Redação Scriptum
A igualdade é uma questão central para a social-democracia, e é por essa razão que o Brasil não teve ainda uma autêntica experiência social-democrata. “Nós não gostamos de igualdade, está no nosso comportamento, na nossa cultura”, diz o cientista político Sérgio Fausto. Em palestra na reunião semanal do Espaço Democrático – a fundação para estudos e formação política do PSD – nesta segunda-feira (2/5), ele destacou que o brasileiro até defende a ideia de igualdade de cidadãos que pertencem a uma mesma comunidade política, mas não pratica. “Estamos o tempo todo procurando nos diferenciar com regimes especiais e canais especiais de acesso: o amiguismo, o familismo, o clientelismo e o patrimonialismo estão extraordinariamente entranhados na cultura brasileira, na ponta oposta da igualdade, que é o valor essencial da social-democracia”.
Diretor-geral do Instituto Fernando Henrique Cardoso, Sérgio Fausto fez uma palestra sobre as perspectivas da social-democracia no mundo. Ele comparou o populismo de esquerda, representado hoje pela maioria dos partidos latino-americanos deste matiz ideológico, à ideia de que de alguma forma se norteie aos princípios social-democratas. “O populismo de esquerda é personalista e distributivista, é subordinado a uma grande liderança, como ocorre com o chavismo, e confisca renda e propriedade dos ricos para distribuir aos pobres”, afirmou. A social-democracia, apontou, é institucional, procurou canalizar o conflito da distribuição para a arena política e está menos ligada à ideia de distributivismo fácil, que segundo ele destrói riqueza e capacidades, e mais à ideia de desenvolver competência por meio da educação e saúde públicas, redes de proteção para momentos de fragilidade como desemprego e velhice. “A grande ruptura da social-democracia foi esta: é economia de mercado com um Estado que tem papel forte para corrigir desigualdades e fazer regulação”.
Fenômeno histórico
Fausto fez um retrospecto histórico da social-democracia, que se desenvolveu no período anterior à Segunda Guerra e se consolidou depois dela, na forma de Estados de bem-estar social. “É a expressão de um pacto social que significou a incorporação da classe operária ligada à segunda revolução industrial, da grande expansão do setor fabril e da indústria, que tinha práticas e horizontes revolucionários”, afirmou. “Por meio de suas instituições representativas, essa classe operária estabeleceu um pacto com a burguesia, abrindo mão de práticas e da perspectiva revolucionária em troca da extensão de direitos”. Ele destacou que o nascimento da social-democracia se deu em sociedades estruturadas em classes, de economias muito pouco conectadas, distante da globalização que temos hoje. A consolidação, porém, foi reforçada por dois fatores: a solidariedade nacional com aqueles que foram à guerra e o surgimento da União Soviética, que levou às concessões às classes mais baixas.

Reunião semanal de colaboradores do Espaço Democrático
As mudanças ao longo da segunda metade do século 20, porém, colocaram a social-democracia no cenário de xeque que vemos hoje. “A estrutura de classes é muito fragmentada, as economias muito integradas comercial e financeiramente e a imensa classe média mundial passou a ter formas variadas de trabalho, que não cabem mais no perfil de uma sociedade de classes industrial, com sindicatos e partidos”, analisou. “Esse sistema está em xeque, mas resiste; na Europa, por exemplo, mesmo os partidos de direita não negam o estado de bem-estar social”.
O caso brasileiro, de acordo com Fausto, é muito distante da origem histórica e geográfica, apesar das iniciativas que ocorreram depois da promulgação da Constituição de 1988, que incorporou elementos da social-democracia. Ele lembrou que o presidente Fernando Henrique Cardoso costuma questionar o nome dado ao PSDB – Partido da Social Democracia Brasileira. “Ele sempre teve problema com esse nome: perguntava como podemos ter um partido social-democrata que não tem operários”.
Participaram da reunião semanal do Espaço Democrático, coordenada pelo jornalista Sérgio Rondino, o superintendente da fundação, João Francisco Aprá, os economistas Luiz Alberto Machado e Roberto Macedo, os cientistas políticos Rubens Figueiredo e Rogério Schmitt, o sociólogo Tulio Kahn, os gestores públicos Mário Pardini e Januario Montone, o professor pós-doc da USP José Luiz Portella, o médico sanitarista e ambientalista Eduardo Jorge, o advogado Roberto Ordine, a secretária do PSD Mulher nacional, Ivani Boscolo, o coordenador nacional de Relações Institucionais da fundação, Vilmar Rocha, o ex-presidente da Sociedade Rural Brasileira Cesário Ramalho e o jornalista Eduardo Mattos.