perpetuação do Exército no poder, emerge e consolida-se o grupo empenhado na profissionalização. A passagem de outro chefe militar pelo poder (Hermes da Fonseca, presidência de 1910 a 1914) não alteraria esse quadro.

A liderança desse grupo começaria a ser contestada na década de 1920, pelo movimento tenentista. Caberia a Pedro Aurélio de Góis Monteiro esboçar uma doutrina que, mantendo a ingerência militar na política, evitaria a partidarização da tropa. Vejamos, por suas linhas gerais, em que consiste.

Numa certa medida, o papel que preconiza para as Forças Armadas está associado ao seu desapreço pelo governo representativo. Contudo, prolongando-se a prática que iniciou, ainda no Estado Novo, até o chamado “interregno democrático” (1945-1964), sobreviveu em regime constitucional.

Indique-se sucintamente como expressa a mencionada indisposição.

“A eleição direta no Brasil é uma burla e uma imoralidade”, escreve na obra mencionada. Ainda assim, a afirmativa não objetiva corrigir os seus defeitos, mas simplesmente descartá-laEntende tratar-se “de processo ilógico de escolha, senão quando se trata de interesses também diretos e celulares”.

Prossegue: “Fora daí, no que concerne aos interesses mais completos, só a eleição em graus sucessivos constituirá uma forma de democracia organizada”.

Outro grave defeito da República brasileira encontrar-se-ia na federação. Ao contrário dos Estados Unidos, aqui, esse sistema “sobrepôs os interesses regionais aos interesses nacionais”. Conclui: “foi a prática defeituosa de um regime inadequado que impediu a formação de uma ideologia nacional... e não permitiu a organização da opinião pública, correspondente ao todo, isto é, à União, mas sim às partes constitutivas. O Brasil tornou-se, como já se disse, um corpo sem alma e por isto caiu como cai um corpo morto”.

E a Revolução de 30? Afirma não ter produzido “a maioria dos efeitos esperados”. Deixou de concluir a obra de destruição “que seria mais fácil no período ditatorial”“Será muito mais aleatória no período constitucional, sobretudo com a democracia liberal e os excessos de individualismo”. Vê-se, pois, que não apostava grande coisa na fase que se avizinhava (não perder de vista que estávamos em 1934).

Parece-lhe mais grave que não tenha alcançado a organização do que chama de “forças nacionais” e, presumivelmente, identifica com o que entendia por opinião pública.  Tem presente que nos países de democracia consolidada essas forças se expressam através dos partidos políticos. Mas descarta desde logo essa alternativa, na convicção de que atendem a interesses “particulares”, certamente tidos à conta de subalternos.

Valoriza a tentativa de organização dos tenentistas em órgãos suprapartidários, mencionando o Clube 3 de Outubro. Mas tem dúvidas quanto ao seu destino, cessado o caráter revolucionário do regime. O principal mérito que atribui a esse tipo de organização reside em que evita a participação direta, em agremiações partidárias, de membros das Forças Armadas. Insiste em que a missão que lhes cumpre realizar é de todo incompatível com qualquer espécie de “partidarização”. Chega a associar esse desfecho ao que chama de “militarismo” e insiste em que seria contra as mais profundas características de nosso povo.

A conclusão é a seguinte: “Não havendo a opinião pública se organizado em forças nacionais, restam as forças particularistas que não podem mais dispor e concentrar em suas mãos os interesses da nacionalidade. Ficam o Exército e a Marinha como instituições nacionais e únicas forças com esse caráter e só à sombra delas é que, segundo a nossa capacidade de organização, poderão organizar-se as demais forças da nacionalidade”.

Afirma taxativamente que as Forças Armadas são a espinha dorsal do Estado. E, prossegue: “As forças militares nacionais têm que ser, naturalmente, forças construtoras, apoiando governos fortes, capazes de movimentar e dar nova estrutura à existência nacional, porque só com a força se pode construir, visto que com a fraqueza só se constroem lágrimas.”

Estava aí esboçada a doutrina segundo a qual incumbe às Forças Armadas tutelar o Estado. Guindado à condição de chefe do Exército, Góis Monteiro tratou de aprimorar essa prática que culminaria com a deposição de Getúlio Vargas, em fins de 1945.

A sofisticação que essa doutrina experimentaria, no pós-Estado Novo e até março de 1964, seria a associação dessa função tutelar à ideia do poder moderador. Deve-se creditar a Antônio Augusto Borges de Medeiros ter aventado a hipótese de que o regime republicano comportaria a existência desse quarto poder. Na verdade, esta seria uma concessão tardia do velho caudilho castilhista, depois de ter passado toda a República Velha a depreciar a experiência imperial.

O certo é que no pós-Estado Novo a elite política nacional aceitou tacitamente a tutela das Forças Armadas. Basta ver a insistência em promover candidaturas militares à presidência da República. A opção por denominá-la de função moderadora seria, na verdade, uma forma de dourar a pílula. Somente no ciclo histórico posterior aos governos militares é que essa doutrina viria a ser contestada.

Coube ao primeiro governo militar (1964-1967), exercido pelo general Humberto de Alencar Castelo Branco, a missão de inviabilizar, na prática, a ingerência militar na política, consagrada com a República. Trata-se da limitação da permanência no generalato a doze anos. A par disto, o afastamento das Forças Armadas para concorrer ou exercer cargos políticos, alheios à corporação, torna-se definitiva. No passado, tivemos oficiais generais que, depois de terem se consagrado na política, voltaram à tropa sem quaisquer percalços. O próprio Góis Monteiro é exemplo disto.

A par disto, no seio do oficialato parece aceita a tese do cientista político americano Samuel Huntington (1927-2008), segundo a qual a ingerência militar na política traduziria baixos níveis de profissionalização (The Soldier and The State, expressa claramente essa compreensão à obra do brigadeiro Murilo Santos, intitulada O caminho da profissionalização das Forças Armadas (Ed. do Instituto Histórico da Aeronáutica).

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Uma década de grande agitação política

A Revolução de 1932 e a Intentona Comunista foram dois dos movimentos registrados na década

[caption id="attachment_32453" align="aligncenter" width="559"] No dia 27 de novembro de 1935 eclodiu o movimento que seria chamado de “Intentona Comunista”.[/caption]   Por Antônio Paim Como resultado do desfecho da chamada Revolução de 30, Getúlio Vargas assumiu aquele que se pretendia fosse um Governo Provisório. Acontece que Vargas passou a governar tranquilamente por decretos (não se tinha presente na época, mas era o que se praticava no Rio Grande do Sul sob o castilhismo), sem ser incomodado pelos Estados, todos sob intervenção. Na maioria dos casos, essa função era desempenhada por tenentes. Coube a São Paulo ser governado pelo “tenente” João Alberto, criando descontentamento generalizado. Supondo a liderança paulista que se verificava, nos demais Estados passou-se a conspirar no sentido de promover revolta sob o manto de que se tratava de providenciar a convocação de eleições para a Assembleia, para elaborar uma nova Constituição. Nessa expectativa, a liderança paulista iniciou a revolta a 9 de julho de 1932. Para sua surpresa, o apoio não se confirmou. Teve que improvisar o sistema militar defensivo que, entretanto, não conseguiu enfrentar com sucesso a pressão. Os analistas não chegaram ao acordo quanto as causas desse isolamento. Alguns atribuem-no à campanha desencadeada pelo governo federal, de que se tratava da separação de São Paulo. Apesar desse desfecho, seria a vez do governo federal capitular: em fins de 1933, convocou eleições para a Assembleia Nacional Constituinte. Não obstante o fato de que o governo federal aparentava simpatizar com o fascismo do italiano Benito Mussolini – impôs à Constituinte o que se denominou de “representação classista”, isso é, dos sindicatos, simplesmente nomeados –, a Constituição de 1934 manteve a estrutura democrática. Foram preservados os dispositivos introduzidos pelo Código Eleitoral de 1932. Esse instituto criou a Justiça Eleitoral, o voto feminino, o voto secreto e o sistema proporcional. Estabeleceu ainda que deveriam ser realizadas eleições para os governos estaduais em substituição aos interventores – essas eleições seriam indiretas. A Constituição de 1934 foi promulgada no dia 16 de julho. De um modo geral, restabeleceu-se a normalidade institucional. Ela seria quebrada pelos comunistas. No dia 27 de novembro de 1935 eclodiu o movimento que seria chamado de “Intentona Comunista”. Foi a tentativa de chegar ao poder pela força de quarteis no Rio de Janeiro, Recife e Natal. O movimento seria deflagrado em nome da Aliança Nacional Libertadora, organização criada pelos comunistas. O governo logo dominou a situação. Entretanto, seria devidamente explorada a circunstância de que se tratava de insurreição deflagrada sob a direção de líderes estrangeiros, pertencentes à Internacional Comunista. Posteriormente, seriam presos, inclusive Luís Carlos Prestes e a pessoa responsável por sua segurança, que se tornara sua companheira, Olga Benário. Os desdobramentos dessa história são conhecidos. Vargas decretou “estado de guerra” em março de 1936, o que lhe permitia suspender as garantias constitucionais. Manteve a convocação das eleições, que deveriam realizar-se para as eleições presidenciais de 1938.

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Henrique Meirelles: “O grande experimento”

O ex-presidente do Banco Central analisa a estratégia do EUA para superar sua crise.

A crise global começou nos EUA, com o estouro da bolha financeira, e depois se disseminou em formas e intensidades diferentes pelo mundo, gerando respostas variadas de política econômica, algumas mais eficazes que outras. E é justamente nos EUA que a plena recuperação econômica está cada vez mais próxima. A estratégia do FED foi enfrentar a grave crise de demanda induzida por um colapso do crédito causado pelo estouro da bolha financeira. Inicialmente, o FED usou a política monetária clássica de redução da taxa básica de juros. Quando os juros se aproximaram de zero, na segunda metade de 2008, o FED deflagrou processo de sucessivas rodadas de uma política conhecida como "quantitative easing" (QE), ou "relaxamento quantitativo". Resumidamente, o QE consistiu na compra, pelo FED, de títulos emitidos pelo governo americano e alguns tipos de títulos privados, que resultaram na injeção de quantidades maciças de liquidez na economia. Entre outras razões, o QE funcionou bem nos EUA porque parte importante do patrimônio das famílias americanas está em ações de empresas cotadas nas Bolsas. A injeção de liquidez aumentou o preço dessas ações, dado o maior capital disponível para adquiri-las. Assim, o patrimônio líquido das famílias também cresceu, permitindo elevação do consumo, que por sua vez aumentou as vendas das empresas, o que as levou a contratar mais funcionários. Essa dinâmica reforçou o aumento da demanda e das vendas, criando círculo virtuoso na economia. Numa segunda etapa, os preços das residências, outro ativo relevante do patrimônio dos americanos, também reagiram, reforçando o ciclo. Mais recentemente, a Europa adotou um programa como o QE. Mas lá o efeito é diferente e menos intenso, pois, entre outros fatores, não vemos a mesma participação de empresas e cidadãos no mercado de ações europeu. A injeção de liquidez na região atua fundamentalmente no crédito. Depois de ter já anunciado o fim do QE, o FED sinaliza agora o retorno iminente à política monetária clássica de aumento dos juros para conter o superaquecimento da economia americana, já detectável no mercado de trabalho. O objetivo das futuras altas de juros é evitar que a inflação fique acima da meta de 2% e também a formação de novas bolhas de ativos. O grande experimento de política monetária americana, próximo do fim, reforça algumas lições. Uma das mais importantes é que cada país deve identificar as raízes dos seus problemas de forma precisa e aplicar as ações adequadas com foco, vigor e determinação. Só assim é possível assegurar que ao longo do tempo o país crescerá explorando todo o seu potencial.

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