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{ ARTIGO }

Justiça sim, justiçamento não

Vilmar Rocha usa o pensamento de Rui Barbosa para comentar a condenação das pessoas envolvidas nos atos políticos de 8 de janeiro

Vilmar Rocha, advogado e professor de Direito da Universidade Federal de Goiás, é coordenador nacional de Relações Institucionais do Espaço Democrático

Edição Scriptum

A condenação das pessoas envolvidas nos atos políticos de 8 de janeiro de 2023 merece uma reflexão não apenas pelo fato em si, que adianto não considerar uma tentativa de golpe de Estado, mas invasões e depredações do patrimônio público em Brasília, crimes passíveis de responsabilização, desde que julgados pelo juiz natural.

Cabe analisar, ao largo das paixões político-ideológicas, a condução que o STF deu ao caso a partir da interpretação do ministro Alexandre de Moraes, relator do processo, de que o grupo agiu com a intenção de derrubar o governo e dar um golpe de estado. Tal narrativa, avalizada pelos seus pares, carreou o processo para o STF.

Moraes, em um ato de abuso de poder, tomou para si e para o Supremo a competência para julgar os participantes dos atos de 8 de janeiro, o que nos leva a dois equívocos jurídicos que comprometem a Justiça.

Um diz respeito aos crimes pelos quais foram condenados. Até o momento, os 227 réus foram condenados por associação criminosa armada, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de estado, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. Não houve tentativa de deposição de um governo legitimamente estabelecido nem de abolição do Estado Democrático.

O outro equívoco que aponto aqui é a incompetência da Corte para julgar tais casos, uma vez que a Constituição de 1988 definiu que infrações penais comuns de pessoas que não possuem foro privilegiado não estão dentre as competências do Supremo. A condenação dos envolvidos pelo mais alto tribunal jurídico brasileiro viola o processo legal sob outro aspecto, ao impedir os condenados de recorrer da decisão, porque não há outra instância revisora acima do STF.

Diante da usurpação de competência do juiz natural e da condenação por atos que não caracterizam um golpe de Estado, para se fazer Justiça teria o STF de fazer uma autocrítica e autocontenção, propondo uma ampla revisão de todos processos, desta vez na Justiça Federal do DF.

Outro instrumento de Justiça seria a anistia, a ser concedida pelo Congresso Nacional, como define a Constituição Federal: cabe ao Congresso Nacional dispor sobre todas as matérias de competência da União, inclusive sobre concessão de anistia.

Intempestivamente, Moraes reivindicou para si a palavra final sobre anistia aos presos do 8 de janeiro, o que surpreendeu o mundo jurídico. No Fórum Jurídico de Lisboa, em junho deste ano, o ministro afirmou que quem admite a anistia é a Constituição Federal e quem interpreta a Constituição é o Supremo.

Todavia, não cabe uma revisão constitucional nesse caso, uma vez que a Constituição não lista os crimes citados nas condenações como insuscetíveis de graça ou anistia, ademais crimes contra o Estado de Direito e de associação criminosa são considerados hediondos quando “direcionado à prática de crime hediondo ou equiparado”.

Coloco-me no dever de lutar pela Justiça e denunciar o justiçamento, pois “a Justiça, cega para um dos dois lados, já não é Justiça”, disse o grande Rui Barbosa.

Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

 


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