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{ ARTIGO }

Estória e história ou histórias?

Luiz Alberto Machado usa o Nobel Douglass North como referência para uma reflexão sobre o desempenho das economias ao longo dos anos

 

Luiz Alberto Machado, economista e colaborador do Espaço Democrático

Edição Scriptum

 

Afeito à leitura desde tenra idade, lembro-me de ter sido alertado há muito tempo sobre a diferença entre estória e história. A primeira, com “e”, referia-se a uma narrativa de cunho popular ou ficcional, enquanto a segunda, com “h”, referia-se ao estudo dos acontecimentos passados, geralmente da humanidade, e à ciência que analisa esses acontecimentos de forma crítica e racional. Trata-se, portanto, do estudo da investigação, do conhecimento adquirido por meio da investigação, que visa compreender o passado e suas relações com o presente.

Em minha carreira acadêmica, quase toda ocorrida em cursos de ciências econômicas, ministrei por muitos anos os conteúdos do chamado núcleo histórico, constituído das disciplinas História Econômica Geral, Formação Econômica do Brasil e História do Pensamento Econômico.

Por essa razão, participei de inúmeros seminários, congressos e workshops referentes à área, nos quais prevaleciam, indiscutivelmente, historiadores com a visão marxista da história, consubstanciada na dialética materialista, uma combinação da dialética hegeliana e do materialismo histórico. Em outras palavras, a história era vista como uma sucessão de modos de produção que tinha como motor a luta de classes.

Quando algum participante − eu, muitas vezes − propunha outra visão da história, era pura e simplesmente ignorado, quando não agredido e ofendido de diversas formas.

Não raras vezes, nessas oportunidades, os historiadores questionavam inclusive se as referidas disciplinas poderiam ser ministradas por graduados em outros cursos, inclusive os de ciências econômicas.

Recentemente, lendo Da alma e dos ossos: aforismos de crítica cultural: uma ciência melancólica, o mais recente livro de Luiz Felipe Pondé (Rio de Janeiro: Edições 70, 2025), que afirma ter se afastado do marxismo, tornando-se conservador, estranhei quando me deparei com o seguinte trecho:

Mudanças de impacto social e psicológico só ocorrem quando ocorrem mudanças no modo material de uma sociedade produzir seus meios de sobrevivência e sua organização institucional. Nada indica que isso ocorrerá num futuro próximo, portanto, devemos esperar mais do mesmo em temos de falácia da educação. E mais idiotas no horizonte que não sabem da sua condição.

Lembrei-me imediatamente das ocasiões em que fui olhado com desconfiança por admitir outras formas de entender a história.

Diante disso, foi reconfortante me deparar com um trecho do livro Instituições, mudança institucional e desempenho econômico, de Douglass North (São Paulo: Três Estrelas, 2018), em que afirma:

A história importa. Importa não só porque podemos aprender com o passado, mas também porque o presente e o futuro estão relacionados com o passado por meio da continuidade das instituições de uma sociedade. As escolhas de hoje e de amanhã são moldadas pelo passado, e o passado só pode se tornar inteligível como um caso de evolução institucional. Integrar as instituições à teoria econômica e à história econômica é um avanço essencial no aperfeiçoamento dessa teoria e dessa história.

Tal visão, do principal expoente da escola neoinstitucionalista de pensamento econômico, foi reforçada em 1993, quando foi laureado com o Prêmio Nobel de Economia. Iniciou seu discurso de aceitação do prêmio falando[1]:

A história econômica versa sobre o desempenho das economias no transcurso dos anos. O objetivo das investigações neste campo não é somente permitir que o passado econômico se torne mais claro, mas também contribuir para a teoria econômica ao proporcionar um marco analítico que permita compreender a mudança econômica.

Confesso me sentir bem mais confortável diante de uma posição dessa natureza vinda de um respeitável economista, cuja teoria está fortemente fundamentada na história.

 

[1]   NORTH, Douglas. El desempeño económico a lo largo del tiempo. Conferência de Douglass North em Estocolmo, Suécia, 9 de dezembro de 1993. Disponível em

 

Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.


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