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A força do exemplo
José Paulo Cavalcanti Filho lembra que exemplos históricos de honradez e dignidade não vêm sendo seguidos
José Paulo Cavalcanti Filho, jurista e escritor, membro da Academia Brasileira de Letras Edição Scriptum Sobral Pinto, mais que grande advogado, foi sempre símbolo de correção. E, para seus colegas de profissão, um exemplo. Participou, ativamente, na campanha de JK à presidência da República (em 1955). E, já no governo, Juscelino o indicou para vaga deixada, no Supremo, pela aposentadoria do ministro Frederico de Barros Barreto. Algo não apenas esperado por todos, sobretudo justo. Ele simplesmente merecia. Reação de Sobral ‒ Não posso, Presidente, que participei de sua campanha. E não seria digno, de minha parte. O que diriam de mim?, de nós dois?, se aceitasse. A força do exemplo de Sobral deveria estar no coração de todos aqueles que estivessem, depois, em situações próximas. Só que assim não se deu, infelizmente, o “Cadáver do passado” (sem título, 01/07/1914, Fernando Pessoa) não serviu de lição aos pósteros. Lembremos apenas dois casos: Primeiro deles foi Sérgio Moro, que jamais poderia ser ministro da Justiça de Bolsonaro. A quem ajudou indiretamente, na eleição, ao condenar Lula. Impedindo fosse candidato. Mas acabou aceitando esse cargo e deu no que deu. Nem Bolsonaro podia convidar, nem ele aceitar. O destino é cruel. Se recusasse, teria sido bem melhor para ele, que hoje estaria no Supremo. E para o Brasil; com a história da Lava-Jato, quem sabe?, sendo outra. O segundo caso foi o de Ricardo Lewandowski. Para compreender o que fez, é preciso voltar um pouco no tempo. Em 08/03/2021 o ministro Fachin decidiu, monocraticamente, que a condenação de Lula não valia. Por uma questão menor, de foro. Algo difícil, quase impossível, de acreditar. Sem se incomodar com o fato de ter o ex-presidente sido condenado por 1 juiz, 3 desembargadores-federais do TRF4 e 5 ministros do STJ, que detidamente examinaram a situação em seus múltiplos aspectos. Inclusive o tal foro. No total 9 decisões, antes, por unanimidade sempre quando coletivas. E o ministro sozinho, sem ouvir nenhum colega, teve a coragem (digamos assim) de anular os 4 processos então em curso contra o ex-presidente: aquele em que havia já sido condenado, Triplex de Guarujá; e os três restantes, ainda em curso – Sítio de Atibaia, Sede do Instituto Lula, Doações ao Instituto Lula. Mas o serviço não estava completo, faltava o mais complicado. Que exigia coragem (digamos assim, novamente) ainda maior. Difícil de explicar à opinião pública. É que as provas, todas (inclusive numerosos depoimentos), permaneciam nos autos. Sem ser afetadas pela questão do foro. E qualquer juiz poderia quando quisesse, com base nelas, voltar a condenar aquele que, na época, era então já candidato a ser, novamente, presidente da República. Coube a Lewandowski o papel de dar fim a esse risco, um trabalho do qual não tem razões para se orgulhar. Ao contrário. E o fez, em 29/06/2021, anulando todas as tais provas produzidas contra o então ex‒presidente Lula. Sem fundamentos jurídicos. Sem maiores explicações. Nem maiores constrangimentos. Como se seu poder não tivesse nenhum limite. Novamente em decisão monocrática e, mais uma vez, sem ouvir ninguém. Impedindo pudesse, o antes condenado, vir a ser punido no futuro; que, mesmo quanto feitas novas provas, os processos correspondentes, dada a idade do acusado, estariam então prescritos. Uma espécie de anistia prévia. E pouco depois, quando se aposentou, acabou ganhando um presente régio, que foi o cargo de ministro da Justiça. O mesmo de Moro. Com o exemplo de Sobral Pinto, nesses dois casos, jogado no lixo. A família toda agradece. Inclusive seu filho advogado, Enrique Lewandowski, contratado (em 02/12/2024) pelo Centro de Estudos dos Aposentados e Pensionistas ‒ CEBAP; e também, a seguir, pela Associação dos Aposentados Mutualistas para Benefícios Coletivos ‒ AMBEC. Duas das associações comprometidas nesse escândalo da Previdência Social (não sei se houve mais alguma contratação, depois). E que deveriam estar sendo, ou no futuro deveriam vir a ser, teriam que ser, fiscalizadas pelo pai do advogado – o mesmo Lewandowski que, ministro, dirige a Polícia Federal. Membros do Ministério Público (Lei 11.425/2006, art. 21) não podem advogar, um impedimento funcional e ético. Mas isso foi no passado que passou, amigo leitor. E não vale mais, hoje, para situações similares. Como quando Ministros do Supremo, sem dramas íntimos de consciência, julgam casos defendidos pelos caros escritórios de suas mulheres, assim decidiram. E o filho de Ministro advoga causas que estão (ou deveriam estar) sendo investigadas por seu pai ministro. Não é razoável. “O tempore, o mores” diria, o romano Cícero, caso ainda estivesse entre nós. Mais um dos tais casos exemplares veio com a Ditadura Militar que teve início em 1964. É que o Supremo, na sua função básica de guardião da Constituição, na época mais que nunca teria que atuar na defesa dos Direitos Humanos e da Democracia. Começam os mais sombrios anos da Redentora, em 1969, e três ministros se rebelam. O Supremo, por mãos deles, não estaria a serviço de governos autoritários. Em razão disso a Junta Militar, que acabara de assumir o governo, aposentou compulsoriamente Evandro Lins e Silva, Hermes Lima e Victor Nunes Leal. Em protesto renunciaram, a seus cargos, o presidente da Casa, Gonçalves de Oliveira; e seu substituto, Antônio Carlos Lafayette de Andrade. Menos 5 ministros, portanto, com quem a Ditadura se preocupar. Em breve síntese havia, então, dois Supremos. Um que defendia os direitos previstos (e em tese garantidos) na Constituição. E, outro, que ali estava na função subalterna de servir ao Governo Militar e cumprir suas ordens. Cego, surdo e mudo ante censura, torturas, mortes e desaparecimentos forçados. E sem aparentes “escrúpulos de consciência”, uso de propósito uma frase do passado. O Supremo de hoje, amigo leitor, teria que decidir algo parecido; em síntese, se estaria mesmo disposto a defender a Constituição e a Democracia. Em um cenário diverso, mas igualmente grave, quando é grande a tentação de em algumas situações substituir outros poderes, como o Executivo ou o Legislativo. Achando pouco, agora, passa a exercer o papel de censor nacional. Dizendo quais informações deveremos ter (ou não) disponíveis. Com novo lema, na Côrte, agora é Censura nunca, mas... Paro por aqui. Trata-se de uma escolha já feita, sabemos todos qual foi, é inútil continuar. Apenas cabe lamentar que não se tenha, no Brasil de hoje, o Supremo altivo de Evandro, Hermes e Victor. A força de seus exemplos, como antes o de Sobral, não valeram. É pena. E segue a vida. Vejamos como todos esses personagens serão tratados mais tarde, algum dia senhores, quando a história desse tempo for escrita nos livros. Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.
Card link Another linkPiora da saúde mental e o desencanto do mundo
O sociólogo Tulio Kahn analisa o crescente número de casos de transtorno de ansiedade e depressão
Tulio Kahn, sociólogo e colaborador do Espaço Democrático Edição Scriptum Existem diversos indícios de piora da saúde mental dos brasileiros nos últimos anos, em especial dos transtornos de ansiedade e depressão. É possível captar essa degradação de diversas formas. Assim, por exemplo, vemos um aumento nas buscas do Google por “remédios para ansiedade”, dos gastos com diárias pagas pelo SUS com internações por transtornos fóbicos ansiosos ou outros transtornos ansiosos e um crescimento acelerado dos benefícios concedidos pela Previdência como auxílios por incapacidade temporária. Os auxílios-doença concedidos por transtornos de ansiedade atingiram o maior número em dez anos e pelo quarto ano consecutivo são a principal causa de afastamentos no Brasil, segundo o Ministério da Previdência Social. Corroborando os indícios anteriores, observamos um aumento nas vendas de antidepressivos e estabilizadores de humor na indústria farmacêutica, que crescem cerca de 10% ao ano nos últimos anos. Um dos resultados trágicos deste crescimento tem sido o aumento dos suicídios, que pelos dados do Sinesp/MJ passaram de 2.759 casos no primeiro quadrimestre de 2015 para 5.296 casos neste primeiro quadrimestre de 2025, projetando 15.900 caso no ano. Fenômeno parecido tem sido observado em outros países, principalmente após a epidemia de COVID, mas no Brasil o problema dos transtornos mentais parece se apresentar com especial intensidade. A OMS identifica o Brasil como um país com sérios problemas de saúde mental, com altos níveis de depressão e ansiedade, especialmente na América Latina. O Brasil ocupa um lugar de destaque em rankings globais de saúde mental ruim, muitas vezes figurando entre os países com as piores taxas de depressão e ansiedade. (Leia mais aqui) Existem algumas tentativas de explicação para o crescimento do problema, que começa antes da epidemia. Entre elas estão o uso intenso de celulares e das redes sociais, a instabilidade econômica, precarização das condições de trabalho, a polarização política, o aumento da sensação de insegurança com relação aos crimes, o isolamento do trabalho remoto e do ensino EAD, a piora da crise climática, a eclosão de conflitos internacionais, etc. Some-se a isso o dado de que, segundo o IBGE divulgou essa semana, temos 9 milhões de jovens que nem trabalham nem estudam (nem-nem), o que tampouco deve contribuir para a saúde mental. Não se pode descartar também uma eventual melhora na conscientização sobre os problemas mentais, bem como no diagnóstico e notificação dos casos pelo sistema de saúde. Gostaria de explorar outro veio e adicionar aqui a questão do “desencanto” que parece atingir níveis elevados no país. Alguns dados da sétima onde (2017-2022) do World Value Survey são bastante ilustrativos deste ponto. Segundo a pesquisa, 59,5% dos brasileiros estão insatisfeitos com o sistema político, em contraste com 10,8% da média mundial e 24,5% dos latino-americanos. Somente 25% dos brasileiros dizem ter muito “orgulho nacional”, ao passo que a média mundial é de 58,8% e a latino-americana a 71,3%. Apenas 18,6% dos brasileiros se sentem muito “próximos do país”, bem menos que a média mundial (47,8%) ou latino-americana (50,7%). Os brasileiros – além de estarem submetidos às fontes de stress comuns aos demais países e época – não tem orgulho nem apego ao país, como ilustra também a grande porcentagem de jovens entre 16 e 35 anos (67%) que afirmam que sairiam do país se pudessem e os milhões de brasileiros que já vivem em outros países (Veja aqui, para assinantes). Temos então a tempestade perfeita para o crescimento das doenças mentais, que junta milhões de jovens desocupados, isolamento social, crescimento do tempo-online, polarização política, aumento da insegurança, precarização do trabalho, etc. e uma desconfiança profunda nas instituições e no país. O brasileiro perdeu a esperança de que algum dia o Brasil venha a dar certo. Quem pode vai embora, os mais sensíveis, adoecem. Como já foi observado, um resultado como esse não é obra do acaso, exige décadas de esforço de uma elite descompromissada e incompetente. Pra aguentar o Brasil, só tomando rivotril. Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.
Card link Another linkDirigentes da Internacional Democrata Centrista visitam PSD
Presidida por Andrés Pastrana, entidade está presente em 83 países e tem 113 partidos associados
Edição Scriptum com Assessoria de Comunicação do PSD
O PSD Nacional recebeu na segunda (30) e terça-feira (1), em São Paulo, a visita de Andrés Pastrana, presidente da IDC-CDI (Internacional Democrata Centrista), e do coordenador da organização, Luis Blanco. Principal instituição global de partidos políticos, a entidade recebeu a adesão do PSD no final do último ano, e os dirigentes mantiveram nos dois dias desta semana uma série de reuniões com o presidente nacional do partido, Gilberto Kassab, dirigentes da sigla e da Fundação Espaço Democrático e lideranças de entidades setoriais e empresariais.
A visita de Pastrana e Blanco a São Paulo incluiu também um encontro com o governador paulista Tarcísio de Freitas no Palácio dos Bandeirantes, que teve ainda a participação do secretário e fundador do PSD Guilherme Afif Domingos e o líder do partido na Câmara, Antonio Brito.
Na terça-feira, na sede paulista do PSD, os dirigentes do IDC assistiram a uma apresentação sobre a história do partido, desde a fundação, em 2011, até a atualidade, quando se consolida como força da política brasileira, com o maior número de prefeitos eleitos no último ano, governadores de Estado, bancadas na Câmara dos Deputados e no Senado, deputados estaduais, secretários e outros gestores públicos nos três níveis federativos.
Também acompanharam uma análise do cenário político e econômico internacional feita por Lucas Ferraz, professor e pesquisador da Fundação Getúlio Vargas e consultor do Espaço Democrático.
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Nos dois dias da visita, Pastrana, ex-presidente da Colômbia (1998-2002), fez uma série de análises sobre o cenário político global e da América Latina e ressaltou a importância da pauta da segurança e combate ao crime organizado.
Na segunda-feira, durante reunião na ACSP (Associação Comercial de São Paulo), Pastrana e Blanco debateram aspectos políticos e econômicos. Se encontraram com Roberto Mateus Ordine, presidente da associação, lideranças da entidade e dirigentes e lideranças do PSD e do Espaço Democrático, fundação para estudos e formação política do partido.
As atividades também se deram na Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), onde os dirigentes foram recebidos pelo presidente Josué Gomes da Silva e representantes de federações e outras entidades empresariais.
Entre os participantes estavam dirigentes e conselheiros do PSD e do Espaço Democrático, como o líder do PSD na Câmara dos Deputados, Antonio Brito; o ex-governador do Espírito Santo Paulo Hartung; o embaixador e ex-ministro Andrea Matarazzo; o ex-deputado federal e ex-secretário estadual de Goiás Vilmar Rocha; o ex-senador Heraclito Fortes; Flavio Chuery, Luiz Carlos Boscolo e João Francisco Aprá.
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Pastrana destacou a presença do PSD na entidade e lembrou que a IDC-CDI está presente em 83 países, com 113 partidos associados. “Há uma série de vice-presidentes da entidade que são primeiros-ministros e o PSD se soma a esta força”, pontuou.
Gilberto Kassab ressaltou que a IDC-CDI é a “maior instituição política do mundo”. “Nos integramos à entidade que traz lideranças políticas muito importantes em todos os países, vinculados ao centro e à direita e isto é muito importante para o PSD”, afir
Card link Another linkLições de viagem: São Roque
O economista Luiz Alberto Machado aborda a revitalização da cidade paulista, um exemplo de economia criativa
Luiz Alberto Machado, economista e colaborador do Espaço Democrático Diversas cidades passaram por processos de revitalização parcial, com intervenções que as transformaram em exemplos de cidades criativas. Tais intervenções foram de iniciativa do poder público − talvez a maioria −, mas em alguns casos ocorreu o que se convencionou chamar de bottom-up, com iniciativas que tiveram origem na sociedade civil, embora, num segundo momento, o poder público tenha dado sua contribuição. Caso típico dessa segunda forma ocorreu em Parintins, no Amazonas, com a Festa do Boi, uma festividade popular que se transformou num sucesso extraordinário, a ponto de exigir a participação do poder público, dando origem a um dos maiores exemplos de manifestações folclóricas do Brasil, cujo sucesso, de certa forma, permite compará-la com o desfile das escolas de samba do Rio de Janeiro, mundialmente reconhecido. Examinando os casos de revitalização que permitiram que determinados locais tenham se transformado em espaços criativos, é possível encontrar exemplos de revitalização parcial, como foram os casos, entre outros, de Puerto Madero, em Buenos Aires, e Estação das Docas, em Belém do Pará, nos quais áreas degradadas das referidas cidades foram recuperadas e se tornaram pontos de atração, tanto de turistas como da própria população, que passaram a ter nesses espaços pontos de atração graças à existência de polos gastronômicos e/ou culturais, englobando bares, restaurantes, casas de show, escolas de dança, museus e galerias de arte. Independentemente da presença de atrações dessa natureza, tais localidades passaram a atrair visitantes dispostos simplesmente a passear, desfrutando das belezas lá encontradas. Há casos, porém, em que a revitalização foi mais abrangente, transformando cidades inteiras, que se transformaram em verdadeiros ícones de cidades criativas, internacionalmente reconhecidas. Um exemplo típico deste caso é Barcelona, que se transformou numa das maiores atrações turísticas de todo o mundo, cujo processo de revitalização se inseriu num projeto mais amplo que teve por pano de fundo a realização dos Jogos Olímpicos, em 1992. No Brasil, há diversos exemplos do mesmo tipo, entre os quais Gramado, no Rio Grande do Sul, que deixou de ser uma cidade que atraia visitantes nos meses de inverno, que se notabilizava por um festival de cinema, para se transformar num polo permanente de visitação, com amplo leque de atrações, respaldado por sólido sistema de hospedagem e gastronomia. Esteartigo focaliza uma localidade próxima a São Paulo, cujo processo de revitalização, ainda em curso, é digno de registro. Distante cerca de 60 quilômetros da capital paulista, São Roque se destaca atualmente como excelente exemplo de cidade que se reinventou, ostentando uma série de atrativos que mudaram completamente sua imagem. O ponto de partida da alteração da imagem de São Roque reside na vitinicultura e na gastronomia. A cultura vinícola de São Roque é bastante antiga, tendo origem na própria fundação da cidade, em 1657, pelas mãos de um bandeirante. O Estado de São Paulo, nessa época, já produzia vinho há mais de 100 anos (a primeira produção foi em 1551 pelas mãos de Brás Cubas, na vila que viria a ser São Paulo). Durante séculos a produção em São Roque esteve restrita à subsistência e ao comércio local, ganhando força com a chegada dos imigrantes italianos no final do século XIX. Mas nessa mesma época a praga da filoxera (um pulgão que mata a planta pela raiz) se alastrou por toda a Europa e chegou ao Brasil também, devastando completamente os vinhedos. As únicas videiras que não eram atacadas eram as videiras americanas, que produzem uvas para os "vinhos de mesa", e foi através deles que a indústria local conseguiu se expandir. Esses vinhos, de perfil mais simples, quase rústico, foram presença constante em mesas de restaurantes e residências paulistas por várias décadas e são até hoje uma grande fonte de renda e turismo na região. No entanto, o êxodo rural, as diversas crises econômicas do século passado, o baixo valor agregado desses produtos e a especulação imobiliária, puseram fim a dezenas de vinícolas da região e o turismo se concentrou nos caminhos do conhecido Roteiro do Vinho, ainda apoiado nas tradições antigas e nos vinhos simples. Mas a renovação chegaria no começo deste século, com pesquisa, investimentos e a ousadia em acreditar que o consumidor de vinhos do Brasil já estava pronto para beber vinhos diferenciados e de maior valor. Assim, algumas vinícolas, produtores rurais e investidores da iniciativa privada começaram uma lenta revolução, do campo até a mesa e a taça. Na última década surgem novos empreendimentos turísticos, a gastronomia regional se eleva e alguns rótulos produzidos com uvas da região recebem reconhecimento no Brasil e no exterior por sua qualidade, principalmente pelo novo sistema de produção, a Colheita de Inverno, que permite que as uvas finas amadureçam com perfeição nos meses de julho e agosto. Como resultado dessa verdadeira revolução, e da ação integrada de produtores, proprietários de terras e da própria Prefeitura, esse trabalho mostra seus frutos e se expande para além da Estrada do Vinho, indo para a Estrada dos Venâncios e a Rodovia Quintino de Lima, reunindo adegas, vinícolas, restaurantes, hotéis, pousadas e centros de lazer e entretenimento, em meio à natureza abundante da Mata Atlântica preservada. A cidade de São Roque recebeu até um curso de Enologia, no Instituto Federal de Educação, confirmando a vocação da região para a produção de vinhos. Atualmente, as principais uvas finas cultivadas na cidade são a Cabernet Franc e a Tempranillo (tintas) e a Sauvignon Blanc e a Lorena (brancas). Mas dezenas de outras variedades europeias vêm sendo cultivadas nas suaves colinas de São Roque nos últimos anos. Além dos vinhos, São Roque se destaca também pela produção de alcachofra, cuja safra atinge seu ponto alto no mês de setembro. Vários dos restaurantes, alguns dos quais de alta qualidade, incluem a alcachofra em seus cardápios, contribuindo para atrair significativo volume de apreciadores dessa iguaria. Por todas essas razões, São Roque é um perfeito exemplo de cidade que evolui na trilha da economia criativa. Apostando na diversificação, as atrações da cidade deverão crescer ainda mais com o Festival de Inverno a ser realizado a partir de julho, que terá, como um de seus destaques, um festival de jazz, com importantes intérpretes do Brasil e do exterior. [1] Economista, graduado em Ciências Econômicas pela Universidade Mackenzie, mestre em Criatividade e Inovação pela Universidade Fernando Pessoa (Portugal), é sócio-diretor da empresa SAM - Souza Aranha Machado Consultoria e Produções Artísticas e consultor da Fundação Espaço Democrático. Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.
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