Redação Scriptum
O decreto assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que institui o marco regulatório da Educação à Distância (EaD) no Brasil, despreza as tecnologias do século 21 e olha para o passado com o propósito de atender sindicatos e órgãos de classe de professores, corporações mais preocupadas com o próprio status quo que com os benefícios para os alunos. A crítica ácida ao Decreto nº 12.456/2025, que aumenta a exigência de carga horária presencial no EaD, é do diretor-geral da Faculdade do Comércio de São Paulo (FAC-SP) e integrante do Conselho Estadual de Educação de São Paulo, Wilson Rodrigues.
Em palestra sobre o tema nesta segunda-feira (16/6), na reunião semanal do Espaço Democrático, ele fez uma analogia caricata para avaliar o decreto do Ministério da Educação: “Suponha que você queira assistir a um documentário e, em vez de fazer isso em casa, no momento que puder, com o conforto de rever trechos para compreender melhor, seja obrigado a pegar um ônibus, ir até um cinema, comprar o seu bilhete, conversar com o pipoqueiro e assistir ali, sem os recursos que pode ter em casa; é o que o MEC está propondo”.
Para Rodrigues, o decreto que estabelece a Nova Política de Educação a Distância poderia incorporar todas as novas tecnologias para criar um marco regulatório moderno. “Deveria tratar de Inteligência Artificial e todas as outras ferramentas digitais que possam estimular nos jovens habilidades de criatividade e inovação, essenciais no mundo em que vivemos, como se faz no Vale do Silício, na China e na Coreia do Sul”, disse. Em vez disso, segundo ele, preferiu atender ao corporativismo sindical: “É público que houve diálogo entre sindicatos de professores e o MEC, no início do ano passado, antes de a Portaria 528 ter suspendido a criação de novos cursos, polos e faculdades de EaD”.
O diretor da FAC-SP destaca que a situação da docência no século 21 sofreu profunda transformação e está na origem desta resistência corporativista. “O professor que não se atualiza e não se adapta às novas tecnologias é um professor ultrapassado e muitos que não se adaptaram ou não quiseram se adaptar perceberam que estavam ficando para trás”, afirmou. “Com o EaD surgiu a figura do professor que prepara o conteúdo, vai para o estúdio e grava a aula que é disponibilizada em ferramenta virtual de aprendizagem, mas muitos não estão dispostos a fazer isto”.
Rodrigues defende a expansão dos cursos de EaD a partir da constatação da mudança de dinâmica do ensino superior nos últimos anos. De acordo com dados do Instituto Semesp, enquanto as matrículas de cursos presenciais caíram 29,1% entre 2013 e 2023, as de cursos à distância cresceram 326%. No ano passado, o número de matrículas no ensino superior na modalidade à distância foi praticamente igual à dos cursos presenciais. “Se metade das matrículas está no EaD é porque a sociedade quer”.

Reunião semanal de colaboradores do Espaço Democrático
Ele lembra que, dos 45 artigos do decreto, apenas dois tratam de ferramentas e materiais didáticos digitais, o que revela o “olhar no retrovisor” do Ministério da Educação neste processo. O argumento de que nas plataformas de EaD o controle de qualidade precisa ser mais rigoroso também é contestado por Rodrigues. “Já é mais fácil aferir qualidade no ensino a distância: numa plataforma de EAD a aula está gravada, é só assistir e avaliar”.
Ele questiona também a falta de rigor científico na definição dos cursos que não podem ter carga horária de EaD. “Os cursos laboratoriais, como medicina, enfermagem e fisioterapia, concordo que não podem ter, mas por qual razão o curso de Direito, que é totalmente expositivo, precisa?”, pergunta. “Enquanto isto, as engenharias, que são laboratoriais, podem ter cursos semipresenciais”.
Participaram da reunião semanal do Espaço Democrático, coordenada pelo jornalista Sérgio Rondino, o superintendente da fundação, João Francisco Aprá, os economistas Luiz Alberto Machado e Roberto Macedo, os cientistas políticos Rubens Figueiredo e Rogério Schmitt, o sociólogo Tulio Kahn, os gestores públicos Andrea Matarazzo, Mário Pardini e Januario Montone, o professor pós-doc da USP José Luiz Portella, o médico sanitarista e ambientalista Eduardo Jorge, o advogado Roberto Ordine, a secretária do PSD Mulher nacional, Ivani Boscolo, o coordenador do PSD Movimentos, Ricardo Patah, e o jornalista Eduardo Mattos.