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{ ARTIGO }

Obrigado por me odiarem

O embate entre Brasil e Estados Unidos é o do chihuahua contra o doberman, escreve Rubens Figueiredo

Rubens Figueiredo, cientista político e colaborador do Espaço Democrático

Edição Scriptum

 

Somos um protozoário em termos de abertura econômica, criamos barreiras de todo tipo e Donald Trump, presidente da nação mais rica do planeta, não é flor que se cheire. O Brasil contribui com modestos 1,3% do comércio mundial. Para os Estados Unidos, somos responsáveis por algo em torno de 2% das suas trocas externas — um número que mal arranha a superfície da sua atenção estratégica. Ainda assim, insistimos em nos comportar como protagonistas de um jogo do qual somos uma espécie de gandulas.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva resolveu distribuir ofensas e provocar Trump, que já é naturalmente irritado. Chamou-o de sociopata e fascista. Comparou-o a um “câncer da política internacional”. Disse que “a vitória de Trump representava uma derrota para a humanidade”. Além da ampla narrativa contra os EUA imperialistas, apoiadores de golpes, capitalistas exploradores e por aí vai.

A cena: um chihuahua latindo furiosamente para um doberman com o humor de quem topou a unha do dedinho do pé na quina do guarda-roupa, esperando que ele responda com uma lambida, abanando o rabo. É como fazia um amigo espirituoso: comia em um restaurante de altíssimo nível e bebia vinho francês. Quando o maitre trazia a conta, dizia: “estou esperando meu troco.” O Brasil parece fazer esse papel, só que invertido — falou mal, provocou, confrontou… e agora espera que os Estados Unidos digam: “obrigado por vocês nos odiarem.”

O contraste estrutural entre os dois países comprova que, realmente, eles precisam ouvir mais as reprimendas do presidente Lula. O Produto Interno Bruto americano ultrapassa os 28 trilhões de dólares. O brasileiro, fica na casa dos dois trilhões. A renda per capita nos Estados Unidos é de 85 mil dólares por ano; a nossa, em torno de 10 mil. A produtividade média do trabalhador americano é quatro vezes superior à do brasileiro. E, se falamos de empreender, a diferença é ainda mais gritante: abrir uma empresa nos EUA leva algumas horas. No Brasil, às vezes temos que apresentar o atestado de óbito atualizado com firma reconhecida de alguém que herdou o terreno no qual está construído atualmente de forma ilegal o imóvel que iremos alugar para abrir um restaurante.

No campo tributário, o Brasil tem uma carga de cerca de 33% do PIB, com uma estrutura caótica: mais de 60 tributos, disputas entre entes federativos, insegurança jurídica e um contencioso estimado em R$ 5 trilhões. Nos Estados Unidos, a carga é menor — cerca de 27%. E o imposto é sobre renda de uma população rica, não sobre o consumo de um povo pobre.

Ah…os juros. Enquanto os Estados Unidos mantêm sua taxa básica em 4,25% e a inflação não oscila por causa do ovo, o Brasil segue praticando juros reais que beiram os 15%, a segunda maior do mundo. Pedir um financiamento lá é ser empreendedor, um prêmio à iniciativa. Aqui, um convite à falência. Nos EUA o leasing funciona. Com mil dólares você sai dirigindo um bom carro da loja. Aqui, com esse valor, o vendedor nem te atende.

Mesmo assim, queremos liderar o Sul Global, mediar conflitos internacionais, reformar a ONU, mandar nos BRICS, no G20, dizer que estamos ao lado da China na luta pela hegemonia mundial, investir recursos da nação em títulos da dívida da Venezuela, tentar achar petróleo na Namíbia, questionar o dólar como padrão monetário internacional. Com essa empáfia e sofisticação estratégica, até que demorou para o doberman resolver parar de abanar o rabo.

 

Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.


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