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{ ARTIGO }

Com a palavra, os leitores

O escritor José Paulo Cavalcanti Filho escreve sobre a repercussão de texto no qual comentou uma notícia de que teria falecido

José Paulo Cavalcanti Filho, jurista e escritor, membro da Academia Brasileira de Letras

O melhor, para quem escreve, é merecer resposta dos leitores. Segue uma prova. Na primeira coluna depois das férias (Ainda Bem),contei a história de notícia, no zap, sobre minha morte. E os amigos comentaram. A ver, alguns (entre muitos) deles:

TÓNIO DE ABREU FREIRE (Portugal): “Editei, em 2018,um livro intitulado O homem que morreu quatro vezes. Trata-se da vida de um cidadão da minha terra que, sem nunca estudar em nenhum conservatório, se tornou um grande ator de teatro. Teve tremendas aventuras. Os jornais chegaram a anunciar a morte dele por 4 vezes. Morreu velhinho, com 101 anos de idade (em 1979) e ainda lhe sobrou tempo para escrever uma autobiografia. Tenha paciência, caro Doutor, sabe como eu o admiro e prezo a sua amizade; mas, para igualar Thomaz Vieira, ainda lhe falta morrer mais três vezes”. Vou tentar.

ASSUERO: “Em relação aos charutos… vai que o pessoal lá no céu pode entrar com alguma medida protetiva contra o tabagismo…”. Espero que não.

Ministro CRISTÓVAM BUARQUE: “Quero agradecer ao autor da nota que originou a coluna. Imagine se ele não tivesse escrito? Ou imagine se ele tivesse escrito e fosse verdade? Ainda bem que escreveu e que não era verdade. Problema de sua coluna é que os amigos nunca mais vão lhe dar charutos, temendo que você interprete como presente antecipatório”.

Ministro FLÁVIO BIERRENBACH: “Também tenho um trato com a dona Maria Ignês para quando a indesejada chegar. Quero levar para a (Cemitério da) Consolação um belo canivete suíço, daqueles bem gordos, com mil e uma utilidades. Vai que… Aliás, pode até servir para tirar a ponta dos seus charutos. Como se vê, presumo que estaremos próximos”.

GIOVANNI MASTROIANNI: “Ainda bem que foi um de seus homônimos. Felizmente! Você é muito novo para se perder assim, na flor da idade. E discordo de levar com você charutos e isqueiro. De nada servirão. Talvez, apenas o registro de lembranças, como seria uma bandeira do Náutico”. Boa ideia, viva o Timba!!!

GIRLEY BRASILEIRO: “Gostei das exigências mortuárias. Quanto à indumentária fúnebre, no meu caso, pedi à dra. Sônia que por favor não me despache sem sapatos. Não sei porque deixam todos os defuntos descalços! Sei lá por onde vou caminhar lá por cima? Segundo ela, as nuvens são fofas. Mas não quero sem bom pisante”.

HENRIQUE ELLERY: “Indo para o Ceará, o amigo escreveu num guardanapo da TRANSBRASIL e me entregou o epitáfio que desejava para ele próprio ‒ Aqui neste pequeno horto/ Jaz sem nenhum conforto/ Walter Costa Porto”. Saudades dele e do pai, José.

IGNEZ BARROS: “Esse negócio de homônimos dá o que falar. Passei por situação similar. Tenho um irmão que é Procurador do MPPE. Então, numa certa tarde, uma nossa colega, ao saber da notícia de morte da irmã de um homônimo de meu irmão, também do MPPE, pensou que se tratasse de mim. E já estava providenciando a coroa para, junto com os colegas do grupo do zap, prestar-me uma homenagem post mortem.” Seria muito merecida.

JORGE GEISEL: “Não posso reclamar: já andaram me matando, em fofoca sinistra, anos atrás. Meus credores devem ter sofrido o choque das indisponibilidades… Os devedores, imagino que tenham dado graças a Deus. Empataram comigo”.

JOSÉ ALMINO ALENCAR (filho de Miguel Arraes): “Gore Vidal dizia-se ateu e certa vez um entrevistador, depois de confirmar esse status seu de não acreditar em Deus, perguntou: ‒ E, se quando você morrer, ele estiver lá para lhe receber? ‒ Então direi I was wrong”.

JOSÉ BRANDÃO (Portugal):“Folgo em saber que está vivo e de boa saúde, o que muito me alegra. A grande vantagem desta visão do futuro, incontornavelmente certa, é que pelo menos ficou a saber que será recordado com saudade”.

JUCA KFOURI: “Você se assustou quando soube que tinha morrido? Pois Elio Gaspari quer ser enterrado de terno e com uma nota de 100 dólares no bolso, porque se houver céu tem certeza de que a moeda por lá é a de Tio Sam”. Será?

LÚCIA e LUIZ FERNANDO VERÍSSIMO:“E nem uma faixa de melhor anfitrião de todos os tempos?” Beijos no casal.

LULA ARRAES (também filho de Arraes): “Lembro epitáfio feito por um poeta de Timbaúba: Aqui Jaz/ Para seu deleite/ Sebastião Uchoa Leite”.

ONÉSIMO TEOTÔNIO ALMEIDA (Estados Unidos): “A propósito, lembro que recebi foto da campa de um cemitério argentino com esse epitáfio ‒ Senhor, recebe-a com a mesma alegria com que eu te a envio”.

SÓCRATES TIMES NETO: “Sobre céu e inferno, Wilde tinha uma dúvida:preferia o céu pelo clima e o inferno pelas companhias”.

XICO BIZERRA: “Apenas acrescentaria como sugestão que, além dos óculos, do charuto e da caixa de fósforos, dona Lecticia não esqueça de vesti-lo com seus inseparáveis suspensórios, para que não haja dúvidas sobre quem está ali para sempre, descansando à sombra da frondosa mangueira. Se muito não for pedir, que lhe deixem à mão um lápis e um papel”.

ZIRALDO. Foi um dos grandes amigos que tive, na vida. Para lembrá-lo, com saudades, segue historinha. De quando chegou à casa do pintor João Câmara, em Olinda, num fim da tarde. Mas era sábado e Câmara, pouco antes, havia se empanturrado com bela feijoada. Estava já se ajeitando na rede para dormir até o dia seguinte. Bateu na janela

– João Câmara, João Câmara, é Ziraldo.

E Câmara, com voz de sono, – Sim?

– É Ziraldo, lá do Rio.

– Sei.

– Artista plástico.

– Sei.

– Se preferir, volto amanhã.

– Então tá. E foi dormir. Ziraldo, irritado com a grosseria (considerou assim), já ia voltando para o hotel. Mas, passando na Praça do Jacaré, se arrependeu. Pediu ao táxi para dar meia volta, retornou à casa, saltou e bateu na mesma janela

– João Câmara, João Câmara, é de novo Ziraldo.

–Sim?

–João Câmara, voltei aqui só para dizer que seus quadros são uma bosta.

P.S. Pior é que não são, trata-se de um dos grandes pintores do Brasil. A raiva, que para Byron (Don Juan) é “o mais longo dos prazeres”, às vezes cega.


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