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{ DEBATE }

Incentivos fiscais promovem desenvolvimento socioeconômico?

Consultores do Espaço Democrático analisaram eficiência dos programas bancados pelo governo com renúncia tributária

 

 

 

Redação Scriptum

 

A política de incentivos fiscais para a instalação de empresas nos Estados do Norte e Nordeste do País foi tema da reunião semanal do Espaço Democrático, a fundação para estudos e formação política do PSD, nesta terça-feira (15). A discussão usou como pano de fundo a possibilidade de os benefícios tributários concedidos ao Grupo Stellantis – montadora das marcas Jeep, Fiat, Citroën, Peugeot e RAM, baseada em Pernambuco – serem estendidos até 2032 no escopo do projeto de reforma tributária em tramitação no Congresso Nacional. Por operar na região Nordeste, a empresa tem como principal benefício a redução de 75% no valor a ser pago em Imposto de Renda, o que representa aproximadamente R$ 5 bilhões anuais. O debate se deu em torno de quatro eixos: a tese segundo a qual os estímulos por meio de renúncia fiscal promovem desenvolvimento socioeconômico nas regiões onde as empresas beneficiadas se instalam; o desequilíbrio na relação entre o número de deputados federais e a população dos Estados que representam; a propensão do parlamento em aderir rapidamente a propostas de benefícios para as suas regiões; e a mensuração de resultados desses programas.

O coordenador nacional de Relações Institucionais da fundação, Vilmar Rocha, abordou a questão do ponto de vista de quem foi deputado federal durante duas décadas. Segundo sua análise, as bancadas do Norte e do Nordeste são majoritariamente sensíveis a políticas de benefícios fiscais. “É uma questão cultural”, disse. “E o resultado dessas isenções para o desenvolvimento socioeconômico daquelas regiões é historicamente menor que em outras”, apontou. Ele citou como exemplo a Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) autarquia criada no final da década de 1950 com o propósito de fomentar a economia regional. “Investiu bilhões no Nordeste e o resultado ficou muito aquém do esperado”.

Ele comentou também números do último Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostrados pelo cientista político Rogério Schmitt, que fez uma comparação da proporcionalidade entre as bancadas na Câmara Federal e a população de cada região do País: Sudeste, 41,8% da população e 34,9% dos deputados; Sul, 14,7% da população e 15% de representação na Câmara; Nordeste, 26,9% da população e 29,4% dos deputados; Norte, 8,5% da população e 12,7% da Câmara; e Centro-oeste, 8% da população e 8% da Câmara.

“Desde a Constituição de 1988 o princípio democrático do ‘um homem, um voto’ não tem sido aplicado de maneira absoluta porque a legislação determina que cada Estado deve ter no mínimo oito e no máximo 70 deputados, independentemente da população, o que é uma moderação da tese do ‘um homem, um voto’”, disse. “Muita gente defende a adoção da proporcionalidade pura, principalmente os paulistas, já que São Paulo é o Estado mais prejudicado pela moderação – deveria ter entre 110 e 112 deputados –, enquanto os menores acabam ganhando, mas sou a favor dela em razão dos desequilíbrios do País e não acredito que os Estados sub-representados sejam prejudicados: por exemplo, se pegarmos os oito Estados que tem o número mínimo de deputados previsto em lei, somam 64, enquanto São Paulo tem 70”. Vilmar lembrou que desde 1993 o Congresso não atualiza a proporcionalidade da representação com base no Censo, o que poderá ser feito até 2025, véspera da próxima eleição para a Câmara.

O economista Luiz Alberto Machado falou sobre o desenvolvimento socioeconômico das regiões Norte e Nordeste. Apontou que de acordo com o último censo, embora a renda per capita domiciliar brasileira tenha crescido 19% entre 2021 e 2022 – de R$ 1.367,00 para R$ 1.625 – estão nessas duas regiões os Estados com as cinco piores rendas: Maranhão, Alagoas, Amazonas, Pernambuco e Bahia. Da mesma forma, o Norte-Nordeste concentra os cinco Estados com pior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), indicador do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD): Maranhão, Alagoas, Amapá, Pará e Piauí.

“Não há dúvida de que a qualidade de vida tem melhorado no Brasil nos últimos anos e os programas de transferência compulsória de renda, como o Bolsa Família, tem contribuído para isso”, disse o economista. Ele destacou, porém, que por se tratar de um problema histórico, resultados mais expressivos demoram a aparecer. “O Maranhão, por exemplo, com 40 das 50 cidades mais pobres do Brasil, vem apresentando indicadores sociais muito ruins, mas o Piauí, ao contrário, tem tido constante melhora”. Machado lembra uma peculiaridade daqueles Estados, especialmente os do Nordeste: a elevada concentração de renda e riqueza nas mãos de poucas famílias.

O consultor em saúde Januario Montone lembrou que a melhoria geral do IDH ao longo das últimas décadas pode estar ligada às políticas públicas implementadas pelo governo federal. “O IDH tem três indicadores, renda, educação e saúde, que é longevidade, e a partir da criação do SUS houve um impacto muito forte na expectativa de vida do brasileiro, de quase 15 anos”, apontou. “Na região Nordeste, a intensificação do Programa Saúde da Família fez uma diferença muito grande principalmente na mortalidade infantil e no acompanhamento de doenças crônicas

O sociólogo Tulio Kahn levantou uma questão importante: a deficiência do estado brasileiro de aferir impactos dos programas que financia. “É incrível que em um projeto de bilhões como este da Stellantis, em Pernambuco, não sejam separados R$ 50 mil para a avaliação do impacto, o que não é difícil de fazer: é um projeto espacialmente concentrado e com data de início”, disse. Segundo Kahn, é possível avaliar os efeitos por meio, por exemplo, da comparação com outros municípios de perfil socioeconômico parecido que não tenham sido beneficiados. “Não há esta tradição de avaliar impactos no Brasil e por isso investe-se muito mal”.

Participaram da reunião on-line do Espaço Democrático os cientistas políticos Rubens Figueiredo e Rogério Schmitt, o sociólogo Tulio Kahn, os economistas Luiz Alberto Machado e Roberto Macedo, o superintendente da fundação Espaço Democrático, João Francisco Aprá, o gestor público Januario Montone, o médico e filosofo Antônio Roberto Batista e os jornalistas Eduardo Mattos e Sérgio Rondino, coordenador de comunicação da fundação do PSD.


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