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{ ARTIGO }

Surfando no Mundo BANI

Economista Luiz Alberto Machado escreve sobre o livro de autoria da engenheira especializada em Marketing e em Ciências Humanas Silvana Pretto Zanon

 

Luiz Alberto Machado, economista e colaborador do Espaço Democrático

Edição: Scriptum

 

“A tecnologia veio para reduzir o tempo gasto em trabalhos rotineiros e maçantes, liberando tempo para o exercício da criatividade e para a busca de um propósito.”

Silvana Pretto Zanon

 

Faz parte da natureza humana identificar a tudo e a todos, preferencialmente atribuindo-lhes uma denominação específica. No livro Economia + Criatividade = Economia Criativa, publicado pelo Espaço Democrático, há uma menção aos princípios do cérebro, uma síntese das contribuições de dois renomados especialistas, Howard Gardner e Tony Buzan, que permite que qualquer pessoa tenha certa compreensão de como o nosso cérebro funciona, como se relaciona com os outros sentidos e como pode estimular ou bloquear a nossa criatividade. Essa síntese elenca oito princípios: radiância, sinergia, associação, multissensorialidade, feedback, significado, mímica e probabilidade. Um deles, o do significado, refere-se exatamente a essa aspecto da natureza humana e está assim descrito no referido livro (2021, p. 89).

Significado: Este é um princípio bastante interessante, e também muito fácil de se comprovar. O princípio do significado demonstra que, se a um indivíduo for fornecido um estímulo qualquer que ele não consiga entender racionalmente, ele automaticamente buscará pontes entre este estímulo e algum significado que possa associar com o mesmo, de forma a poder “pendurá-lo” a alguma rede neuronal. Este princípio também pode ser entendido como se o cérebro fosse um mecanismo que sempre busca a verdade, um sentido ou uma explicação para as coisas, de forma a poder posicioná-las dentro de sua rede de conexões neuronais e sinápticas.

Em decorrência dessa característica, constata-se em diferentes segmentos o surgimento de designações que passam a ser utilizadas com o objetivo de identificar determinados grupos ou categorias.

Exemplo que se tornou bastante conhecido disso ocorreu com as diferenças geracionais, que passaram a ser identificadas no universo do marketing da seguinte forma, de acordo com a revista Consumidor Moderno:

  • Baby Boomers: nascidos entre 1945 e meados dos anos 1960. Nascida sob guerras e descobertas científicas, essa geração incorporou a palavra “trabalho” como nenhuma outra. Preza pela estabilidade financeira e costuma ser fiel a seus empregadores. Ainda incompreendidos pelas marcas, os consumidores dessa geração valorizam a durabilidade e o conforto dos produtos que consomem.
  • Geração X: nascidos entre meados dos anos 1960 e início dos anos 1980. Cercada por grandes construções, trata-se da geração que ligou o motor do desenvolvimento, da globalização e da tecnologia. Esse grupo tem muito mais intimidade com a tecnologia do que a geração anterior.
  • Millennials (ou Geração Y): nascidos entre o início doas anos 1980 e meados dos anos 1990. Profissionalmente indecisos, eles buscam um propósito maior em suas atividades no ambiente de trabalho. A geração que vivenciou a revolução da internet também deu início à grande onda de empreendedorismo e startups. Por isso, mais importante do que ter dinheiro é estar feliz.
  • Geração Z: nascidos entre meados dos anos 1990 e 2009. Os que nasceram nessa época já percebem os dispositivos digitais como algo natural em suas vidas. No Brasil, essa geração já representa 20% da população do País. Chamados de “nativos digitais”, eles redescobriram o poder de comunicação dos vídeos e veem o YouTube como uma grande oportunidade de negócio.
  • Geração Alpha: nascidos a partir de 2010. Tal qual a Z, tem a tecnologia ocupando a centralidade de suas decisões. Serão monitorados e devem acompanhar uma profunda mudança nos processos de aprendizagem fortemente aliados à tecnologia.

 

O mesmo fenômeno verificado no universo do marketing ocorreu no universo corporativo, no qual o mercado passou a utilizar acrônimos para identificar as características predominantes nas últimas décadas. Assim se explica as denominações Mundo VUCA e Mundo BANI.

O chamado Mundo VUCA é um conceito relacionado aos imprevistos e rapidez com que as mudanças ocorrem no mercado. Essa ideia de que as coisas acontecem muito mais rápido do que antes já deve ter passado pela cabeça de muita gente em algum momento e lidar com isso é justamente entender o que é o Mundo VUCA.

Criado no começo da década de 1990, o conceito de mundo VUCA é típico de um cenário mundial que saía da polarização da Guerra Fria, em que não se tem mais o embate tradicional entre as ideias de duas forças hegemônicas (mundo bipolar). Com isso, o exército americano, que “perde” seu inimigo tradicional, passa a ter que lidar com a incerteza do seu propósito.

Tendo surgido no âmbito da estratégia militar, a ideia de Mundo VUCA foi estendida ao mercado e, a partir daí, as implicações se multiplicam em razão dos diversos tipos de mercados existentes e da própria expansão da globalização.

Baseado nas teorias de Warren Bennis e Burt Nanus, VUCA é uma sigla que surgiu para definir a realidade vivida no planeta e ficou em uso até pouco tempo. Seu significado é o seguinte:

V = Volatility (Volatilidade)
U = Uncertainty (Incerteza)
C = Complexity (Complexidade)
A = Ambiguity (Ambiguidade)

Como, no entanto, o ambiente corporativo vive em constante mudança, é fundamental que as empresas tenham capacidade de analisar o cenário atual para estarem preparadas para os desafios que serão enfrentados. Por isso, a realidade descrita pelo Mundo VUCA não poderia continuar a mesma. Pensando nisso, o antropólogo e autor futurista Jamais Cascio desenvolveu o conceito de Mundo BANI:

B = Brittle (Frágil)
A = Anxious (Ansioso)
N = Nonlinear (Não-linear)
I = Incomprehensible (Incompreensível)

De acordo com a FIA Business School, a evolução do Mundo VUCA para o Mundo BANI implica em:

1º. Da volatilidade para a fragilidade: No Mundo VUCA, a volatilidade fez com que a gente se tornasse mais frágil. Nosso cérebro não acompanha a quantidade de mudanças. A grande maioria das pessoas vive uma hipnose operacional. Em outras palavras, vive-se no automático. Do Mundo VUCA ao Mundo BANI, o que antes era volátil hoje em dia traz fragilidade. Sem dúvida, nunca se exigiu das pessoas ter tal grau de resiliência. Hoje em dia, é essencial buscar clareza nos propósitos e nos valores. Portanto, é preciso aceitar a mudança do Mundo VUCA ao Mundo BANI, o que significa ter de aceitar a fragilidade. Caso contrário, iremos relutar até que outra mudança ocorra.

2º. Da incerteza para a ansiedade: Evoluímos de um para o outro, Mundo VUCA e Mundo BANI, e isso significa que nossas incertezas se transformaram em ansiedade. Quantos autores, médicos e filósofos já não alertaram sobre o aumento da ansiedade no planeta? Não é à toa que a saúde mental é um dos principais problemas a serem enfrentados. Além disso, hoje em dia fala-se muito sobre inteligência emocional e a sabedoria de estar no momento presente. Essas são algumas das qualidades mais valorizadas pelas pessoas e, consequentemente, pelo mercado também. Antigamente, era comum confundir agilidade com rapidez. Porém, para ser ágil é preciso ter foco, disciplina e concentração. E, para isso, precisamos de mais reflexão e introspecção. Ou seja, desacelerar.

3º. Da complexidade para a vida não-linear: A complexidade nos trouxe uma vida não-linear. A mudança entre Mundo VUCA e Mundo BANI fez com que seguir um plano não seja mais possível nos dias atuais. Em outras palavras, essa transformação resultou em uma realidade na qual precisamos ter mais cuidado com as nossas tomadas de decisão. Portanto, desenvolver uma visão mais sistêmica e ampla das situações é o que faz um profissional se diferenciar nesse aspecto. Principalmente, no ambiente executivo.

4º. Da ambiguidade para a incompreensão: A ambiguidade do Mundo VUCA nos leva à incompreensão no Mundo BANI. Tal transformação faz da nossa realidade um lugar no qual não conseguimos ter o entendimento completo sobre muitas coisas, situação agravada pela pandemia, que acelerou todas essas mudanças.

O motivo que me levou a escrever este artigo foi a leitura do livro Surfando no Mundo BANI, de autoria de Silvana Pretto Zanon, recém-publicado pela Editora Sulina. Nele, a autora, engenheira por formação, com especialização em Marketing e em Ciências Humanas opta por uma abordagem humanista do mundo contemporâneo e, como acentua Jair Marcatti na quarta capa, “costurando referências e citações dos pensadores mais importantes de que dispomos para entender o complexo mundo contemporâneo (com destaque para Zygmunt Bauman e Luc Ferry), a autora realiza um verdadeiro passeio, sutil, agradável, coreográfico, por temas cada vez mais necessários”.

Passando pelos capítulos denominados Mundo VUCA e Mundo Bani, Autoconhecimento, Generosidade, Empatia, Compaixão, Diálogo, Elegância e polidez, Criatividade e Sentido da vida, e abordando outros temas interessantes como relações de trabalho, inteligências múltiplas, inteligência emocional, inteligência espiritual e liderança, a autora que afirma “ter aprendido com seus professores das humanas que não devemos guardar nosso conhecimento, mas sim difundi-lo”, consegue atingir plenamente alguns dos objetivos a que se propõe, entre os quais, “difundir conhecimentos e ideias novas, colocando-as ao alcance das pessoas para reflexão”, “trazer o velho ideal da nobreza para ser o timoneiro do século XXI, nos guiando na busca por um propósito de vida” e, por fim, “fazer um passeio interdisciplinar abordando vários temas ligados ao humanismo no mundo contemporâneo, iniciando no autoconhecimento e terminando no sentido da vida”.

 

Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.


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