José Paulo Cavalcanti Filho, jurista e escritor, membro da Academia Brasileira de Letras
Edição Scriptum
Faz pouco, houve mais um terremoto (os da terra dizem terramoto) na região de Sines, em Portugal ‒ com 5.3 graus na Escala Richter, às 5h11, sentido sobretudo nas regiões de Setúbal e Lisboa. Sem vítimas ou maiores consequências, ainda bem. Voltemos ao passado.
Primeiro terremoto de grande magnitude, no país, ocorreu em 1531. Logo tido, pelo povo, como culpa do criptojudaísmo ‒ judeus que praticavam sua fé em segredo, para evitar perseguições religiosas. Naquele tempo tentava o país, junto à Santa Fé, implantar sua Inquisição ‒ então já existente, com muita presença, na vizinha Espanha. E, nesse mesmo ano, decaíra o prestígio do Escrivão da Puridade (equivalente ao que hoje seria um primeiro-ministro), D. Miguel da Silva, bispo cortesão contrário à Inquisição. Tudo contribuindo para uma perseguição cada vez mais forte aos cristãos-novos.
E assim foi até que assumiu Clemente VII, florentino conhecido como O mais infeliz dos papas (o mesmo que encomendou a Michelangelo, para a Capela Sistina, o magnífico Juízo Final). Foi ele quem, finalmente, autorizou a fundação do Santo Ofício em Portugal (já incluindo, no país, o nascente Brasil) com a bula Cum ad nihil magis, publicada em 22/10/1536. Logo nomeado, como inquisidor-mor, o frei Diogo da Silva, bispo ceuta e confessor do rei D. João III.
Depois veio o maior terremoto até hoje ocorrido naquelas paragens, em 1º de novembro de 1755, dia de Todos os Santos. Pouco depois das 9h30 da manhã. Violentíssimo e inusualmente longo. Em vez de um ou dois minutos como nos anteriores, esse tremor perdurou por mais de sete minutos, em alguns locais sendo sentido por duas horas e meia.
Fosse pouco, Lisboa também sofreu no mesmo dia com um maremoto que começou meia hora depois, nas costas marroquinas, com ondas de 30 metros de altura. Ao chegar a Lisboa, tendo ainda cerca de seis metros. Joaquim José Moreira de Mendonça (História universal dos terremotos) definiu a cena como um “espanto das águas”. E, em sequência, penou ainda com os muitos incêndios que consumiram tudo que restou do centro da capital por conta dos fogões acesos nas casas como de lustres, candelabros e archotes (madeiras com extremidades inflamáveis) nos interiores das igrejas.
Um fogo que durou, pelo menos, cinco dias. Alcançando, inclusive, a Livraria de Sua Majestade com os muitos manuscritos que tinha, originais antigos e pinturas de Corregio, Rubens e Ticiano; a recém construída Casa da Ópera; ou o Hospital Real de Todos os Santos, onde centenas de pacientes morreram queimados. Como se Deus não se importasse com a cidade, poupando a rua dos bordéis enquanto destruía dezenas de templos religiosos erguidos em seu louvor. Tudo numa cidade decididamente cristã, governada por D. José I de Portugal e Algarves, um monarca fidelíssimo à Divina Providência.
Depois desses merecem registros um, em 1969, com 8 graus na Escala Richter; e outro, em 2007, com 5,8. Mas ninguém pode garantir que pare por aí, num país oscilando sobre duas grandes placas tectônicas ainda muito ativas, a da “África” e a da “Eurásia” ‒ mais conhecida como “Fratura Açores-Gibraltar”.
Já no Brasil, e felizmente, (quase) não temos problemas nessa área. Aqui, em Pernambuco, só pequenos tremores; sentidos, sobretudo, no entorno do país de Caruaru, decorrentes de sismos, sem maior importância, ocorridos no Rio Grande do Norte. Ainda bem. Por aqui, único risco real de terremotos acontece apenas quando o ministro Alexandre de Moraes abre a boca.
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