Samuel Hanan, ex-vice-governador do Amazonas, engenheiro especializado em economia e colaborador do Espaço Democrático
Edição Scriptum
Já se passaram seis décadas desde que Juscelino Kubitschek encerrou seu mandato como presidente do Brasil. Desde então, o País nunca mais experimentou um processo de desenvolvimento socioeconômico tão robusto em um único governo.
Juscelino assumiu em 1956, com o lema “50 anos em 5”, prometendo a modernização e a industrialização do Brasil em ritmo acelerado. A História mostrou que o discurso desenvolvimentista de JK não era mera retórica nem promessa vã, típica das campanhas eleitorais.
Para atingir seu objetivo, concebeu o Plano Nacional de Desenvolvimento, um conjunto de 30 metas a serem alcançadas em cinco anos, prioridade absoluta de seu governo, anunciadas a todos os brasileiros na primeira reunião ministerial. De tão importante, o presidente não delegou a nenhuma pasta a execução da ideia, mantendo a gestão vinculada diretamente a si.
O governo de Juscelino concentrou-se em consolidar a industrialização pela instalação da indústria pesada – notadamente a automobilística –, à multiplicação de siderúrgicas, ao desenvolvimento da construção naval, no fortalecimento do potencial energético, e no forte investimento em transportes e na produção agrícola.
A somatória de todas as iniciativas, coordenadas, resultou em extraordinária mudança para o País. A produção industrial subiu 80%; a média de crescimento anual do PIB brasileiro saltou para inéditos 8,06% ao ano; a produção de equipamentos de transportes cresceu mais de 600% e a política agrícola acusou expressivo crescimento na produção de alimentos e grãos, impulsionada também pela fabricação nacional de tratores. A potência energética aumentou mais de 60% e o número de rodovias asfaltadas foi quintuplicado.
Das 30 metas de seu plano, JK cumpriu integralmente 80%, sem se descuidar das metas fiscal e de inflação, cruciais para o equilíbrio da economia. O 31º objetivo acrescido ao plano inicial foi a construção de Brasília, transferindo a capital federal para o planalto central, marco da interiorização do desenvolvimento e essencial para o desenvolvimento daquela região do País. Não foi promoção pessoal, mas sim o cumprimento do quanto estabelecido desde a Constituição de 1891, previsto em seu artigo 3º (que detalhava até a área).
Não há dúvidas de que os cinco anos do governo JK construíram uma ponte indestrutível entre o velho e novo Brasil. Em 1960, as bases do desenvolvimento estavam consolidadas e, com elas, criadas as condições para os avanços nas próximas décadas. A visão de futuro de JK foi um marco para o fantástico agrobusiness brasileiro na região Centro-oeste.
A verdade é que, 60 anos depois, período no qual o Brasil superou turbulento período político, alcançou a redemocratização e conseguiu estancar a vertiginosa inflação com o Plano Real – que estabilizou a moeda –, a nação não mais voltou a experimentar uma fase tão benéfica.
Os avanços registrados desde então foram incapazes de reduzir as desigualdades sociais e regionais, de sustentar o ritmo de desenvolvimento e, ainda, de oferecer condições de vida digna à maior parte da população.
Eleição após eleição, governo após governo, o País segue patinando, apesar de seu enorme potencial econômico. Boa parte disso se explica pela ausência de um plano vintenário, de caráter socioeconômico-ambiental, voltado a ações de Estado (não de governos) definidas para induzir o desenvolvimento sustentável, de forma planejada, crescente, com segurança jurídica, exploração responsável de suas imensas riquezas naturais, e ampliação e diversificação de seu parque industrial.
É inegável que, há décadas, os governos têm-se dedicado a apresentar soluções espasmódicas para problemas graves, obviamente com resultados meramente paliativos. Não é de se estranhar, portanto, que mesmo se colocando entre as dez maiores economias do mundo o Brasil continue apresentando indicadores medíocres na mensuração da qualidade de vida da população.
O maior exemplo desse terrível paradoxo está no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), no qual o Brasil ocupa apenas a 84ª posição no ranking das Organizações das Nações Unidas (ONU), tendo caído 11 posições nos últimos três anos. Mas não é só. Em 2024, nosso País atingiu o maior nível internacional de desigualdade entre 56 nações analisadas, segundo o coeficiente Gini, utilizado para medir a disparidade na distribuição de renda ou riqueza de uma população, conforme divulgado pelo Relatório Global de Riqueza 2025.
Essas são apenas duas marcas negativas – entre tantas –, de um País que mergulhou em um poço aparentemente sem fundo de privilégios e impunidade, com verdadeiras castas cada vez mais bem remuneradas graças a penduricalhos que furam o teto remuneratório constitucional e muitas vezes são isentos de Imposto de Renda. Enquanto isso, mais de um terço (35,6%) da população sobrevive com renda inferior a 1 salário mínimo/mês, em situação de acentuada pobreza. Não se pode ignorar que o salário mínimo nacional é o 2º menor entre os 9 países da América do Sul, superando apenas o da trágica Venezuela
Para deixar, de uma vez por todas, de ser o “país do futuro”, para ser uma nação justa e solidária, o Brasil precisa ser repensado, voltando-se os olhos para a realidade nua e crua dos brasileiros de todas as regiões. É fundamental ter vontade de ver e de ouvir, sensibilidade para captar, humildade para primeiro admitir e depois corrigir os erros, capacidade para gerenciar, firmeza para a tomada de decisões, inteligência para definir um plano de ações a longo e médio prazo, e coragem para executá-lo ainda que os obstáculos sejam muitos.
Há um bom exemplo na história para guiar nossos governantes, o Brasil está ansiosamente aguardando que a eleição que se avizinha agora em 2026 traga um novo estadista a deixar um legado como Juscelino, alguém que pense além do seu mandato e não em reeleição. Sempre lembro do conselho do imortal Ariano Suassuna “O otimista é um tolo. O pessimista, um chato. Bom mesmo é ser um realista esperançoso.”
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