
Dispositivo era uma roda circular com um bocal de cerca de 50 centímetros que ficava voltado para a rua
Edição Scriptum com Estação do Autor e DW
Em um passado não muito distante, a alternativa ao abandono dos bebês rejeitados era deixá-los nas chamadas “rodas dos expostos”. Esse formato, atrelado às Santas Casas de Misericórdia, teve origem em Roma, na Idade Média, e só deixou de operar na São Paulo do século 20.
Reportagem de Edison Veiga para o DW conta como funcionava o sistema de entrega anônima de crianças que começou em mosteiros, no ano de 1825, e foi extinto no Brasil em 1950. Ainda hoje, sistemas semelhantes funcionam nos EUA e em países da Europa e Ásia.
A historiadora Maria Luiza Marcílio explica no livro História Social da Criança Abandonada que o Brasil foi o último a acabar com a roda dos enjeitados. O recurso, que funcionou na capital paulista ao longo de 125 anos, acolheu 4.580 bebês abandonados. O dispositivo era uma roda circular com um bocal de cerca de 50 centímetros que ficava voltado para a rua. A pessoa deixava ali o bebê, girava uma manivela que fechava a frente e liberava o acesso do lado interno.
Segundo levantamento da Maria Luíza, naquele início de século dezenove, 15,9% de todos os bebês nascidos livres em São Paulo eram abandonados pelas ruas e córregos. A grande maioria não sobrevivia. O modelo era já praticado em Salvador, que inaugurou a primeira roda da colônia, em 1726, no Rio de Janeiro, desde 1738, e em Recife, em 1789. Depois da instalada em São Paulo, outras dez começaram a funcionar no território brasileiro. A roda dos expostos chegou ao País por conta da colonização portuguesa. Em Lisboa, a Santa Casa de Misericórdia adotou o sistema em 1498.
Atualmente, no Brasil há mecanismos jurídicos e legais para quem deseja encaminhar um recém-nascido para a adoção. As regras constam de um documento do Conselho Nacional de Justiça, denominado Manual Sobre Entrega Voluntária.
Versões modernas desse dispositivo, contudo, têm surgido em muitos países. O advogado Ariel de Castro Alves, membro da Comissão de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente do Conselho Federal da OAB, afirma que novas rodas podem ser encontradas em países como a Alemanha, Bélgica, Coreia do Sul, Estados Unidos e Japão. Ele observa que, com ou sem roda dos expostos, a questão da inclusão social plena das crianças brasileiras segue sendo um problema. “Na prática, a maioria das crianças e adolescentes do País estão expostos à miséria, fome, negligências, abandonos e violências, na maioria, por situações praticadas por seus próprios pais, mães e responsáveis legais, ou pelos poderes públicos, que se omitem nas políticas públicas.”