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{ ARTIGO }

Ajuste fiscal precisa cortar renúncias fiscais bilionárias

Senadora Zenaide Maia (PSD-RN) defende programas sociais e critica “caixa-preta” que beneficia grandes empresas

Zenaide Maia, médica e senadora pelo PSD do Rio Grande do Norte

Edição Scriptum

 

Ajuste fiscal de verdade não corta despesas primárias de saúde e educação, porque não podemos deixar crianças sem escola e deixar pessoas morrerem de morte evitável. Nenhum país se desenvolveu e cresceu economicamente sem a redução das desigualdades sociais

Hipocrisia, não! O Congresso Nacional não pode exigir que apenas o governo federal faça ajuste nas contas públicas se o próprio Senado aprovou e está querendo aprovar renúncias fiscais bilionárias para empresários super ricos.

Tenho feito campanha contra propostas absurdas como o projeto de lei 596/2023, que perdoa uma dívida bilionária de empresas que não pagaram a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Ficaram mais de uma década sem pagar imposto sobre lucro, perderam na Justiça e logo conseguiram um projeto no Senado para embolsar o que deviam aos cofres públicos.

Esse imposto não pago é dinheiro que falta para merenda, escola, remédio, posto de saúde, estrada, moradia, segurança, saneamento, transporte público. Cobro que o Parlamento brasileiro seja rigoroso e responsável na concessão e na revisão dessas renúncias e isenções de imposto. Afinal, política séria exige coerência: responsabilidade fiscal é tarefa conjunta dos Três Poderes da República que compõem o Estado brasileiro: Legislativo, Executivo e Judiciário.

Pois os dados chocam num dos países com mais desigualdade de renda do mundo: segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os 10% da população brasileira com os maiores rendimentos recebem 13,4 vezes o que ganham os 40% da população com os menores rendimentos. Enquanto isso, as isenções ou descontos de impostos concedidas pelo governo devem passar de meio trilhão de reais (R$ 500 bilhões) neste ano.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que o Brasil tem uma “caixa-preta” de R$ 800 bilhões em renúncias fiscais e que o agronegócio brasileiro soma R$ 158 bilhões de renúncias tributárias.

A imprensa tem frequentemente apontado a distorção com que o governo brasileiro premia os mais ricos, os que mais lucram. A renúncia fiscal nos Estados e no Distrito Federal triplicou nas últimas duas décadas, de R$ 87,89 bilhões, em 2015, para cerca R$ 266,52 bilhões, em 2025, segundo a Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital (Fenafisco). Em meio a debates polarizados sobre ajuste fiscal, o Ministério da Fazenda divulgou lista inédita de empresas beneficiadas por renúncias fiscais.

Os mais ricos não querem pagar imposto neste país! Precisamos limitar o libera-geral das isenções fiscais e vincular esses benefícios a controles mais efetivos e a indicadores mais compatíveis com a arrecadação. E, também com isso, devemos proteger de cortes, em casos de freios obrigatórios no orçamento público, os investimentos e aplicações em áreas essenciais de saúde e educação, por exemplo. Temos, sim, que cortar renúncias fiscais quando houver necessidade de reduzir o orçamento. Não há mais o que tirar dos pobres deste país, que sempre pagam a conta.

Vencer tabus

Ressalto, ainda, que um verdadeiro pacote de ajuste fiscal tem que vencer tabus que, até hoje, ninguém ousa enfrentar por medo do mercado financeiro e das grandes empresas que mandam neste país.

Ajuste fiscal de verdade acaba com essa excrescência que é todo ano o sistema financeiro ficar com quase 50% do orçamento geral da União. É uma fortuna que entregamos de mão beijada para bancos sem que ninguém discuta. São serviços e juros de uma dívida pública que – pasmem! – nunca foi auditada, mesmo isso sendo previsto na Constituição.

Estados Unidos e Japão são as maiores dívidas públicas do mundo, mas chamam os bancos à mesa e, sem fazer calote, limitam esse pagamento da dívida a um porcentual no orçamento público. Porque esses grandes países não abrem mão de investir em questões vitais de soberania nacional, de responsabilidade pública e de liberdade de governo: saúde, educação, infraestrutura. Não é calote: é justiça, é bom senso, é combate ao sequestro da máquina pública por interesses financeiros privados.

Ajuste fiscal de verdade tem que fazer o orçamento de saúde, da educação e da segurança pública deixarem de totalizar menos de 10% do orçamento geral da União todo ano. Porque metade do orçamento federal brasileiro vai para os bancos, e ficamos aqui, no Congresso, decidindo sobre para onde irão apenas 10% dos recursos de impostos pagos pelo povo e que não voltam até ele.

Programas sociais

Começar ajuste fiscal fazendo pente-fino em programas sociais, onde a tesoura sempre corta primeiro, é uma forma recorrente, há séculos, de exterminar qualquer forma de combate à pobreza em nome de manter privilégios de uma minoria. O pobre sempre paga a conta. E nunca vimos um país tão esfacelado e violento, com uma juventude tão desanimada de sonhos e sem perspectivas de prosperar.

Ajuste fiscal de verdade tem que rediscutir essas renúncias tributárias bilionárias que o governo e o Congresso promovem para setores da economia que não querem pagar imposto, não querem contribuir com suas obrigações legais. Quem lucra explorando a mão de obra dos trabalhadores e os recursos naturais do país precisa, SIM!, se comprometer com a coletividade.

Ajuste fiscal de verdade tem que reduzir drasticamente a taxa de juros escandalosa que empresas e bancos cobram das pessoas no cartão de crédito e do cheque especial. Eu luto para aprovar minha Proposta de Emenda à Constituição (PEC 79/2019) que faz isso.

Privilégios

Ajuste fiscal tem que tirar dos bancos privados e públicos a remuneração das sobras de caixa que o Tesouro Nacional compra todo dia. É R$ 1 trilhão que os bancos privados e públicos deixam de emprestar para micro e pequenos empreendedores porque é mais lucrativo para eles esperar o final do dia e lucrar com o Tesouro Nacional comprando essas sobras.

Ajuste fiscal de verdade gera arrecadação com tributação dos mais ricos, de empresas offshores, faz uma reforma do imposto de renda, cobra em cima da renda e não do consumo. Quem ganha mais tem que pagar mais!

Ajuste fiscal de verdade não corta despesas primárias de saúde e educação, porque não podemos deixar crianças sem escola e deixar pessoas morrerem de morte evitável.

Nenhum país se desenvolveu e cresceu economicamente sem a redução das desigualdades sociais. Nenhum! Que aprendamos com a História, para não errarmos mais uma vez.

 

Artigo publicado no jornal O Estado de S.Paulo em 10 de julho de 2025.

 

Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.


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