Andrea Matarazzo, ex-ministro da Secretaria de Comunicação (1999-2001), ex-secretário estadual de Cultura (2010-12) e ex-presidente da Cesp
Há 30 anos, tomei posse como presidente da Companhia Energética de São Paulo. Na época, era a maior empresa de energia do Estado e a segunda do País, atrás da Petrobras. Fui convidado por Mário Covas, que assumiu naquele ano o governo do Estado, e pelo secretário de Energia, David Zylbersztajn.
Aceitei o desafio que representava reestruturar e sanear a Cesp porque Covas nos ofereceu condições surpreendentes: plena liberdade para escolher os diretores da companhia e das subsidiárias, Comgás e CPFL.
Com Zylbersztajn, especialista no setor, selecionamos meticulosamente os nomes para formar a equipe apta a executar a imensa tarefa: sanear financeiramente as empresas, reestruturá-las e implementar um programa de privatização do setor energético, que estava fragilizado, financeiramente quebrado, com obras paralisadas e enorme falta de investimentos em transmissão, distribuição e geração — tanto na parte elétrica como na de gás.
Como presidente da Cesp e depois secretário de Energia, substituindo Zylbersztajn, nomeado para a Agência Nacional do Petróleo, testemunhei que era possível administrar a área pública com eficiência. Covas mostrou que o vício da ingerência política está mais ligado aos políticos do que à política em si e que as nomeações técnicas dependiam da vontade, credibilidade e legitimidade do controlador da empresa — no caso, o governo estadual.
Os cortes de despesas e outras medidas duríssimas — incluindo a privatização, vista com desconfiança até por veículos de imprensa de orientação mais liberal na economia — tiveram apoio de Covas e foram analisadas pelas instâncias de fiscalização (Tribunal de Contas, Assembleia Legislativa, Ministério Público e conselhos de administração das empresas).
Em momento algum houve interferência ou obstáculo que não tenha sido resolvido com diálogo republicano, pareceres técnicos competentes e bom senso.
Minha experiência leva à conclusão de que as justificativas de que amarras do setor público inviabilizam a busca por eficiência de empresas estatais e a sua eventual privatização são apenas pretextos para mascarar a incapacidade de quem não está preparado para ocupar cargo no Executivo. Cargos de governador ou secretário exigem habilidade, conhecimento e disposição para desfazer tais amarras, além, obviamente, de espírito público. Covas comprovou isso.
Dotado de espírito democrático, ele tinha ânimo para negociar com todos os lados e respeitava as instituições, sem abrir mão das suas convicções como administrador. Na área de educação, manteve a mesma determinação com a qual modernizou o setor elétrico, jamais cedendo a interesses que não fossem os dos alunos.
Na saúde, criou o sistema de organizações sociais para gerenciar hospitais, promovendo verdadeira revolução nos indicadores.
Também reestruturou o saneamento e inovou nos serviços ao cidadão com a implantação do até hoje copiado Poupatempo.
Covas apoiou, sem deixar de expressar sua opinião, as medidas que vinham sendo adotadas pelo governo federal, comandado por Fernando Henrique Cardoso. O engenheiro Mário Covas, formado pela Escola Politécnica da USP, mostrou que a construção política deve gerar resultados para os contribuintes por meio da melhoria da qualidade dos serviços e da redução das desigualdades inerentes a uma sociedade como a brasileira, marcada por desequilíbrios estruturais. Para isso, são necessários seriedade nos propósitos, objetividade na ação e controle fiscal.
Mário Covas promoveu gigantesco ajuste em São Paulo, o que criou condições para devolver ao Estado a grandeza que lhe é característica.
Artigo publicado no jornal Folha de S.Paulo em 15 de janeiro de 2025.
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