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{ DIÁLOGOS NO ESPAÇO DEMOCRÁTICO }

Primeira e mais longeva Constituição brasileira completa 200 anos

Cientista político Christian Lynch explica ao programa de TV do Espaço Democrático porque a carta que foi imposta por D. Pedro I durou tanto tempo

 

Redação Scriptum

 

A primeira das sete Constituições brasileiras acaba de completar 200 anos. Outorgada por D. Pedro I em 25 de março de 1824, pouco mais de 18 meses após a proclamação da Independência, teve uma história conturbada. Ao constatar que teria seus poderes limitados pelos deputados que começaram a trabalhar em maio do ano anterior, mandou seus soldados fecharem a Assembleia Constituinte em novembro, apenas seis meses depois de sua instalação, no episódio que ficou conhecido como Noite da Agonia. Alguns parlamentares foram presos; outros, como os irmãos Andrada e SilvaJosé Bonifácio, Antônio Carlos e Martim Francisco –, figuras importantes no processo de Independência, exilados. Então, o imperador convocou um Conselho de Estado para terminar a Constituição de forma que garantisse plenos poderes para si mesmo, entre os quais o de personificar o Poder Moderador, que se sobrepunha ao Executivo, Legislativo e Judiciário. Assim nasceu o constitucionalismo brasileiro.

Apesar de ter sido imposta pelo imperador, a Carta de 1824 ainda hoje é a mais longeva da nossa história: vigorou até a proclamação da República, em 1889, completando 65 anos. E continuará sendo a de vida mais longa ao menos até a metade deste século – a Constituição de 1988 a igualará em longevidade somente em 2053.

E por que uma Constituição imposta, que espelhava os desejos arbitrários do monarca, durou tanto tempo? Para o doutor em ciência política Christian Lynch, há uma explicação: “Porque era boa”, diz ele em entrevista ao programa Diálogos no Espaço Democrático, produzido pela fundação de estudos e formação política do PSD e disponível em seu canal de Youtube. “Era boa e há uma coisa muito interessante, que talvez seja difícil de entender hoje: o imperador não tinha – como os monarcas europeus – o direito divino; o poder dele vinha do fato de ter sido aclamado pelo povo, por ter feito a Independência”, diz. “Foi a legitimação da monarquia pela vontade de povo”.

Lynch é doutor em ciência política, professor de Pensamento Político Brasileiro no Instituto de Estudos Políticos e Sociais (IESP) – vinculado à  Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) – e pesquisador da Fundação Casa de Rui Barbosa. É autor do livro Liberdade sem Anarquia: o pensamento político do Marquês de Caravelas, um dos importantes personagens da nossa primeira Carta – foi o principal integrante do Conselho de Estado que deu forma final ao primeiro texto constitucional depois da dissolução da Assembleia Constituinte.

Caravelas, como vários outros personagens da elite política imperial, acabaram relegados ao esquecimento, segundo Lynch. “O Brasil tinha uma elite política imperial muito hábil, mas a gente não ouve falar deles, só de José Bonifácio”, aponta. “Porque quando foi proclamada a República, a monarquia ficou encarnada só nos monarcas e os nomes dos homens que colocaram o Brasil em pé, a elite política, sumiram”. O cientista político considera que este processo, além de prejudicar a compreensão da História do Brasil, é uma injustiça. “O homem que colocou o Brasil em pé, por exemplo, chama-se Bernardo Pereira de Vasconcellos, que criou um modelo de governabilidade semiautoritário que pacificou o País; até a República, era considerado o maior político brasileiro e hoje ninguém sabe quem foi”.

Na entrevista para o jornalista Sérgio Rondino, âncora do programa Diálogos no Espaço Democrático, e para os cientistas políticos Rogério Schmitt e Rubens Figueiredo, Lynch criticou a forma como a História do Brasil é narrada. “A história não é um tipo de conhecimento que mobilize muitas pessoas no Brasil, mas do ponto de vista mais ideológico, temos duas maneiras preponderantes de contá-la, a conservadora e a radical”. Como exemplo da forma que chama de conservadora citou o filme de 1972, Independência ou Morte, com Tarcísio Meira e Glória Menezes. “Mostra o Brasil dos grandes homens, a elite pensante e patriótica que faz as coisas acontecerem, a história centrada nos monarcas e eventualmente em um José Bonifácio”.

Já a forma que considera radical é aquela que descreve o Brasil como o lugar de uma elite que oprime o povo permanentemente e os personagens são caricaturizados. “Mostra D. João VI como pateta, um comedor de galinha; Dona Carlota Joaquina como ninfomaníaca; D. Pedro I como um priápico autoritário, que só pensa em mulher; e D. Pedro II como banana, títere do imperialismo britânico, todos escravistas”.

Lynch defende uma forma liberal moderada de contar a nossa História. “É olhar o passado como passado, não como inspiração para a política do presente”, diz. “Liberais moderados conseguem ter um olhar contextualizado do passado”.


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