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Duas ou três coisas sobre Arthur

José Paulo Cavalcanti Filho escreve sobre Arthur Moreira Lima: ficou só uma ausência que dói, na saudade sem remédio do amigo querido

José Paulo Cavalcanti Filho, jurista, escritor e colaborador do Espaço Democrático Edição Scriptum

  1. Começo com Millor Fernandes. Como os jornais falavam mal de PC Farias, caixa 2 de Collor, escreveu na sua coluna do JB (maior jornal daquele tempo), em resumo, “Nem todo PC é ruim. E, aqui, homenageio meus amigos PC. Paulo Caruso, Paulo Casé, (José) Paulo Cavalcanti. Mais Ziraldo. Que não é P, nem é C, mas se publicar nome de amigos, sem falar nele, briga comigo”. Depois a relação azedou, quando Ziraldo recebeu gorda indenização por ter sido preso (todos foram, só ele requereu). Sem papas na língua, Millor disse “Pensei que o que fizemos no Pasquim fosse um ato de resistência política; nada, era só uma aplicação financeira”. Mas essa é outra conversa.
  2. A história que vou contar com o grande pianista Arthur Moreira Lima, que agora nos deixou, começa com dito Ziraldo. Presidente da Funarte, nos tempos de Tancredo/Sarney, e sem nenhum dinheiro no caixa, bom lembrar. Como soube que havia um piano de cauda nos depósitos do Ministério da Justiça, marca Steinway (melhor do mundo), avisou que dia seguinte iria no meu gabinete pedir fosse doado à mesma Funarte.
Como o instrumento teria muito melhor uso na área da cultura, que na das leis, pedi à área técnica do ministério para preparar a doação. Disseram que não podia. Então troquei por comodato (um tipo de empréstimo), sem prazo para devolver. Só que ninguém sabia como fazer isso, para eles era novidade. Então eu mesmo redigi o contrato, assinei e deixei na minha mesa. Dia seguinte, chega Zira com um monte de artistas juntos, os mais famosos do Brasil naquele tempo. Encheu a sala. Entreguei o contrato, assinou, me devolveu uma via e pôs a sua embaixo do braço. Sem ler.  Começou ‒ Vim pedir o piano. ‒ Dou não, como posso justificar isso ao público? ‒ Diga que ele fica melhor na Funarte. ‒ Não é tão simples. ‒ Então diga que é meu amigo. ‒ Agora é que não posso doar mesmo. A graça na história é que o piano já era dele. Então foi saindo da sala, cabeça baixa, sem nem se despedir dos amigos que vieram com ele. Quando ia já passando pela porta, lhe disse ‒ Zira, pelo menos leia o contrato que está no seu braço. Leu, voltou ligeiro e me deu um beijo, Deus do céu. Para fazer graça pus, no tal contrato, cláusula que dizia ‒ “Todas as vezes que for exibido deve ser avisado, ao público, se tratar de um Piano gentilmente cedido pelo Ministério da Justiça”. Um mês depois, teatro Nacional lotado, concerto de Arthur inaugurando o piano. Abre-se a cortina. E aparece em cima dele placa, com aquela letra de Ziraldo e bem grande, “Piano gentilmente cedido pelo Ministério da Justiça”; que arranquei, na hora, e hoje dorme junto de um piano de cauda Yamaha que temos em Gravatá. Pior é que Arthur ainda explicou, ao público, ser uma exigência minha. Só matando. Foi a maior vergonha que passei em Brasília. Culpa dos dois.
  1. Jantar para homenagear Arthur no Ristorante Arlechino, o mais grã-fino do Rio naquele tempo. Só gente importante, na mesa. Todos com terno. Até que chegou Arthur vestido com uma capa. Tirou na hora e, por baixo, estava só com uma camisa do Fluminense. Pode?
  2. Pré-estreia de show seu que, começando no Rio, iria correr o Brasil todo. Escrito por Millor. Arthur abre o piano. Senta no banco. Prepara-se para começar e toca uma nota. Mais nada. Então, vira-se para a plateia e conta essa história
‒ Americano chega em bar, de Copacabana, com um dicionário na mão. Vem o garçom e ele, depois de 10 minutos consultando o tal livrinho, afinal pede ‒ Eu querer uma copa d’água. Com o garçom, no melhor estilo dos malandros cariocas, ‒ Caxambú ou Lindoya? ‒ What? Esse tipo de graça era a cara de Arthur.
  1. Verão, ia sempre a nossa praia na Lagoa Azul. E, lá, formamos uma parceria, o “Duo Lima e Cavalcanti”. Eu na parte esquerda do piano, mais fácil, apenas com os acompanhamentos; e, ele, na mão direita, fazendo malabarismos inacreditáveis. Em Toquinho, nas casas com piano, chegávamos, pedíamos licença ao dono e tocávamos três músicas. Começando sempre com b Para uma pequena multidão que logo se formava. Depois, agradecíamos e seguíamos, na direção de outras casas.
  2. Agora, desfeita a dupla, ficou só uma ausência que dói, na saudade sem remédio do amigo querido. Viva Arthur Moreira Lima. Em nossos corações. Para sempre.
P.S. Eleição nos Estados Unidos. Ao ver os comentaristas de nossas televisões, acompanhando as eleições, lembro da canção de protestos que embalou a Revolução dos Cravos em Portugal, Grândola Vila Morena: ‒ O povo é quem mais ordena. Respeitem o povo, senhores. Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

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Crime organizado e homicídios: uma análise internacional

Para o sociólogo Tulio Kahn, a redução nos homicídios, está relacionada a fatores que vão além da dinâmica entre as facções criminais e suas disputas pelos mercados

Tulio Kahn, sociólogo e colaborador do Espaço Democrático  Edição Scriptum O Índice Global do Crime Organizado é uma iniciativa da GI-TOC (The Global Initiative Against Transnational Organized Crime) para tentar mensurar a prevalência e características do crime organizado no mundo por meio de uma pesquisa em 193 países. O índice envolve consulta a mais de 400 especialistas e aborda tópicos como mercados criminais ilícitos (15 mercados), existência e tipos de grupos criminais (5 tipos) e capacidade de resiliência dos países para enfrentar o problema (12 indicadores). Cada indicador é avaliado por especialistas numa escala de 1 a 10, e a avaliação de um país é feita anonimamente por especialistas diferentes, em duas etapas. A avaliação, posteriormente, é verificada por um grupo regional e finalmente feita uma calibração interna por membro do GI-TOC. Trata-se do “método dos juízes”, uma das muitas maneiras de tentar mensurar o crime organizado e que é utilizado no Brasil, por exemplo, pelo SINAPEN, para avaliar as facções criminais no sistema penitenciário brasileiro. Ainda que sujeito a subjetividade, dada a natureza clandestina das atividades criminosas e a dificuldade de mensurar diretamente o fenômeno, trata-se de uma iniciativa meritória, uma vez que consegue abarcar uma grande quantidade de países e dimensões. Com base nele, é possível correlacionar uma medida de crime organizado com outros fenômenos, como democracia, IDH, variáveis socioeconômicas, taxas de criminalidade comum, transparência e diversas outras características dos países. Embora seja comum associar a violência letal com o crime organizado, esta associação precisa ser matizada, uma vez que depende bastante do tipo de crime, tipo de grupo criminoso e do contexto de cada local, como a capacidade de resiliência do Estado e da sociedade para lidar com os efeitos deletérios do crime organizado. A taxa de homicídios em cada país é afetada por múltiplas variáveis – demográficas, culturais, econômicas, sociais etc. – e a existência de mercados ilícitos e grupos organizados é apenas uma dentre muitas. Assim, por exemplo, embora mercados ilícitos e grupos organizados sejam disseminados por todos os continentes, há uma ampla variação da taxa de homicídios entre eles. As Américas são a região mais violenta do planeta e a Europa, a menos violenta – embora o continente conviva historicamente com diversas formas de crime organizado. Essas diferenças se devem a diversos outros fatores que não são abordados pelo Índice Global do Crime Organizado e sua finalidade tampouco é explicar estas diferenças. De todo modo, o relatório de 2023 do Índice Global do Crime Organizado procurou investigar algumas conexões entre as taxas de homicídios intencionais e os diversos componentes do índice. Conforme aponta o relatório: “O crime organizado é frequentemente associado à violência e aos homicídios. Os ambientes com economias ilícitas, como o tráfico de armas e de drogas, são muito propensos à violência, na ausência de forças de segurança e de sistemas judiciais eficazes. Embora permaneça um desafio, dada a amplitude dos dados globais sobre homicídios, as estatísticas mostram uma correlação moderada entre as taxas de homicídio e alguns mercados criminosos, mais notadamente o tráfico de cocaína (0,42) e o tráfico de armas (0,42) e, em menor grau, as taxas de extorsão e proteção ilegal (0,30). Os mercados de homicídios e os criminosos tendem a influenciar-se mutuamente. Os ambientes em que a segurança e o desenvolvimento estão em risco são propícios a economias ilícitas e, na ausência de uma aplicação eficaz da lei e do poder judicial, isto contribui para uma elevada taxa de homicídios. No caso dos mercados de drogas, a falta de segurança tem um efeito prejudicial nas comunidades, criando um ambiente em que não só os indivíduos são mais vulneráveis ​​ao consumo de drogas, mas também permite que os traficantes de drogas operem com impunidade.” É interessante observar, em primeiro lugar, que muitos dos mercados criminais avaliados não revelaram correlação significativa com os homicídios. A correlação com alguns mercados e grupos foi apenas moderada e, interessantemente, para alguns mercados, a correlação foi negativa. De maneira geral, o relatório encontra apenas uma relação positiva moderada (0.23) entre homicídios e “criminalidade” (indicador agregado do Índice) e uma relação negativa moderada (-0.26) com “resiliência” ou a capacidade do país de resistir às atividades do crime organizado através de medidas políticas, jurídicas, econômicas e sociais. São bastante raros os estudos e dados para mensurar o fenômeno do crime organizado, especialmente em nível mundial. Não obstante as críticas que se possam fazer à metodologia de pesquisa – subjetividade na avaliação dos especialistas, diferença de qualidade das informações entre os países, ponderação equivalente de mercados desiguais, uso de escalas, ausência de outros mercados ilícitos etc. – trata-se de uma oportunidade importante para investigar a conexão entre o crime organizado e outros eventos, como outras formas de violência. Crime organizado envolve diversas dimensões e crimes, sendo antes um modus operandi do que uma lista de crimes específicos. Não são todas as atividades nem todos os tipos de grupos que estão associados aos homicídios, mas apenas alguns tipos de atividades e grupos. Sociedades mais funcionais e resilientes têm menores níveis de criminalidade, mas mesmo países com presença de mercados ilícitos e grupos criminosos conseguem às vezes conviver de forma mais pacífica com a existência de mercados ilícitos e grupos criminosos. A Itália é o caso clássico no continente europeu e aqui mesmo na América do Sul temos o ilustrativo caso do Paraguai. Por outro lado, países como México, Honduras ou África do Sul têm taxas de homicídios muitos maiores do que seria esperado pela existência de crime organizado. Estes casos excepcionais são interessantes de analisar, pois permitem compreender melhor a relação entre os fenômenos. As taxas de homicídio são impactadas por diversas outras variáveis – como qualidade do sistema de justiça criminal, desigualdade, desemprego, tamanho da população jovem nem-nem, taxa de gravidez na adolescência, taxa de escolarização da população, estrutura demográfica e racial, disponibilidade de armas de fogo – para além do crime organizado. Assim, se é importante combater os mercados ilícitos e os grupos criminosos, por todos os motivos, é relevante também pensar em outras políticas públicas, se o objetivo é reduzir as taxas de homicídio. O Brasil convive desde 2017 com um processo gradativo de redução das taxas de homicídio, não obstante a sensação generalizada de crescimento do crime organizado e o aumento da disponibilidade de armas. Os maiores grupos mafiosos do País – PCC e CV – são oriundos do Sudeste, precisamente a região com as menores taxas de homicídio do País. Esta redução nos homicídios, aparentemente, está relacionada a fatores que vão além da dinâmica entre as facções criminais e suas disputas pelos mercados ilícitos, especialmente de drogas. O artigo corrobora a importância destes fatores sobre a violência letal, mas mostra também que a relação entre os fenômenos é bem mais complexa do que parece a primeira vista. Referências Garzón-Vergara, Juan Carlos. What is the relationship between organized crime and homicide in Latin America?. Igarape Institute., 2022. Índice Global de Crime Organizado. GI-TOC, 2023 Justus, Marcelo, et al. "The “São Paulo Mystery”: The role of the criminal organization PCC in reducing the homicide in 2000s." EconomiA 19.2 (2018): 201-218. Kahn, Tulio. Quinze ensaios sobre homicídios Malby, Steven. "Homicide." HEUNI (2010): 7. Van Dijk, Jan. "Mafia markers: assessing organized crime and its impact upon societies." Trends in organized crime 10 (2007): 39-56. Van Dijk, Jan, and Toine Spapens. "Transnational organized crime networks." Handbook of transnational crime and justice (2014): 213-226. Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

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Empresas brasileiras veem funcionários mais eficientes com semana de 4 dias

Durante seis meses, 19 empresas participaram do teste; resultado mostrou que houve aumento na eficiência

[caption id="attachment_38562" align="aligncenter" width="826"]Semana de quatro dias: experiências bem-sucedidas Semana de quatro dias: experiências bem-sucedidas[/caption]   Texto Estação do Autor com Folha de S.Paulo Edição Scriptum Acompanhando a tendência mundial, o mercado de trabalho brasileiro está mudando. Durante seis meses, 19 empresas do País participaram do teste da semana de trabalho de quatro dias. O resultado mostrou que em 16 delas houve um aumento na eficiência de seus funcionários. Segundo gestores da maior parte das firmas que aplicaram o modelo com jornada menor e salários iguais os processos internos dos negócios melhoraram. Realizado em quatro Estados (SP, RJ, MG e PR), a semana de quatro dias de trabalho será mantida sem alterações por oito das 19 empresas que participaram do projeto piloto. Sete companhias preferiram estender o teste para avaliar melhor os impactos a longo prazo. Reportagem de Lara Barsi para Folha de S.Paulo (assinantes) mostra que 84,6% dos gestores acreditam que a redução de cinco para quatro dias de trabalho por semana trouxe benefícios. Aumento da produtividade, melhor qualidade do trabalho, redução nas faltas e melhoria no bem-estar dos colaboradores foram alguns dos destaques. Desenvolvido pela Reconnect Happiness at Work & Human Sustainability, o projeto 4 Day Week Brazil aponta que entre os anseios das empresas estavam a redução da taxa de rotatividade de colaboradores, a facilitação na atração de talentos e a promoção do bem-estar dos funcionários e uma elevada taxa de engajamento e produtividade. A maioria das expectativas foram alcançadas durante o experimento. A semana de quatro dias apontou um crescimento de 66,7% na capacidade de recrutamento das empresas. Em relação aos colaboradores, 60,3% disseram que o nível de engajamento cresceu e para 71,5% a produtividade aumentou. No quesito saúde, a análise dos dados revelou que 72,8% tiveram uma redução na exaustão frequente e 49,6% observaram melhoria na qualidade do sono. Houve ainda um retorno positivo em relação ao bem-estar e ao convívio social. Cerca de 87,4% disseram ter mais energia para realização de tarefas e 45,9% notaram uma redução do desgaste no final do dia. No modelo testado, a jornada de trabalho diminuiu, em média, 6,3 horas por semana. Ao serem questionados se gostariam de continuar a ter três dias de folga por semana, cerca de 97,5% dos 202 colaboradores que responderam aos questionários disseram desejar que o benefício fosse mantido.

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Brasil é último colocado em capacidade de identificar fake news na internet

Estudo ‘Questionário da Verdade’ foi realizado em 21 países e foi publicado pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico

[caption id="attachment_38488" align="aligncenter" width="766"] Pesquisa de campo ouviu mais de 40.760 pessoas em mais de duas dezenas de países[/caption] Redação Scriptum com TV Cultura O Brasil ficou em último lugar em uma pesquisa sobre a capacidade de identificar conteúdos falsos na internet, de acordo com o estudo ‘Questionário da Verdade’ , aplicado em 21 países e publicado pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Reportagem publicada no site da TV Cultura aponta que a constatação é efeito dos ambientes em que o brasileiro costuma se informar. De acordo com a pesquisa, 85% das pessoas no Brasil têm o hábito de se informar pelas redes sociais. Enquanto boa parte dos brasileiros se informam pelas redes, apenas 30% da população do Japão, da Alemanha, do Reino Unido e da Finlândia buscam informações nessas fontes. No Brasil, 54% das pessoas acertaram na identificação de notícias verdadeiras. Colômbia, Suíça, França e Estados Unidos ficaram logo acima. Em primeiro lugar está a Finlândia, com 66% de acertos, seguida por Reino Unido, Noruega e Irlanda. No total, mais de 40.760 pessoas foram entrevistadas. "Nós estamos potencialmente nas redes em aplicativos de mensageria, por onde se criam grupos. Esses grupos têm muitos fatores de influência. Ou é o grupo da família, ou é o grupo da religião, ou é o grupo do futebol, é um grupo da cerveja, então tem sempre alguns que são os maiores influenciadores desses grupos e quando vem [a informação] por alguém que é a sua autoridade religiosa você confia naquilo”, explica Ana Regina Rêgo, coordenadora da Rede Nacional de Combate à Desinformação.

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