Redação Scriptum
Com 35 anos de atraso, o Congresso Nacional tem a oportunidade de dar ao País uma legislação moderna de licença paternidade, instrumento criado pela Constituição de 1988, mas que ainda hoje é concedido com base em um Ato das Disposições Constitucionais Transitórias: período de cinco dias, até que uma nova lei discipline o benefício. Em dezembro do ano passado, ao julgar uma Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão apresentada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS), o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu que há omissão do Poder Legislativo na regulamentação do benefício, que pelo artigo 7 da Constituição é um direito dos trabalhadores urbanos e rurais no Brasil. E deu o prazo de 18 meses para que o Congresso regulamente a lei.
“Há uma janela de oportunidade para o debate da licença paternidade e até a eventual aprovação da regulamentação de um modelo mais atualizado, com um prazo mais generoso, para que os pais possam estar com os seus filhos no nascimento ou adoção de uma criança”, diz Rodolfo Canônico, diretor-executivo e cofundador da Family Talks, organização da sociedade civil que integra o Grupo de Trabalho criado na Câmara dos Deputados – formado por parlamentares, ongs, representantes do empresariado e de órgãos públicos – para debater o tema e elaborar uma proposta para tramitação legislativa.
Entrevistado pelo programa Diálogos no Espaço Democrático – produzido pela fundação de estudos e pesquisas do PSD e disponível em seu canal do Youtube – Canônico, que é especialista em políticas públicas para a família pela Universidade Internacional da Catalunha, é taxativo sobre o tema: “A sociedade tem uma demanda real”.
Na entrevista concedida aos jornalistas Sérgio Rondino – âncora do programa Diálogos no Espaço Democrático e Eduardo Mattos e ao cientista político Rogério Schmitt, Canônico destacou que os benefícios da ampliação da licença paternidade são muito superiores aos custos para a sociedade – argumento que sempre permeia as discussões. “Na perspectiva da criança, nessa primeiríssima infância, dar mais tempo para a convivência com o pai contribui muito para o desenvolvimento, já há muitos estudos sobre isto”, aponta ele. “E também há muitas evidências sobre o desenvolvimento do próprio pai”.
Um dos modelos em discussão neste grupo de trabalho é o conhecido como licença parental, adotado em vários países europeus – na América Latina, apenas o Chile tem experiência com este formato – que permite ao casal dividir o período legal de licença. Canônico considera que há vantagens interessantes no modelo. “Permite maior autonomia da família na decisão de como usufruirá a licença, ao contrário do que acontece atualmente”, diz ele.
Canônico destaca um outro ponto positivo, a exemplo do que acontece na Suécia: “A paternidade parental foi introduzida a partir de uma certa perspectiva de gênero, partindo da compreensão de que o principal motivador da diferença salarial entre homens e mulheres no mercado de trabalho é o exercício da maternidade, a ideia de que as mulheres têm maior envolvimento na tarefa de cuidar do que os homens e isto cria uma sobrecarga que gera um efeito no mercado de trabalho”. Segundo ele, o objetivo do legislador sueco foi promover maior participação do homem na vida familiar, para reduzir a desigualdade. “E este efeito aconteceu”, diz ele. “Este indicador, da tarefa de cuidar, existe no Brasil, é medido pelo IBGE, e nós sabemos que aqui as mulheres dedicam o dobro do tempo do homem”.