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{ ARTIGO }

Falta de compromisso com o equilíbrio fiscal

Candidatos prometem realizar obras e resolver quaisquer problemas sem apontar fontes de financiamento, escreve o economista Luiz Alberto Machado

Luiz Alberto Machado, economista e colaborador do Espaço Democrático

Edição Scriptum

 

Ao acompanhar o noticiário ou ouvir os depoimentos de muitos candidatos à prefeitura na campanha eleitoral gratuita, impossível não se preocupar com a evidente falta de compromisso com o equilíbrio fiscal. A impressão que se tem é que não há limites para os titulares de cargos executivos que prometem realizar obras e resolver quaisquer problemas sem apontar as respectivas fontes de financiamento.

Em sua coluna para O Estado de S.Paulo do último dia 8 de setembro1, o ex-ministro Pedro Malan citou diversas frases do presidente Luiz Inacio Lula da Silva que mostram sua firme convicção de que é preciso gastar para obter crescimento econômico, independentemente da existência de recursos para fazer frente a tais gastos.

Numa interessante analogia, Malan afirmou que “à diferença do poeta Fernando Pessoa, que chegava a fingir que era dor a dor que deveras sentia, o presidente Lula está convencido de que não são gastos certos gastos que deveras realiza”. Em complemento à analogia, o ex-ministro ressalta que Lula “não só está convencido, como pretende convencer o público em geral de que muitos dos seus gastos − todos com alta taxa de retorno social, ou compromissos de campanha que devem ser honrados − são, na verdade, investimentos no País e no seu futuro”.

Explicando que não há novidade nesse comportamento e que o presidente está sendo coerente com suas convicções, Malan relembra artigo de 10 de novembro de 2022 para a Folha de S.Paulo, em que o jornalista Bruno Boghossian listou quatro declarações de Lula: “Colocar pobre na universidade não é gasto, é investimento” (9/2019); “A quem interessa o teto de gastos, aos banqueiros?” (6/2021); “Vamos gastar o que for preciso” (3/2022); “Nós precisamos, primeiro, pagar a dívida que temos com o povo pobre” (4/2022).

A rigor, esse tipo de raciocínio ficou claro desde o início do atual governo, quando, na primeira reunião de sua equipe, Lula pediu que a equipe aposentasse do vocabulário a palavra “gasto”. Disse que o governo não deixaria de enfrentar a questão fiscal, mas insistiu em que o gasto social devia ser encarado como investimento, e não como despesa.

Como prova da coerência das ações do presidente na linha de que “gasto é vida”, Malan lembrou que em declaração recente Lula afirmou ser “necessário fazer a discussão para saber se precisa efetivamente conter gastos ou se precisa aumentar a arrecadação”. E acrescentou que seu governo está fazendo uma análise sobre se está havendo gasto exagerado, mas que essa análise está sendo feita − há mais de 20 meses − sem levar em conta “nervosismo de mercado”.

Com isso, a velocidade do crescimento do gasto público levou a despesa primária do governo central de 11% do PIB em 1991/1992 para 20% do PIB em 2016. E o País exibe déficit primário há uma década desde 2014 e, ao que tudo indica, poderá tê-lo também em 2024 e, talvez, 2025/2026.

Deslocando o foco para o âmbito municipal, e tomando por base as promessas da maioria dos candidatos a prefeito nas campanhas veiculadas no horário eleitoral gratuito, fico com a certeza de que há um completo desconhecimento da real situação fiscal das cidades que pretendem governar. Caso houvesse tal conhecimento, em vez de prometerem obras e soluções a qualquer custo, deveriam enfatizar o que fazer para reverter o quadro divulgado no final de 2023 pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM), segundo a qual 51% dos municípios do Brasil registraram déficit fiscal no primeiro semestre de 2023. O estudo “O contexto da crise fiscal nos Municípios”, feito pela organização, revela um déficit de R$ 17,9 bilhões e comprometimento da gestão de 50% dos municípios brasileiros, que tiveram receitas insuficientes para a prestação de serviços públicos essenciais à população. As principais fontes de gastos identificadas no estudo foram os pagamentos de pessoal, investimentos e custos operacionais de programas.

Esse amplo conjunto de evidências de ausência de compromisso com o equilíbrio fiscal me remete a James Buchanan, principal expoente da escola da escolha pública (public choice theory) e ganhador do Prêmio Nobel de Economia em 1986. Preocupado com o avanço da intervenção governamental na economia, Buchanan propôs limites constitucionais ao uso dos déficits orçamentários por parte de governos que, dessa forma, transferiam para o setor público decisões que deveriam caber ao setor privado.

Juntamente com a escola do direito de propriedade, que tem em Ronald Coase seu maior expoente, e a escola neoinstitucionalista, que tem Douglass North como maior destaque, a escola da escolha pública tem uma abordagem que admite um estreito relacionamento entre a economia, o direito e a política. Por propor limites constitucionais à intervenção governamental, a escola da escolha pública também foi chamada de escola constitucionalista.

Diante de tão flagrantes exemplos de falta de compromisso com o equilíbrio fiscal por parte do presidente da República e de aspirantes ao executivo municipal, não consigo esquecer do alerta de James Buchanan à complicada convivência entre os políticos e a economia, principalmente em épocas de eleições: “o político é o indivíduo que pede dinheiro aos ricos e votos aos pobres, prometendo, se eleito, defender uns dos outros”.

1 MALAN, Pedro. Crescentes incertezas até outubro de 2026. O Estado de S. Paulo, 8 de setembro de 2024. Disponível em https://www.estadao.com.br/opiniao/pedro-s-malan/crescentes-incertezas-ate-outubro-de-2026/.

 

Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.


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