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Tendências criminais e políticas de segurança no Rio de Janeiro
Para o sociólogo Tulio Kahn, a solução para o problema no Estado não vai avançar até se forme uma consciência nacional sobre a necessidade de reformar as polícias
Tulio Kahn, sociólogo e colaborador do Espaço Democrático Edição Scriptum A morte dos médicos paulistas num quiosque da praia, em setembro, e os 35 ônibus incendiados nesta semana, em represália à morte de um miliciano, reascendem a preocupação dos brasileiros sobre a segurança no Rio de Janeiro e no País. O Rio, como se sabe, tem características físicas, sociais, culturais e organizacionais que o tornam sui generis no cenário brasileiro, quando o tema é segurança: a geografia dos morros, a proximidade física entre ricos e pobres, a existência de milícias, as diversas facções criminosas, o domínio territorial sobre as comunidades, a glamourização da “vida bandida” e a ética da esperteza, a inexistência de uma secretaria estadual de segurança, a corrupção no sistema de justiça criminal, a política de guerra ao tráfico, as balas perdidas, a operação GLO das forças armadas, a elevada taxa de letalidade policial, a leniência da população com relação às pequenas contravenções, a crise fiscal do Estado, decorrente da queda da atividade econômica e da arrecadação, as baixas taxas de esclarecimento de crimes, a alternância entre lideranças corruptas no executivo e no legislativo etc. Todos estes aspectos já foram bastante explorados nos estudos criminológicos, matérias jornalísticas e na ficção, que parece fascinada com o caso do Rio, purgatório da beleza e do caos. Em conjunto, estes traços explicam em parte as especificidades criminais do Rio, enquanto outra parte tem relação com o marco legal nacional e com as macro-tendências demográficas, sociais e econômicas que afetam todos os Estados: falamos aqui das regras de flexibilização ou restrição de armas de fogo, da organização das polícias, do Código Penal e de Processo Penal, do envelhecimento da população, das taxas de desemprego e desigualdade e outras variáveis. O perfil criminal de cada local é sempre resultante destas especificidades e macro-tendências e estruturas regionais e nacional. Embora estes casos escabrosos mereçam grande atenção midiática – e merecem pela gravidade dos eventos – uma olhada nas estatísticas criminais oficiais do Rio de Janeiro permitem fazer uma avaliação mais ponderada das tendências criminais no Estado. O Instituto de Segurança Pública divulga dados desde os anos 1990 sobre diversos indicadores criminais. Com relação aos crimes contra “a pessoa” (tecnicamente latrocínio é um crime contra o patrimônio), as tendências históricas são mistas. Homicídios dolosos e latrocínios estão em queda quando comparamos com os períodos anteriores, chamando a atenção a redução de 42,8% dos homicídios quando comparamos com o período 1993-1997. Em contraste, as tentativas de homicídio cresceram expressivamente, sugerindo que os atentados contra a vida crescem, mas estão se tornando menos letais, talvez como resultado da substituição dos meios. As lesões corporais dolosas, por sua vez, tiveram seu auge no quinquênio 2008-2012 e estão atualmente nos mesmos patamares do quinquênio 1998-2002. As tendências dos crimes patrimoniais são igualmente mistas, dependendo da modalidade criminal. Quase todas as modalidades de roubo apresentaram crescimento e estão no seu ápice, exceções feitas à relativa estabilidade do roubo a comércio e da queda do roubo a banco (-94,5%), que é tendência nacional e tem relação principalmente com a adoção de estratégias e mecanismos de proteção adotadas pelo setor privado. O total de furtos vem aumentando, mas observamos também quedas em certas modalidades, como o furto de veículos, que cai 23,3% quando comparamos o quinquênio atual com o primeiro (1993-1997). A primeira observação, portanto, é que o crescimento da criminalidade não é generalizado no Rio, e no caso dos crimes mais graves, como homicídios e latrocínios, a tendência histórica é de melhora. Muitos dos crimes em queda no Rio – homicídios, latrocínios, roubo a banco, furto de veículo etc. – são tendências nacionais, pelo menos quando observamos os últimos dez anos, para os quais existem dados comparáveis. Apesar de alguns esforços do governo carioca na segurança, como as UPPs, a criação do ISP e das AISPS, a criação do Sistema Integrado de Metas (SIM), os investimentos feitos durante os jogos Pan-Americanos, em 2007, as Olimpíadas de 2016 e Copa do Mundo de 2014, do crescimento relativo das despesas com segurança, da Operação Segurança Presente etc. – são poucos os estudos robustos que conseguem vincular estas iniciativas a algum impacto na criminalidade. Diga-se de passagem, o mesmo é verdade para todos os Estados – algumas das poucas exceções podem ser encontradas na revisão de Kopittke, (Manual de Segurança Pública Baseada em Evidências, 2023). Se os problemas do Rio de Janeiro são a resultante de fatores locais e nacionais, a solução para a segurança no Estado deve vir também destas duas dimensões. Não vou arriscar um cardápio de soluções, já que o Rio de Janeiro deve ter a maior proporção de criminólogos por metro quadrado do Brasil e quiçá do mundo. Mas apenas lembrando o óbvio, existem os fatores que não podem ser modificados pelas políticas públicas ou apenas em longo prazo – como a geografia, cultura ou a demografia. E outros são manipuláveis em curtíssimo prazo, como a recriação da Secretaria Estadual de Segurança, origem dos poucos projetos inovadores da área no Rio. Se a integração entre as polícias no Brasil já é ruim, a inexistência de uma secretaria hierarquicamente acima das polícias estaduais, forçando esta integração, acirra a autonomização e o corporativismo em cada instituição policial. Mas é preciso também alterar as regras do jogo que formatam a estrutura de segurança pública de todo o País, que padecem, ainda que talvez em menor grau dependendo do Estado, dos mesmos problemas que a polícia carioca: excesso de violência, corrupção e ineficiência. A questão da segurança pública não vai avançar até se forme uma consciência nacional sobre a necessidade de reformar as polícias, substituindo o ineficiente modelo vigente de 4/4 de polícia (PM oficiais X PM praças X PC Delegados X PC outras carreiras), por um modelo de polícia unificada. Bibliografia Cerqueira, Daniel Ricardo de Castro, and Waldir Jesus Araújo Lobão. "Criminalidade: social versus polícia." (2003). da Silva Neto, Antônio Ludogero, and Rodrigo de Lima Nunes. "Traçado Urbano e Criminalidade Carioca: Aspectos Históricos da Favelização do Rio De Janeiro." Espaço Aberto 2.1 (2012): 39-54. Hartung, Gabriel Chequer. Ensaios em demografia e criminalidade. Diss. 2009. Mello, Ana Carolina Alves de. "A evolução dos gastos orçamentários em segurança pública e dos indicadores de criminalidade nos estados do Rio de Janeiro e São Paulo (1998-2017)." (2019). Nicolay, Rodolfo, Cesar Junqueira, and José Claudio Ferreira da Silva. "Impactos das políticas de segurança sobre os indicadores de criminalidade no Rio de Janeiro." Nexos Econômicos 11.2 (2017): 113-137. Pio, João Gabriel, Ana Carolina Santos Brito, and Alexandre Lopes Gomes. "CRIMINALIDADE NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO (RJ) As influências das políticas públicas e as relações a curto e longo prazos." Revista Brasileira de Ciências Sociais 36 (2021). Ventura, Pedro Corrêa. "Criminalidade e fechamento de empresas: caso do Estado do Rio de Janeiro de 2010 a 2018." (2022). Zanetic, André. "O impacto das ações de segurança sobre a criminalidade no Rio de Janeiro durante os Jogos Pan-americanos de 2007." (2011). Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.
Card link Another linkInteligência Artificial: caminhos e desafios
Para Paulo Cesar Bernardes dos Reis, especialista em comunicação e marketing,, a luta da humanidade para garantir mais benefícios que prejuízos nos tempos da IA é urgente e imperativa
Paulo Cesar Bernardes dos Reis, publicitário e especialista em comunicação e marketing Edição Scriptum A evolução é uma busca natural do ser humano desde os tempos em que morávamos em cavernas. A cada página virada em direção ao futuro, a humanidade descobriu o fogo, o vapor e a luz elétrica até chegarmos na eletrônica. Aprendemos a curar uma quantidade enorme de doenças e a viabilizar o aumento de produtividade, que transformou sociedades e construiu o mundo que temos hoje. Mas a cada etapa dessas, na sombra dos benefícios, vieram também muitos problemas. De todos os tipos ou gravidades. A luz elétrica, por exemplo. Depois de sua invenção, começamos a perceber que a humanidade passou a ter pior qualidade de sono. A exposição exagerada à luz artificial, principalmente à noite, pode suprimir a liberação da melatonina, o hormônio que regula o sono, e assim gerar diversos problemas de saúde. A invenção do automóvel, um dos maiores passos para o desenvolvimento da humanidade, trouxe de carona a poluição sonora e ambiental, o tráfego, responsável por significativo aumento dos níveis de estresse... Assim como também geraram prós e contras a invenção do avião, do trem etc... Inteligência Artificial Mesmo assim, o mundo não consegue nem pode ficar parado no tempo, e evolui. Hoje, estamos diante de mais uma etapa dessa evolução: a Inteligência Artificial. Na verdade, desde que a primeira máquina conseguiu “automaticamente” mudar seu comportamento em função de algum fator externo, ela de alguma forma existe. Seja o ar-condicionado que muda a temperatura em função da temperatura ambiente ou o limpador de para-brisas que é acionado automaticamente na chuva. Mas, agora, a grande questão é que a evolução não para. Aprendeu a aprender e tem se tornado mais criativa a cada dia. Isso pode gerar soluções para problemas que temos há milênios, como também vai nos apresentar possibilidades de futuro com as quais nunca pensamos. Talvez agora encontremos finalmente a cura definitiva do câncer, exploraremos o espaço mais distante, teremos uma capacidade de produção e eficiência agrícola inimaginável há 15 anos. Mas como toda evolução, sob a sua sombra estão surgindo diversos problemas, inevitáveis e com os quais vamos ter que aprender a lidar: qualificação de mão de obra para era de novas funções, manipulação da informação, direitos autorais, invasão de privacidade e falta de segurança com os dados... e segue uma lista razoável. Mesmo para olhos e ouvidos mais treinados, a tecnologia chegou a um ponto onde fica extremamente difícil distinguir o fake da realidade. Quem ganha, quem perde Evidentemente que toda a humanidade poderá desfrutar dessas conquistas. Também lembrando que quem tem maior poder aquisitivo, terá mais tecnologia à sua disposição e quem tem menos, terá menos. Um dos grandes desafios, inclusive, é equilibrar melhor essa desigualdade. Para quem se propõe a defender alguma causa – a democracia, por exemplo – a questão da manipulação da informação se torna um adversário poderoso. Para um partido político, em um País com grandes eleições a cada dois anos, este assunto se torna centro das atenções e preocupações. Em tempos eleitorais, uma parte da classe política se promove expondo os defeitos e fragilidades de seus adversários, e muitas vezes esses defeitos são “criados” e difundidos com a tecnologia disponível, criando um enorme boato. Uma fake news. Em sua maioria, depois de algum tempo, a “vítima” consegue desmentir ou responder. Bem, esses tempos mudaram e agora, além da velocidade em gerar informações, e a tecnologia transformou esses boatos em “fatos em potencial”. Difíceis de desmentir. Uma “boa fake news” não é mais uma arma com uma mira precisa. Agora é uma bomba que pode destruir e matar tudo à sua volta. Ninguém está seguro diante disso. Qualquer equipe de marketing sensata e responsável vai preferir “matar” a fake news do que usá-la. A massa A comunicação de massa, hoje, é consumida e produzida pela própria massa. Gerar conteúdo ou dar informações aos milhares não é mais privilégio de algum grupo de comunicação. Qualquer habitante desse planeta pode fazer... e faz. É como se o homem das cavernas pudesse se informar em um GPS sobre a localização do tigre de dentes de sabre para se proteger melhor, ou pudesse ensinar para todas as cavernas receitas de javali na brasa, porque todos agora conhecem o fogo. Mas imagine, com a invenção da pólvora, na imaginária internet na época, se qualquer pessoa encontrasse facilmente como fabricar pólvora ou como construir uma arma mais poderosa que a espada e a lança. E isso, manipulado tanto pela população pobre, escrava e sofrida, como pelo impiedoso senhor feudal. Ambos completamente despreparados para lidar com um poder dessa magnitude. Fosse o povo oprimido, ignorante, cansado e faminto, subjugado e raivoso por sua condição, fosse o nobre impiedoso, ganancioso, acostumado a tratar as pessoas de fora de seu castelo como inimigos ou animais... Como teria sido ? Cada um deles com um rifle AK-47 nas mãos, sem saber direito o que fazer com ele. Não é nem possível avaliar como teria sido a Idade Média ou uma Guerra Mundial. A nova pólvora A Inteligência Artificial é a pólvora do século 21. Capaz de impulsionar, mudar costumes e abrir infinitos horizontes, mas também capaz de destruir. Claro, dependendo do uso que se faça. E é fundamental entender que este uso é humano!!! Nós realmente já entendemos o que isso significa? Estamos mesmo preparados pra usar essa “pólvora”? Usuários da modernidade A começar pela avaliação da saúde mental, o quadro é preocupante. Estima-se que 30% dos adultos em todo o mundo atendam aos critérios de diagnósticos para algum tipo de transtorno mental. E nós, brasileiros, estamos no momento com o título de “País Mais Ansioso Do Mundo” Um trabalho publicado há algum tempo pela revista Saúde Pública mostra que em nosso País 30% dos adolescentes apresentam os transtornos emocionais mais comuns como ansiedade, depressão ou queixas somáticas inespecíficas. Se vamos dar uma olhada no preparo acadêmico, no Brasil, por exemplo, o número de analfabetos, dependendo do órgão pesquisador, vai de 9,6 a 16 milhões. Neste caso prefiro o mais recente, do IBGE, 9,6 milhões. Mas, o mesmo IBGE também nos mostra que somos quase 30% de analfabetos funcionais, ou seja: pessoas incapazes de fazer interpretação de texto e realizar algumas operações matemáticas básicas, mesmo sabendo ler e escrever. E, pior: o IBGE também nos alerta que encontramos “analfabetos funcionais” nas universidades. Um estudo recente da IBM e da Morning Consult revela que, no Brasil, 70% dos jovens acreditam que as novas tecnologias vão impactar suas vidas, mas apenas 41% deles se sentem preparados para isso. Veja bem: os jovens, que segundo os mais velhos já vem com um “chip” a mais que a geração anterior. Isso sem falar sobre o despreparo na área de segurança de dados. Em fevereiro de 2021, a BBC apresentou uma extensa reportagem sobre os vazamentos de 223 milhões de CPFs, de pessoas vivas ou falecidas, e quase 103 milhões de registros de celulares no Brasil. E essa realidade não mudou muito de lá pra cá. Bem, este é um resumo simplificado do ambiente digital e de seus usuários. Não é sensato acreditar que este contingente enorme de pessoas vai, do dia para a noite, se preparar para o mundo da inteligência artificial. Mas este resumo não tem a intenção de diminuir nossas possibilidades ou capacidades humanas nem de nos desestimular na implantação dessas modernidades tecnológicas, mas é para lembrar que ignorar “a vida como ela é” pode custar muito caro. Atitudes imediatas A prevenção ou defesa contra o mau uso da tecnologia, não pode cair simplesmente em uma guerra de versões ou confronto de opiniões. Ela vai precisar ser bem mais sólida e consistente e poderia ser resumida em três pilares. Pilar 1 O primeiro pilar é no âmbito jurídico. O desenvolvimento de leis e de formas factíveis de sua aplicação. Mesmo ainda controversa, essa legislação é o primeiro passo importante na direção de pelo menos algum tipo de controle sobre o mau uso. Singapura implantou a Lei de Proteção contra Falsidades e Manipulação Online (POFMA), que permite ao governo emitir ordens de correção ou retirada de conteúdo considerado falso ou enganoso. A Alemanha aprovou a Lei de Execução de Redes (NetzDG), que exige que as plataformas de redes sociais removam conteúdos ilegais, incluindo discursos de ódio e notícias falsas dentro de prazos especificados. A França promulgou a lei “Luta Contra a Manipulação On-line”, também conhecida como “Lei das Notícias Falsas”, que permite a um juiz ordenar a remoção de notícias falsas durante o período de campanha eleitoral. No Brasil, o TSE também tomou medidas para combater as fake news nas últimas eleições. Países como Malásia, Índia e Japão já estão reestruturando suas leis e ferramentas para esse combate. Mas volto a dizer que o impacto dessas leis ainda é muito controverso, uma vez que elas convivem com a fronteira da liberdade de expressão, um bem fundamental de qualquer democracia. Mas, de um modo geral, a maioria concorda que mesmo imperfeitas no início, elas são fundamentais para um “amadurecimento legal” em relação a manipulação digital. Pilar 2 Outro pilar dessa luta é preparar os indivíduos para lidar com esse novo mundo digital. A chamada “alfabetização midiática”. Como vimos anteriormente, a população mundial ainda não está preparada para esses novos tempos, mas precisa estar. E rápido. Para isso, feliz ou infelizmente não existe outra palavra que defina o que fazer: ESTUDO. Cientes de todo esse contexto, grandes empresas tem colocado à disposição incontáveis cursos e dicas de como estar mais preparado para a nova era. São cursos que além de desenvolver as habilidades do uso dessas novas tecnologias, também ajudam a fazer com que uma pessoa comum aprenda a se defender melhor de fraudes, fake news etc. Não é uma tarefa simples nem rápida. Mas quanto mais negligenciarmos abraçar essa causa, mais prejuízos em todas as esferas da sociedade vamos contabilizar. É inexorável. Já existem inúmeros bons cursos, gratuitos e em português. Vale à pena procurar. Dois bons exemplos desses cursos são o da IBM – www.ptech.org ou o da Microsoft – IA Skils. Pilar 3 O terceiro pilar é a capacidade e as ferramentas para atestar alguma credibilidade. Aqui, vale lembrar que quando gostamos ou simpatizamos com alguém ou com alguma coisa, normalmente ignoramos os defeitos, mas quando não gostamos, a tendência é ignorar as virtudes, e de alguma forma acabamos construindo nossas próprias verdades a esse respeito. O ser humano normal infelizmente é assim. E levando-se em consideração que no caso de defesa de “verdades” ou reputações, a boa vontade de quem vai verificar essas informações faz toda a diferença, não complique. Espaços claros e acessíveis, onde as informações podem ser checadas e validadas. Mas é importante que esses locais (sites, rádios, jornais, redes sociais, porta-vozes etc...) sejam respeitados por todas as tendências. Amigas ou não. Não funciona como defesa contra fake news ter apenas essa credibilidade atrelada a grupos ou espaços “parceiros”. É como se você nomeasse sua própria mãe como a única pessoa isenta e confiável para defender a sua reputação. A credibilidade, evidentemente, é zero. Diversificar, investir e proteger esses pontos de credibilidade e confiança é o grande milagre. Para isso, a capacidade de relacionamento saudável e diálogo com todos os veículos de mídia, a boa convivência com representantes de outras tendências, assim como entidades ou organizações de reputação, torna-se mais do que importante: é básico. Outro ponto importante é colocar à disposição, em um ambiente confiável – esse sim pode ser próprio – suas informações de forma clara, transparente, simples e verificável. Conclusão Durante uma época de crises de credibilidade, despreparo, radicalismos e extremismos, é fundamental cuidar da existência desses locais seguros, onde as informações consigam se proteger do mau uso das fake news. Aprender como nos defender das fraudes, das falsas facilidades e principalmente da manipulação da informação, através de leis e conhecimento, vai exigir de cada cidadão, disciplina e paciência. Nossa luta para garantir mais benefícios que prejuízos nos tempos da Inteligência Artificial é urgente e imperativa. O constante preparo e conhecimento das novas tecnologias, para podermos conviver bem com elas e garantir seu uso responsável é o que vai definir, de verdade, nosso futuro como sociedade. A participação da atividade política será pautada pela atuação partidária, nas unidades da Federação, com o uso responsável da inteligência artificial e das novas tecnologias. Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.
Card link Another linkSem rebobinar a fita
Rubens Figueiredo escreve sobre “Missão: alegria em tempos difíceis” , documentário que ele considera um olhar sensível e profundo sobre a amizade de dois líderes gigantescos: Desmond Tutu e Dalai Lama
ARTIGO Rubens Figueiredo, cientista político e colaborador do Espaço Democrático Edição Scriptum Assistir filme ou série em casa. Eis algo que mudou muito ao longo do tempo. Na minha infância, a TV normal dava a seu jeito conta do recado. Mas a gente tinha dia e hora certa para ver aquilo que queríamos. Lembro que o magnífico Túnel do tempo, série na qual os cientistas americanos Doug Phillips e Tony Newman passeavam entre o passado e o futuro, era levado ao ar às terças-feiras, sempre às 15h. Para assistir ao próximo episódio era necessário conter a curiosidade e esperar sete dias. As séries eram muitas, quase todas vindas dos EUA. Tinham A feiticeira, Jeannie é um gênio (com Barbara Eden e Larry Hagman), Família do-re-mi (David Cassidy e Susan Dey), Kung Fu, Bonanza, O homem de seis milhões de dólares (Lee Majors), o genial e engraçadíssimo Agente 86 (Don Adams e Barbara Feldon), Jornada nas estrelas, Perdidos no espaço (com o insuperável Dr. Smith: “Nada tema, com Smith não há problema”) e por aí vai. Mas tudo com dia e hora marcada. Filmes? A TV informava na semana anterior as atrações da seguinte. A coisa melhorou um pouco com a chegada do videocassete. Passamos a ter a oportunidade de ir até a videolocadora e alugar os títulos de interesse. Hoje em dia, aquilo pareceria medieval. Normalmente, os interessados iam às lojas na sexta para alugar três filmes que seriam vistos no final de semana. Era mais barato. O difícil era que existiam poucas cópias dos filmes mais procurados – e era uma luta para conseguir o lançamento do mês (“lançamento” é modo de dizer, pois os grandes sucessos apareciam nas prateleiras semanas depois de explodirem nos cinemas...). As fitas deveriam ser rebobinadas e devolvidas para a mocinha do caixa. A entrada da Blockbuster, que foi a maior rede de locadoras do mundo, revolucionou o mercado. Primeiro, pela quantidade de filmes de sucesso disponíveis nas lojas enormes e estrategicamente situadas. Depois, a inovação suprema, uma espécie de Uber da época: as pessoas não precisavam mais entrar na loja para devolver os filmes alugados. Havia uma caixa de devolução dos vídeos, chamada, salvo engano, de quickdrop. O futuro chegara. Aquilo que era vida. Depois vieram os DVDs, que deram fim aos vídeos e às sessões de “rebobinações”. Mas o mecanismo de conseguir o DVD era idêntico: sair de casa, chovendo ou fazendo sol, ir à loja e depois devolvê-lo no mesmo local, ainda que no quickdrop. Outra saída era comprar DVDs para tê-los em casa. Algo caríssimo do ponto de vista custo-benefício, a menos que você fosse crítico de cinema e ganhasse dinheiro com isso. A TV a cabo melhorou muito a oferta de filmes, mas, se me lembro bem, no início as películas também tinham dia e hora marcados. A entrada do streaming representou uma revolução. A oferta de bons filmes e séries do mundo inteiro é generosíssima. O preço, quase ridículo. É claro que tem muita porcaria, mas faz parte do jogo. De que outra maneira teríamos como ver, por exemplo, séries coreanas que prendem a atenção com qualidade, como Uma advogada extraordinária, Pousando no amor e Designaded Survivor: Coreia? Ou a série israelense Fauda, já na quarta temporada? Ou a dramática minissérie colombiana Gol contra, a saga da seleção nacional em 1994, que levou ao assassinato do jovem quarto zagueiro André Escobar? Tudo isso a hora que você quiser, sem sair de casa ou rebobinar... Tudo isso para indicar um documentário: Missão: alegria em tempos difíceis (Netflix), um olhar sensível e profundo sobre a amizade de dois líderes gigantescos: Desmond Tutu e Dalai Lama. É uma – aliás, são duas – lições de vida. O sofrimento traz a dor, mas não necessariamente a tristeza. Tutu e o Dalai brincam e se provocam o tempo inteiro, ao mesmo tempo que emana de seus semblantes o profundo respeito que têm um pelo outro. No final, Tutu conta sua relação com o pai, num depoimento emocionante. Ver esse filme faz bem para a alma e, de alguma maneira, nos deixa mais humanos. Se estivesse na época da vídeolocadora, passaria meses indo à loja e rebobinando fita para ter oportunidade de vê-lo. Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.
Card link Another linkNobel de Economia contempla tema das mulheres no mercado de trabalho
Claudia Goldin analisou 200 anos de participação das mulheres no mercado de trabalho e mostrou que as diferenças entre os ganhos de homens e mulheres persistem, aponta Luiz Alberto Machado
Luiz Alberto Machado, economista e colaborador do Espaço Democrático Edição Scriptum Mostrando fina sintonia com as pautas contemporâneas, a Academia Real de Ciências da Suécia anunciou nesta segunda-feira (9 de outubro), o nome da economista norte-americana Claudia Goldin como ganhadora do Prêmio Nobel de Economia de 2023, “por ter avançado nossa compreensão dos resultados das mulheres no mercado de trabalho”. Terceira mulher a ser laureada com o Nobel de Economia (antes dela foram laureadas Elinor Ostrom em 2009 e Esther Duflo em 2019), Claudia Goldin tem 77 anos, nasceu em Nova York, é PhD pela Universidade de Chicago, professora da Harvard University e codiretora do Grupo de Estudos sobre Gêneros na Economia do National Bureau of Economic Research (NBER). O Nobel concedido a Claudia Goldin é resultante de suas pesquisas em que combina duas áreas: a história econômica e a economia do trabalho. Goldin analisou 200 anos de participação das mulheres no mercado de trabalho, mostrando que, apesar do crescimento econômico contínuo, os ganhos das mulheres não se equipararam aos dos homens e a diferença ainda persiste, mesmo que as mulheres tenham alcançado níveis mais altos de educação do que os homens. Segundo Randi Hjalmarsson, membro do comitê do prêmio, “ela não apenas explica a origem do hiato entre homens e mulheres, mas também como ele mudou ao longo do tempo e como varia de acordo com o estágio de desenvolvimento, não havendo, portanto, uma medida única”. Seu livro Career and Family: Women's Century-Long Journey toward Equality, lançado em 2021 pela Princeton University Press, abrange um período de 120 anos e mostra como as aspirações pessoais e profissionais das mulheres evoluíram ao longo do tempo. Baseada em um vasto levantamento de dados, a obra levanta pontos essenciais para o entendimento da desigualdade de gênero no mercado de trabalho. A evolução descrita por Goldin destaca que até o século XVIII as mulheres estavam inseridas no mercado de trabalho por conta da própria dinâmica social: elas trabalhavam dentro das propriedades da família em uma sociedade agrária. No entanto, no início do século XIX, com a transição para uma sociedade industrial - que levou ao trabalho fora de casa -, o percentual de mulheres casadas no mercado acusou uma acentuada redução. O cenário mudou novamente no começo do século XX, quando o setor de serviços ganhou força e chamou, mais uma vez, as mulheres ao mercado de trabalho. Também foi nesse período que o nível de educação das mulheres passou a aumentar, ultrapassando, inclusive, os níveis de escolaridade dos homens em países desenvolvidos. Além disso, Claudia Goldin demonstrou que o acesso à pílula anticoncepcional teve um importante papel para a aceleração dessa participação, já que ofereceu uma maior possibilidade para planejamento de vida e de carreira. Porém, mesmo com o método contraceptivo oferecendo a oportunidade de planejamento familiar, a maternidade ainda tem o poder de reforçar o gender gap. Isso porque as dinâmicas ainda presentes no mercado de trabalho tendem a dificultar a ascensão profissional das mães. Em seu livro, Goldin alerta para a dificuldade que casais com filhos têm para conciliar casa e trabalho, principalmente no caso de carreiras de alto nível, que requerem grandes investimentos iniciais. Logo, é fundamental que ocorra uma divisão de tarefas equânime entre homens e mulheres. Por ocasião do lançamento do livro, Goldin disse: “As aspirações e conquistas das mulheres universitárias mudaram muito ao longo do século passado, com o aumento da renda, a mecanização do lar e melhorias tecnológicas no controle da fertilidade e nos métodos de reprodução assistida. Mas a estrutura do trabalho e a persistência das normas sociais, por mais fracas que tenham se tornado, limitaram o sucesso das mulheres universitárias na carreira e na família”. Goldin também chamou atenção para questões mais subjetivas, que deixam a mulher com filhos em desvantagem. Por exemplo, um funcionário que pode trabalhar a qualquer dia e horário (noite, fins de semana ou feriados) acaba sendo mais recompensado do que mulheres que não têm essa flexibilidade por terem que cuidar da família. Vale a pena destacar que pesquisas na mesma linha da desenvolvida por Claudia Goldin têm sido realizadas também no Brasil. Encerro o artigo mencionando três nomes com trabalhos nesse campo: Janaina Feijó, pesquisadora da área de Economia Aplicada do FGV IBRE, que desenvolve atualmente pesquisas na área de mercado de trabalho, educação e desigualdades sociais; Ana Luiza Neves de Holanda Barbosa, técnica de Planejamento e Pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, IPEA, professora da Faculdade de Economia e Finanças do IBMEC-RJ e membro do Grupo de Estudos em Economia da Família e do Gênero (GeFaM); e José Pastore, que recentemente publicou o artigo "Quando a proteção desprotege as mulheres", no qual observa que não raras vezes os legisladores, com a boa intenção de proteger as mulheres e conquistar o seu voto, acabam criando tantas dificuldades que o resultado final é uma verdadeira desproteção. Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.
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