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{ ARTIGO }

A aventura de explicar a vida

Rubens Figueiredo escreve sobre “A viagem do Beagle”, livro que traz os diários do naturalista Charles Darwin em sua jornada por América do Sul, Oceania e África

 

Rubens Figueiredo, cientista político e colaborador do Espaço Democrático

Edição Scriptum

 

Os ângulos são múltiplos. Mas, de qualquer perspectiva que se analise, ficam claras a grandiosidade e a importância da jornada. O primeiro capitão do Beagle, Pringles Stokes, entrou em depressão e acabou se suicidando. O jovem capitão-tenente Robert FitzRoy assumiu o comando do navio, que faria uma expedição de quase cinco anos (1832-1836) percorrendo a América do Sul, Oceania e África, com direito à parada na Ilha de Santa Helena, perdida no meio do Oceano Atlântico.

FiytzRoy queria a companhia de alguém mais ilustrado, com quem pudesse conversar durante a longa viagem. Por esse motivo, o naturalista Charles Darwin, então com 22 anos, foi convidado para participar do projeto. A bordo, 69 pessoas. Nessa viagem, o jovem cientista pode colocar em prática sua espantosa capacidade de observação, fazendo reflexões sobre os aspectos da geologia, botânica, zoologia e da cultura das novas terras e sociedades que ia conhecendo.

O livro A viagem do Beagle (São Paulo, Edipro, 2024, 640 pgs), que contém os diários de Charles Darwin, envolve e fascina. É claro que, para os não versados em ciências naturais as descrições minuciosas, como as afirmações de que “o Struthio rhea habita a região do Prata até um pouco ao sul do Rio Negro, na latitude 41 graus, e que o petise ocupa seu lugar na Patagônia Meridional” (pg 143) podem parecer um tanto enfadonhas.

O livro ganha rica dimensão quando ficamos sabendo que, entre os passageiros, estavam três indígenas que haviam sido levados para a Inglaterra em expedição anterior. Darwin descreve com riqueza de detalhes o reencontro de um deles com seu povo, fazendo análises bem profundas sobre a diferença entre o mundo civilizado e a estrutura social dos povos primitivos. Também vê atributos muito positivos entre os indígenas, como a capacidade de repetir longas frases do idioma inglês, absolutamente desconhecido por eles.

Darwin demonstra um bom humor elegante em certas passagens. Escrevendo sobre sua estada no Rio de Janeiro, um dos mais importantes cientistas de todos os tempos dá a estocada: “Os brasileiros são tão hábeis com a faca que podem jogá-la a alguma distância com precisão e com força suficiente para causar um ferimento fatal. Vi vários meninos praticando essa arte como estivessem brincando, e, pela habilidade com um pedaço de madeira vertical, suas tratativas mais sérias eram promissoras” (pg 71).

O texto mostra um Darwin enfeitiçado pelas nossas belezas naturais e, ao mesmo tempo, já de olho nas nossas especificidades sociais, como o tratamento desumano aos escravos e uma certa malandragem. Sobre o primeiro ponto, uma passagem poética resume tudo: “O ruído dos insetos é tão alto que se pode ouvi-lo mesmo em um navio ancorado a várias centenas de metros da costa; e ainda assim parece reinar um silêncio universal no meio da floresta” (pg 51).

O autor considerava essa viagem, “de longe”, o acontecimento mais importante de sua vida e que determinou toda sua carreira. O que o impressionou mais foi a visão de um selvagem nu em sua terra natal. Darwin descobriu um mundo e criou a teoria que brincava de discutir com Deus. Na luta pela vida, as características mais bem adaptadas à sobrevivência são mais eficientes na reprodução. Persistem os mais aptos. “Simples” assim.

 

 

Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.


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