Redação Scriptum
A reviravolta que o governo dos Estados Unidos promete empreender nas relações comerciais com seus parceiros pode ser um grave problema para o Brasil, mas há questões mais graves com as quais o País deve se preocupar olhando para a conjuntura doméstica. Em palestra nesta terça-feira (28), na reunião semanal do Espaço Democrático – a fundação para estudos e formação política do PSD –, o economista Felipe Salto, ex-diretor-executivo da IFI (Instituição Fiscal Independente) do Senado, ex-secretário de Fazenda do Estado de São Paulo e atualmente economista-chefe da Warren Investimentos, apontou alguns dos gargalos que o Brasil terá de enfrentar.
Um dos principais é discutir o crescimento econômico para o País neste novo cenário. “Temos que nos mobilizar em torno de um grande tema, e este tema é o do desenvolvimento econômico, do crescimento”, disse ele. “Parece que virou pecado discutir isto, só podemos debater se a inflação vai ficar 0,5 ponto percentual acima do centro da meta, essas minúcias”. Para Salto, o baixo crescimento brasileiro é sistêmico e está intimamente relacionado ao desajuste fiscal crônico do País – desde 2014, apontou ele, a dívida pública vem crescendo. “Precisamos de um novo plano fiscal”, disse.
O economista Roberto Macedo, que levantou nessa reunião o tema do baixo crescimento, defendeu que o Brasil aumente o percentual de investimentos públicos, essencial para que possa crescer. “Não temos fôlego para taxas maiores que os 3% deste ano sem investimentos”, disse, lembrando que na década de 1970 o governo chegou a investir 10% do PIB em infraestrutura e hoje está em apenas 2%. “O pior é que o efeito da gastança da PEC da Transição, lá de 2022, 2023, se esgotou”, apontou, fazendo o alerta para o que considera um grande risco: “Lula não tem responsabilidade fiscal, é populista e só pensa em se eleger, e o grande risco é inventar outra PEC da transição, pensando na eleição do ano que vem; além disto temos o Congresso extrativista”. Com crescimento econômico, defendeu ele, tudo melhora: cresce a arrecadação, o emprego, a renda, a demanda. “Seria uma boa ideia criar uma meta de crescimento, assim como temos meta de inflação; poderíamos começar com 4% ao ano e ir subindo”, disse.
Salto concordou com Macedo: “Precisamos que o setor público invista para valer, que tenha uma burocracia capaz de fazer projetos relevantes, que tenha sistema de monitoramento e avaliação desses projetos”. E acrescentou um ponto importante à discussão: o Plano Plurianual (PPA), ferramenta de planejamento orçamentário que estabelece diretrizes, objetivos e metas da administração pública federal. “Ninguém debate o PPA, os parlamentares estão preocupados com os R$ 50 bilhões de emendas”, disse Salto. “Precisamos fazer uma reforma orçamentária que vincule o orçamento ao PPA e então as emendas não poderão mais ser soltas como hoje, serão vinculadas a projetos estruturantes como uma grande ferrovia em construção, não uma academia ao ar livre no meio do nada”.
Outro ponto de atenção destacado por Salto é como a política e a pré-campanha eleitoral vão impactar os desafios que o governo terá na área fiscal. “O Congresso volta com duas lideranças novas que se alinharão ao governo, mas reforçarão a tese de um Congresso que continuará tendo maior participação no orçamento público”, acredita. “Em abril de 2026 o quadro eleitoral estará mais bem definido, mas até lá a gestão será medíocre, não dá para fazer as grandes transformações que deveriam ter sido feitas no primeiro ano de governo, quando optou-se por uma expansão irresponsável, com o aumento do teto de gastos em R$ 145 bilhões, uma licença para gastar”. Para ele, “os problemas estruturais continuam os mesmos e as instituições do Estado que têm a ver com o desenvolvimento e o financiamento do desenvolvimento econômico, como o BNDES, voltam a namorar com as estratégias preocupantes que foram praticadas no governo Dilma (Rousseff) e no segundo governo de Lula”.
Falando especificamente sobre a nova ordem da política comercial que os Estados Unidos tentarão impor aos seus parceiros, Salto enfatizou que falta ao Brasil uma formulação de política econômica. “O governo está reativo ao que acontece; é um debate raso e estamos à mercê de uma política extremamente incerta que será implementada pelo Trump”.
Participaram da palestra de Felipe Salto, com comentários e perguntas, o superintendente da fundação, João Francisco Aprá, o coordenador nacional de Relações Institucionais do Espaço Democrático, Vilmar Rocha, os economistas Luiz Alberto Machado e Roberto Macedo, o advogado Roberto Ordine, o sociólogo Tulio Kahn, os cientistas políticos Rubens Figueiredo e Rogério Schmitt, os gestores públicos Januario Montone e Mário Pardini, o médico sanitarista e ambientalista Eduardo Jorge, a secretária do PSD Mulher nacional, Ivani Boscolo, e os jornalistas Eduardo Mattos e Sérgio Rondino.