Rubens Figueiredo, cientista político e colaborador do Espaço Democrático
Edição Scriptum
Quem foi maior nas Ciências Sociais? Karl Marx ou Max Weber? Pergunta dificílima de responder, estamos falando de dois gigantes. Marx, que pode ser considerado economista, sociólogo, filósofo, cientista político, deixou uma obra vasta, de grande qualidade e consequências práticas de grosso calibre. Weber também é uma referência na área, com análises originais e de primeiríssimo nível. As duas posturas são críticas. Uma levou a aventuras revolucionárias, a outra, à resignação.
Marx desenvolveu uma teoria bastante sofisticada sobre o funcionamento do sistema capitalista. Criou conceitos como a luta de classes, valor de uso e valor de troca, modo de produção, acumulação primitiva, mais-valia, exército industrial de reserva, a lei tendencial da queda da taxa de lucro, o lumpemproletariado, a noção do Estado como “o representante dos interesses da burguesia” e por aí vai.
Mais do que explicar o capitalismo, Marx queria sua superação. Uma questão moral impulsionava esse objetivo: o sistema seria profundamente injusto, pois baseado na propriedade privada (”um roubo”, segundo seu contemporâneo Proudhon) e na exploração do homem pelo homem. É preciso expropriar os meios de produção, que, socializados, passariam a ser controlados pela classe trabalhadora, que entende da coisa.
Para Marx, a igualdade é mais importante que a liberdade e a estrutura – o modo de produção – define em largos traços os desígnios humanos. Já a superestrutura, compreendida pelo Estado, religião, cultura e ideologia, cuja função é legitimar o modo de produção, perpetuando a exploração. É como se tudo isso funcionasse – das pinturas aos padres – para escamotear a supremacia burguesa sobre o proletariado, dando um tom de “naturalidade” ao sofrimento dos trabalhadores.
Se Marx pode ser considerado um estruturalista, Weber abraçou o culturalismo, conferindo um papel fundamental à religião como impulsionadora do espírito capitalista. Se no marxismo a estrutura condiciona as relações sociais, a visão weberiana coloca a ideia da junção dos comportamentos individuais como elemento básico da construção da sociedade. Pode ser considerado uma espécie de Adam Smith da sociologia. Seu livro A ética protestante e o espírito do capitalismo é uma reflexão brilhante nesse sentido.
A busca do lucro, a propensão ao trabalho e a ideia de que o sucesso material poderia ser o sinal da salvação seriam fatores altamente favoráveis à adoção de práticas racionais que estimulariam a acumulação do capital. O marxismo enxerga o capitalismo como conspiração. Weber o considera consequência da inspiração dos sujeitos acionada por fundamentos religiosos. A liberdade é mais importante que a igualdade.
Weber também se notabilizou pela criação da metodologia dos tipos ideais. Sua tipificação das formas de liderança se insere entre as mais ensinadas da história: tradicional, carismática e a legal-racional. Entre os líderes carismáticos, enumerou Jesus Cristo e Napoleão Bonaparte. Hoje, os líderes carismáticos (de direita ou de esquerda) associam seu carisma à potência contemporânea da estrutura legal-racional, criando governos poderosíssimos e, muitas vezes, teratológicos.
A distinção entre a ética da vocação (convicção), na qual são ressaltados os propósitos, e a ética da responsabilidade, que se concentra na consequência das ações, é uma das reflexões clássicas da história do pensamento sociológico. Na obra de Marx, o ideal, no caso, a implementação do socialismo, motiva a ideia. Em Weber, a ideia está a serviço do ideal, no caso, a busca da explicação dos processos. Dois gênios, cada um ao seu estilo.
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