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{ ARTIGO }

A Constituição cumpriu seu papel?

Para Vilmar Rocha, os 35 anos trouxeram maturidade à nossa Constituição, que não é perfeita, como bem disse Ulysses, mas nasceu com o ideal de ser cidadã

 

Vilmar Rocha, professor da Faculdade de Direito da UFG e coordenador de Relações Institucionais da Fundação Espaço Democrático

Edição: Scriptum

 

Trinta e cinco anos nos separam da promulgação da Constituição de 1988, marcada pelo histórico discurso de Ulysses Guimarães. Uma data para ser lembrada e comemorada, mas que também impõe reflexões: a Carta Magna cumpriu seu ideal? Um ideal que denotava mais perfeição do que ilusão, e foi retratado em seus 250 artigos, que fazem da Constituição brasileira a segunda maior do mundo.

Um inigualável marco nossa Carta Magna já atingiu ao garantir o maior período de estabilidade institucional e política da história republicana do Brasil. Atravessamos crises econômicas e sociais; superamos dois processos de impeachment de presidentes da República e, mais recentemente, ataques às nossas instituições democráticas. Ancorados no ideal democrático dos constituintes mantivemos a ordem do Estado de Direito.

Ulysses, em seu forte e emocionante discurso, centralizou dois temas, a restauração da democracia e combate à desigualdade social. “A cidadania começa com o alfabeto”, advertiu. “E só é cidadão quem ganha justo e suficiente salário, lê e escreve, mora, tem hospital e remédio, lazer quando descansa.”

À época, o número de analfabetos superava os 30 milhões, 25% da população. Hoje, somam 10 milhões aqueles que não sabem ler e escrever, o que inviabiliza a erradicação do analfabetismo em 2024, como pretendido. Por outro lado, a universalização do Ensino Básico avançou e o desafio no momento já não é garantir vaga na escola a todas as crianças de 7 aos 14 anos, como foi em 1997, mas o acesso à Educação Infantil a partir dos 3 anos e a implantação de escola em tempo integral em todas as unidades.

A partir da Constituição, criamos – e eu participei da votação das leis complementares nas décadas de 1990 e 2000 – uma rede de proteção social; acesso à saúde por meio do SUS e um programa de previdência pública; garantia dos direitos das minorias, das crianças e adolescentes e dos idosos; e demos início a construção de um país menos injusto.

Sim, o Brasil permanece no triste rol dos dez países mais desiguais do mundo, segundo o índice Gini. Mas temos uma pequena vitória a comemorar; segundo dados do Censo de 2022, o País registrou a maior redução na desigualdade de renda em 11 anos, desde o início da série histórica, em 2012.

Olhar para 5 de outubro de 1988 nos lembra o compromisso que foi firmado naquela tarde com os brasileiros, entre os quais a defesa intransigente da democracia. “A persistência da Constituição é a sobrevivência da democracia”, disse Ulysses. E cá estamos nós, vigilantes aos ataques deferidos a esse princípio que norteia todos os demais. Que às vezes podem vir até mesmo dos guardiões da Carta Magna.

Os 35 anos trouxeram maturidade à nossa Constituição, que não é perfeita, como bem disse Ulysses, mas nasceu com o ideal de ser cidadã.

 

 

Artigo publicado originalmente no jornal O Popular, de Goiânia, em 4 de outubro de 2023.

 

Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.


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