
Principal hipótese para explicar esse aumento é a maior conscientização sobre saúde mental, que leva mais profissionais a buscarem ajuda especializada
Edição Scriptum com Estação do Autor e O Globo
Quem cuida também precisa de cuidados. Hoje, aproximadamente 45% dos médicos no Brasil apresentam algum quadro de transtorno mental, como ansiedade, depressão e burnout. A informação consta do estudo “Qualidade de vida dos médicos 2025”, desenvolvido pela Afya, maior hub de educação e soluções para a prática médica do Brasil. O número é o mesmo registrado no pós-pandemia, em 2022, e representa um aumento de 13% em relação ao levantamento feito entre julho e agosto de 2024.
Reportagem de Giulia Vidale para o Globo (assinantes) informa que, segundo os pesquisadores, a principal hipótese para explicar esse aumento é a maior conscientização sobre saúde mental, que leva mais profissionais a reconhecerem sintomas, buscarem ajuda especializada e obterem o diagnóstico adequado.
Para efeito de comparação, um levantamento com 25 mil trabalhadores brasileiros de 22 organizações, em 2023, mostrou que 33% apresentam algum tipo de transtorno mental em nível severo ou extremamente severo, de acordo com a Vittude, uma plataforma que conecta psicólogos e pacientes. Ou seja, a saúde mental dos médicos está pior do que a média dos trabalhadores.
A pesquisa revelou ainda que as mulheres são maioria entre os médicos com problemas de transtornos mentais. Entre elas também houve aumento da prevalência em relação ao ano passado. Este ano atingiu 51,8% contra 46,8% na pesquisa de 2024. De acordo com os pesquisadores do Research & Innovation Center da Afya, esses dados sugerem não apenas uma maior vulnerabilidade feminina a quadros de transtornos mentais, possivelmente relacionada à sobrecarga emocional, dupla jornada e desigualdades estruturais, mas também uma maior disposição para reconhecer e nomear o sofrimento psíquico.
O estudo indica que os jovens foram mais afetados. Na faixa etária de até 35 anos, metade dos profissionais apresenta diagnóstico de transtorno mental. A partir dos 36 anos, observa-se uma inversão gradual: a proporção de médicos sem transtornos começa a superar a dos diagnosticados, chegando a 82% entre os profissionais com 56 anos ou mais. Essa curva descendente pode indicar tanto que os primeiros anos da carreira médica estão fortemente associados a altos níveis de sofrimento psíquico, quanto uma adaptação gradual ao ambiente de trabalho ao longo dos anos.
O estresse físico e emocional causado pela pandemia de Covid-19 contribuiu não só para o desenvolvimento de distúrbios mentais entre os médicos como exacerbou aqueles que já existiam. Por outro lado, esse período também escancarou esse problema, muitas vezes velado, e aumentou a conscientização sobre a necessidade de buscar ajuda. Agora, segundo os pesquisadores, é necessário que o cuidado com quem cuida seja reposicionado como prioridade estratégica, com políticas que promovam bem-estar de forma contínua, integrada e baseada em evidências, além da realização de abordagens mais sensíveis e inclusivas.