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{ ARTIGO }

Mudança na estimativa da população faz crime “crescer” no País

Dados do censo mostram que é preciso recalcular todas as taxas e fórmulas, entre outras, a do número de policiais por habitante, para efeito de alocação de recursos humanos e financeiros

 

Tulio Kahn, sociólogo e colaborador do Espaço Democrático

Edição: Scriptum

 

A prévia do Censo de 2022 estimou a população brasileira em cerca de 207,7 milhões de habitantes, bem menor do que os 214,7 milhões projetados para o Tribunal de Contas da União (TCU) para o mesmo ano, para efeitos de distribuição de recursos aos municípios. A contagem populacional de 2015 deixou de ser realizada, mas os demógrafos estimavam esta magnitude usando, grosso modo, o Censo de 2010 e o número de nascimentos e mortes anuais compilados pelo Ministério da Saúde.

Em termos absolutos, a diferença foi de quase 7 milhões de pessoas, o que equivale a um erro de 3,3%. Vendo a diferença de outra forma, a variação populacional entre o Censo de 2010 e o de 2022 era estimada em 12,5%, mas a população cresceu apenas 8,9% no período, o que dá um crescimento anual inferior ao esperado.

Existem diversas hipóteses para explicar estas diferenças nas estimativas populacionais: diminuição mais acelerada da taxa de fecundidade, aumento da imigração, aumento da mortalidade em razão da pandemia, subnotificação dos dados de 2022 (pois se trata de uma prévia e podem ter ocorrido problemas de qualidade na coleta em razão das dificuldades de gestão do censo), entre outras explicações.

Estas diferenças populacionais têm diversas implicações, que vão desde o cálculo dos recursos recebidos do Fundo de Participação dos Municípios a mudanças nas tendências criminais. Com efeito, todas as taxas e fórmulas que utilizam a população na composição do cálculo serão alteradas. Mas quão grandes serão estas alterações? Lembremos que 3,3% é o erro médio nacional, mas quando analisamos Estados ou municípios este erro pode ser maior ou menor.

A tabela abaixo traz a população observada pelo IBGE no Censo de 2022, por Estado. O erro absoluto com relação à população estimada pelo TCU em 2022 e o erro percentual. Traz também o número de homicídios dolosos em 2022, segundo o SINESP/MJ, a taxa de homicídio prevista, a taxa de homicídios observada usando a nova estimativa do censo no denominador. Nas últimas duas colunas, finalmente, o erro absoluto e o erro percentual em razão da mudança na estimativa populacional.

 

 

A tabela mostra que o erro de estimativa populacional, em alguns Estados, foi bem superior à média. Regiões de expansão agrícola como Mato Grosso, Santa Catarina e o Paraná cresceram mais do que o previsto. Roraima é o caso extremo, com quase 13% mais população do que a projetada originalmente. A migração interna em busca de oportunidades pode explicar parte desta discrepância.

Por outro lado, a região Norte, de modo geral, cresceu menos que o previsto. Rondônia é o caso extremo, com -14,5% de erro. Programas de transferência de renda podem ter contribuído para uma diminuição do número de filhos pelas famílias, na última década? É preciso ainda aprofundar os motivos das diferenças, recém-descobertas.

E como as taxas criminais foram alteradas? Como a população entra no denominador da taxa de homicídios, nos Estados que “perderam” população (mais corretamente, que cresceram menos do que o projetado), as taxas de homicídio ficaram maiores do que as previstas, enquanto o inverso ocorre nos poucos Estados onde a população aumentou mais que o esperado. Na média, a taxa nacional de homicídios sofre uma alteração de 3,4% em 2022, pulando de 17,43 para 18,02. Um “erro” de 3,4%. Mas como vimos ao analisarmos a população, o erro pode ser muito maior quando analisamos Estados ou regiões específicas.

Assim, por exemplo, o Acre teve 60 mil pessoas a menos do que o previsto. Sua taxa de homicídio por 100 mil habitantes foi, na verdade, de 24,9:100 em vez de 23,2:100. Em outras palavras, ela é 7,3% maior, se levarmos em conta o tamanho real da população, segundo o Censo de 2022. As maiores mudanças ocorrem em Rondônia e no Distrito Federal. Por outro lado, Roraima teve 72 mil habitantes a mais do que o previsto e suas taxas de homicídios caem de 29:100 para 26:100, melhorando em torno de 11%. Por curiosidade, observem que Rondônia e Roraima praticamente invertem de posição no ranking de homicídios, pois Rondônia sobe de 25:100 para 29:100 com a correção da população.

O efeito não é drástico: de modo geral, as taxas de homicídios continuam baixas onde eram baixas e continuam altas onde eram altas. Mas é preciso recalcular todas as taxas e fórmulas, entre outras, a do número de policiais por habitante, para efeito de alocação de recursos humanos e financeiros. As diferenças municipais devem ser mais extremas do que as observadas ao nível dos Estados e ainda precisam ser calculadas.

O fato inconteste é que a população cresceu relativamente menos do que se esperava. Esta pode ser umas das melhores explicações para a queda dos índices criminais nos últimos anos e é preciso uma contagem populacional correta para projetar o que nos aguarda o futuro.

Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

 


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