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A história do plano que levou a nocaute a hiperinflação crônica do Brasil 

Programa da TV Espaço Democrático entrevista um dos criadores do plano de estabilização, o economista Persio Arida

https://youtu.be/VMCaKgzq2ig?si=2ecgBLnRX6WX7R1u Redação Scriptum O economista Roberto Macedo costuma dizer que Persio Arida e André Lara Resende, os artífices do Plano Real, mereciam ganhar o Prêmio Nobel de Economia por sua obra, que promoveu a transformação na vida de milhões de brasileiros. Macedo fala com conhecimento de causa. Secretário de política econômica do Ministério da Fazenda e presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) no início da década de 1990, ele conhece como poucos os efeitos nefastos da hiperinflação sobre a sociedade brasileira nos anos que se seguiram à redemocratização. Modesto, Arida atribui à generosidade do seu ex-professor na Faculdade de Economia da Universidade de São Paulo (USP) a sugestão de um prêmio pela criação e implementação do Plano Real, que está completando 30 anos. “Foi um privilégio, uma experiência absolutamente única formular uma teoria, não conseguir aplicá-la uma vez, ter uma segunda chance e enfim conseguir aplicá-la com sucesso”, diz o economista em entrevista ao programa Diálogos no Espaço Democrático, produzido pela fundação de estudos e formação política do PSD e disponível em seu canal de Youtube. Na entrevista aos economistas Roberto Macedo e Luiz Alberto Machado, ao cientista político Rogério Schmitt, ao ex-deputado e coordenador de Relações Institucionais do Espaço Democrático, Vilmar Rocha, e ao jornalista Sérgio Rondino, âncora do programa de entrevistas, Arida contou não só como foi concebida a ideia do Plano Real, mas também algumas histórias de bastidores de alguns dos principais personagens envolvidos no projeto. Economista formado pela USP, ele tem doutorado pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT), lecionou na própria USP e na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), período durante o qual ele e André Lara Rezende, a quem havia conhecido no MIT, estudaram profundamente a hiperinflação brasileira e desenvolveram a Teoria da Inflação Inercial. Foi a partir dela que desenvolveram a ideia de uma reforma no sistema monetário por meio da criação de uma moeda nova, que circularia junto com a da época, o cruzeiro, que aos poucos seria abandonado. A ideia passou a ser conhecida como Plano Larida (acrônimo dos nomes dos dois economistas) e poderia ter sido colocada em prática oito anos antes, em 1986, no governo de José Sarney, quando foi criado o Plano Cruzado. Primeira tentativa “Antes do Plano Cruzado eu conversei com o então procurador-geral da República, Saulo Ramos, sobre fazer algo com base no Plano Larida, usando uma moeda indexada, e a resposta dele foi direta: esqueça porque no Brasil só pode existir uma moeda, a Constituição não permite duas e o STF vai derrubar”, conta. “O plano ‘B’ era muito inferior, parecido com o que Israel havia feito um ano antes: congelamento temporário de preços e salários com base em acordo com centrais sindicais, algumas regras para mudar contratos, forte contração fiscal e política monetária bastante apertada”. Olhando em retrospectiva, Arida considera que o Cruzado era um plano natimorto na medida em que não foi possível ajustar as políticas fiscal e monetária – o Banco Central não tinha independência para subir a taxa de juros. “Por uma certa ingenuidade nossa, não demos a devida atenção ao fato de que teríamos eleições em outubro daquele ano (para os governos dos Estados, Câmara Federal e Senado) e para os políticos, a tentação de estender o congelamento por muitos meses ficou irresistível”. Neste cenário, os gastos públicos aumentaram, e foi até mesmo introduzido um gatilho salarial de última hora no plano. Congelamentos em série Apesar do fracasso do Plano Cruzado, que parece ter incutido na classe política o conceito equivocado de que era necessário o congelamento de preços para segurar a inflação – foi assim em todos os planos de estabilização que vieram a seguir, Bresser, Verão, Collor 1 e Collor 2 – o economista acredita que a experiência parece ter fixado no imaginário coletivo a ideia de que era possível, ainda que temporariamente, estancar o processo inflacionário. “A inflação, entre os planos de estabilização, passou a ter uma dinâmica de expectativa pura: o empresário sabia que se ela subisse teria de enfrentar congelamento e aumentava os preços preventivamente – e sempre que a inflação subia os políticos queriam fazer outro congelamento, era a forma de manter a popularidade”, explicou. Este cenário só foi alterado quando Marcílio Marques Moreira assumiu o Ministério da Fazenda, depois de Fernando Collor ter desistido dos planos de estabilização. “A gestão do Marcílio foi a do bom senso, anunciou que não haveria plano, nem congelamento, e assim a inflação deixou de ter esse caráter de expectativa para voltar a ser inercial, ou seja, as condições para a implementação do Plano Larida voltaram”. Já no governo de Itamar Franco e com Fernando Henrique Cardoso como ministro da Fazenda, Arida, então, foi conversar com José Tadeu de Chiara, professor de direito econômico do Largo São Francisco, para tentar derrubar a dificuldade jurídica que impediu a criação da moeda virtual oito anos antes. “Ele escreveu a minuta de criação da URV e, juridicamente, tornou tudo factível”, conta o economista. Personagens Na entrevista Arida falou sobre três dos principais personagens que estiveram envolvidos no processo de criação do Plano Real: o presidente Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso e o embaixador Rubens Ricupero, que estava à frente do Ministério da Fazenda quando o plano foi implementado. Fernando Henrique, segundo ele, tem um papel que define como “extraordinário” no processo. “Ele bancou a ideia que, se desse certo, lhe daria capital político excepcional, e se desse errado, seria o seu funeral político”, avalia. “O fato de ele ser um intelectual fez toda a diferença, mas Fernando Henrique também era um político, senador, tinha certa ascendência sobre o Itamar, que o respeitava muito, e muita sabedoria na conversa”, conta. “Fui com ele várias vezes conversar com o presidente, na Câmara, no Senado e ele conduzia a conversa com jeito único”. Sobre Itamar Franco, acredita que “não tinha repertório intelectual para entender o programa”. A ideia central do presidente era aumentar salários e congelar preços. “Disso ele entendia e sabia que lhe daria popularidade, mas o Fernando Henrique teve a habilidade de convencê-lo a lançar um plano que ele nunca entendeu”. O economista conta que a conversa, com o Itamar, era sempre muito difícil. “Ele falava pouco e eu mesmo não conseguia entender o que ele não havia entendido; e é difícil explicar algo se você não entende o que o outro não entendeu”, diz. “Para mim, era uma conversa pedregosa”. Já Rubens Ricupero, de acordo com ele, teve o papel de um “pregador” nos meses cruciais em que esteve à frente do Ministério da Fazenda. “Entendeu o plano, não interferiu e fez uma peregrinação incansável para explicar o que estava acontecendo”. Dos personagens que se colocaram contra o Plano Real, Arida rememorou uma conversa que teve com o então deputado federal em primeiro mandato Jair Bolsonaro. Ele quis saber se os salários dos militares teriam reajustes reais. “Eu respondi que não e, quando tentei explicar a razão, ele disse que aquilo era o suficiente: ia votar contra, e assim fez”. Futuro Olhando em perspectiva, Arida acredita que o controle da inflação no Brasil do século 21 está intrinsicamente ligado ao sistema democrático. “A inflação em 1970 (durante a ditadura) era de 12% ao ano e em 1980, 10 anos depois (ainda na ditadura) era de 100%; em um sistema democrático, se passasse de 12% para 100%, pode ter certeza de que o governo já teria caído”, diz. “O grande sustentáculo da estabilidade de preços é a opinião pública e no regime democrático, se o presidente deixar a inflação correr solta, não vai ser reeleito, o partido dele não vai se dar bem na eleição”. Arida destaca, porém, outras inquietações que diz ter. “Há um processo de empoderamento do Legislativo, e um processo de judicialização da política que estão tornando o País muito disfuncional”, aponta. “Territórios viraram Estados, Estados foram divididos e com isto ocorreu uma disfuncionalidade de representação enorme – na prática, Norte e Nordeste controlam o Senado e pelo teto controlam a Câmara”. Segundo ele, “há situações institucionais que preocupam, além das econômicas, mas sobre a estabilidade de preços estamos bem porque é um valor público”.

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Lula e Tarcísio garantem diálogo entre esquerda e direita, diz Kassab

Em entrevista ao Brazil Journal, presidente nacional do PSD diz que importante é que a polarização seja liderada por pessoas que entendam que o País não pode entrar numa guerra fratricida

[caption id="attachment_54757" align="aligncenter" width="763"] Kassab: "À medida em que Lula, como presidente, e governadores como Tarcísio dialoguem, a democracia se fortalece"[/caption] Cristiano Romero, do Brazil Journal Edição Scriptum A polarização extrema da política brasileira ainda não tira o sono de Gilberto Kassab, o influente presidente do Partido Social Democrático (PSD), articulador político do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) e seu secretário de Governo e Relações Institucionais. Na sua opinião, a polarização só se torna perigosa quando não há diálogo entre os polos do espectro político. Lula tirou Jair Bolsonaro da Presidência com a menor margem de votos da história. Os dois continuam sendo os líderes mais amados do País e, também, os mais rejeitados. Os ataques de quase seis mil bolsonaristas às sedes dos Três Poderes, em Brasília, foram o momento mais grave dos 38 anos de redemocratização. Simbolizam uma intolerância que não se via no País desde a ditadura militar. Neste ambiente, não há “pontes” entre os dois polos. Mas Kassab – um negociador por excelência –  enxerga uma saída. “À medida que Lula e governadores como Tarcísio dialoguem, a democracia se fortalece,” disse Kassab em entrevista exclusiva ao repórter Cristiano Romero, do Brazil Journal. Para ele, a polarização não prejudicará o País, “desde que lideranças como Tarcísio e Lula não percam o protagonismo do processo.” “Os dois têm perfil político moderado. Bolsonaro já percebeu que terá sempre o apoio de Tarcísio. E Lula, que tem mais experiência, já deixou claro que não quer entrar numa guerra,” explica. Tarcísio já se reuniu com Lula em Brasília, e no início do mês dividiu um palanque com o presidente em Santos. Em Brasília, até os dois Candangos esculpidos por Bruno Giorgi na Praça dos Três Poderes sabem que quem construiu a ponte entre os dois foi Kassab. É possível que Bolsonaro não esteja satisfeito com a influência de Kassab sobre Tarcísio. Na semana passada, o Estado de S.Paulo informou que o ex-presidente vetou o apoio do PL a candidatos do PSD nas eleições municipais deste ano. “O Bolsonaro não é da política, e eu sou,” diz Kassab. Nesta entrevista, ele diz que não é bolsonarista, mas deixa claro que Tarcísio é leal ao ex-presidente e, em 2026, será candidato à reeleição com o seu apoio. Acrescenta também que caberá a Bolsonaro escolher o candidato presidencial da direita. Indagado sobre o suposto plano de Bolsonaro de dar um golpe de Estado, segundo investigação da Polícia Federal, Kassab diz que, “se ele errou, vai pagar por seus erros.” “Estou torcendo para que tudo seja esclarecido. Quero que ele tenha argumentos para esclarecer. Isso é muito melhor para que os brasileiros continuem acreditando na democracia.” O PSD, fundado por Kassab em 2011, tem hoje o maior número de prefeitos do Brasil (968). No Estado de São Paulo, 51% dos municípios são governados por seu partido. A legenda possui ainda a maior bancada no Senado (15) e, na Câmara, integra o segundo maior bloco em número de votos (143). Abaixo, os principais trechos da conversa. Como o senhor vê a polarização política aguda que o País vive neste momento? A polarização não é um problema em si. O importante é que ela seja liderada por pessoas que entendam que o País não pode entrar numa guerra fratricida. Já não estamos vivendo essa guerra? Não! Quase estivemos. Em qualquer democracia há esse enfrentamento da esquerda contra a direita, com o centro moderando ou tentando moderar. Não temos nada diferente disso ainda. E tem o centro. No Brasil, temos hoje na esquerda e na centro-esquerda um líder, o Lula. Na direita e na centro-direita, outro líder, o Tarcísio, pela dimensão do cargo que é o de governador de São Paulo. O líder da direita não é Bolsonaro? Tarcísio não tem como se afastar do ex-presidente. Ele tem que ser leal, afinal foi Bolsonaro que o fez ministro e deu a ele a oportunidade de ser governador, apoiando-o na eleição. Mas o Tarcísio, hoje, como governador de São Paulo, tem identidade e liderança próprias. Porém, o ex-presidente sabe que contará com Tarcísio para o seu projeto nacional. Quanto à polarização, na minha opinião, a estabilidade entre os dois polos da política precisa se consolidar. Por quê? Porque à medida em que for se consolidando, diminui a chance de aparecerem projetos aventureiros. Não se pode ter uma estrutura partidária como tínhamos há alguns anos, com 40 partidos. O Brasil está no rumo certo ao diminuir o número de siglas. Com isso, não haverá mais donos de partidos, mas, sim, líderes. Mas, na tradição brasileira, os partidos têm dono… A redução do número de agremiações partidárias já está acontecendo. Num país como o Brasil, com 156 milhões de eleitores e três ou quatro legendas, os partidos não terão donos. Isso é muito saudável. A centro-direita caminha para ser liderada por Tarcísio nos próximos vinte anos, se ele não errar. E o Lula, com idade mais avançada [78 anos], tem a missão de deixar como legado a organização da centro-esquerda. Este é o rumo do Brasil. O senhor projeta a liderança de Tarcísio, mas políticos próximos de Bolsonaro questionam a lealdade do governador em relação ao ex-presidente. Ninguém pode sonhar em afastar o Tarcísio do Bolsonaro. Assim como não é bom o Geraldo Alckmin se afastar do Lula. Por quê? Porque o Geraldo garante o centro para Lula. O senhor não acha que Bolsonaro se sente ameaçado por Tarcísio, justamente por ele ser o governador de São Paulo? Não, porque Tarcísio é uma pessoa muito correta. Ele jamais deixará de ser grato e leal a Bolsonaro. Isso está claro. O caminho de Tarcísio é ser candidato à reeleição em São Paulo e, com certeza, apoiado por Bolsonaro. Quem governa o Estado de São Paulo costuma logo entusiasmar-se com a possibilidade de, na sequência, eleger-se presidente. Os últimos três governadores do estado – José Serra, Alckmin e João Doria – trilharam esse caminho. Tarcísio não será candidato à presidência em 2026? Está claro que o candidato de Bolsonaro à presidência terá o apoio de Tarcísio. Só falta alguém imaginar que ele vá apoiar o candidato do Lula… Como ele está cuidando de São Paulo, Bolsonaro, o PL e o PP estão cuidando do projeto nacional. Tarcísio será leal a esse projeto e é correto que seja. Em São Paulo, ele tem um arco de alianças que o elegeu, hoje ampliado, e que sob seu comando vai trabalhar para reelegê-lo. E quem deverá ser o candidato da centro-direita e da direita em 2026? Bolsonaro terá um papel preponderante na escolha. Não se pode negar que ele tem hoje entre 20% e 30% do eleitorado e é bem provável que continue tendo esse apoio. A polarização não prejudica o País? Não, desde que lideranças como Tarcísio e Lula não percam o protagonismo do processo. Estamos falando dos líderes que ocupam os dois cargos de poder mais importantes no Brasil. Os dois têm perfil político moderado. Bolsonaro já percebeu que terá sempre o apoio de Tarcísio. E Lula, que tem mais experiência, já deixou claro que não quer entrar numa guerra. Agora, ele é adversário de Bolsonaro. O que puder fazer para derrotá-lo, ele o fará. Isso é da política. Hoje não há diálogo entre os dois polos… À medida em que Lula, como presidente, e governadores como Tarcísio dialoguem, a democracia se fortalece. Certamente o senhor incentiva esse diálogo, afinal foi quem levou o governador para conversar pela primeira vez com Lula. E defendeu isso dentro do governo paulista. Surgiram, inclusive, rumores de que Tarcísio poderia aliar-se ao petista. Essa chance é zero! Fui um dos que ajudaram a construir essa ponte entre o governador e o presidente. Quando houve o episódio de 8 de janeiro e os governadores foram chamados, fui uma das vozes dentro do governo defendendo essa posição, de que Tarcísio fosse a Brasília. E depois, quando a ministra Rosa Weber [então presidente do STF] ligou, a reunião ganhou um caráter ainda mais institucional. Mais tarde, ele teve aquela audiência com Lula. Na sua visão, Lula está preparando a esquerda para um futuro sem ele? Acho que ele é candidato à reeleição em 2026, mas está construindo o seu legado. Está procurando trazer o Guilherme Boulos [pré-candidato à prefeitura de São Paulo], que era um líder desgarrado, para perto. Está sabendo dar projeção nacional ao Fernando Haddad [ministro da Fazenda], ao Rui Costa [ministro da Casa Civil], entre outros. São lideranças que terão no mínimo 20 anos pela frente na política. Lula também está criando pontes com o centro através de Geraldo Alckmin. Qual é o seu papel e o do PSD neste momento em que predomina a falta de diálogo? Não se consegue fazer uma ponte entre dois projetos ruins. A ponte será boa para o Brasil se Tarcísio for um bom governador para São Paulo e Lula um bom presidente para o Brasil. Acho que os dois estão indo bem, cada um com as suas circunstâncias, as suas dificuldades, ambos com falta de recursos. Isso é muito ruim, afinal é um País com muitas carências. A falta de recursos desgasta o governante. Apesar dessas dificuldades, as próprias pesquisas de opinião têm sido muito positivas em relação a Tarcísio e Lula. O senhor diz que a consolidação dos campos da esquerda e da direita evitaria o florescimento de aventureiros. A eleição de Bolsonaro em 2018 não foi uma aventura? Na verdade, Bolsonaro foi a alternativa que o brasileiro encontrou para tirar o PT do poder. Ele foi o único que combateu o governo do PT. Foi inteligente e competente ao enxergar que o Brasil não queria mais o PT. Ele começou a correr o Brasil com esse discurso e venceu as eleições. E perdeu uma grande oportunidade. Qual? O governo dele teve méritos e erros que, na minha avaliação, foram erros que ele mesmo cometeu. Dá para falar que Paulo Guedes foi um mau ministro? É claro que não. Durante a Covid, ele deixou o Brasil de pé. As circunstâncias e os erros de Bolsonaro o levaram a ter um desgaste, e ele não teve apoio da política porque sempre negou a política. O senhor foi ministro do governo Dilma, e hoje está no governo de São Paulo. Qual é a relação que o senhor tem com Lula? É uma relação muito boa. O Lula sabe da minha correção e tem consciência de que o meu campo é na centro-direita e não na centro-esquerda. Mas temos e já tivemos alianças táticas importantes. Quando e onde? Na montagem do PSD, fizemos uma aliança e apoiamos a Dilma para presidente, de cabeça erguida e sem nenhum fisiologismo. Hoje o PSD dá uma contribuição para a governabilidade. O Lula sabe que eu, apesar de presidente nacional do partido, em São Paulo estou com Tarcísio e não com o PT. Lula respeita isso. Como o PSD atua no Congresso em relação ao governo Lula? No Congresso, o PSD é liderado pelo senador Otto Alencar, que é aliado do PT na Bahia e vice-presidente nacional do partido, e pelo deputado Antônio Brito, também aliado do PT baiano e vice-presidente nacional da legenda. Os dois lideram e coordenam as bancadas para dar governabilidade. Lula sabe que a minha prioridade é trabalhar pela governabilidade, o equilíbrio e o fortalecimento da democracia. O senhor construiu o PSD num Estado onde o PFL e, depois, seu sucedâneo, o DEM, nunca foram fortes. Como foi isso? O PSDB era tão forte em São Paulo que estrategicamente preferimos construir o partido em outros Estados. Na hora em que o PSDB tropeçou em São Paulo, naturalmente, dentro da base do Tarcísio, o partido que tinha mais afinidade com as lideranças do PSDB era o PSD. Modéstia à parte, como líder no Estado e há quase 40 anos convivendo com essas lideranças político-partidárias paulistas, eu e o PSD tivemos mais facilidade em atrair esses líderes, que se sentiram mais confortáveis em deixar o PSDB e vir para o PSD. Os outros partidos ou não tinham cacoete político – como as bases bolsonaristas que vieram de movimentos distintos da política e ainda estão aprendendo a construir a política partidária – ou são ligados às igrejas. O crescimento do PSD foi natural e dentro da base de Tarcísio. Ninguém questiona a lealdade do PSD e a minha ao Tarcísio. Isso é público e foi dito, inclusive, ao Lula. Nós entendemos que Tarcísio é um bom caminho para o Brasil no futuro, mas não em 2026. Como o senhor define, então, o PSD? O PSD está se consolidando como um partido de centro, com uma relação de respeito com a esquerda e em parceria com a direita. Ideologicamente, o partido está no campo da centro-direita. O PSD, porém, tem inteligência para compreender que em alguns Estados há lideranças que são de centro, mas que, ao longo de sua história, construíram parcerias com a esquerda. Onde? Na Bahia, por exemplo. Otto Alencar não é de esquerda. Antônio Brito também não é. Os dois têm uma relação sólida com o PT da Bahia. Pergunto a você: eu deveria expulsar o Otto do partido? Imagina! É o contrário. Tenho que respeitar isso. Ele é vice-presidente, o número 2 do partido desde a sua fundação. Otto, além de tudo, não é fisiológico. Ele foi contra a participação do PSD no governo Bolsonaro. Acho até que o Bolsonaro não teve a habilidade de conquistá-lo ou tê-lo mais próximo. Não pode haver essa aversão: “Ah, o cara é de esquerda, eu não quero saber”. É o que está acontecendo no Brasil hoje e vice-versa? É, mas é preciso trabalhar para reverter isso, o que venho fazendo. Não sou de esquerda, mas entendo ser importante cultivar relações com o PT e outros partidos de esquerda. No caso específico do atual governo, Lula ganhou a eleição. Eu não vou trabalhar para ele dar errado. Aqui em São Paulo, o outro lado da moeda prevalece. Somos governo e procuramos conviver com os partidos e parlamentares da oposição. Entre o governador e a oposição feita pelo PT? O PT é nosso adversário, mas existe diálogo. Petistas são recebidos aqui no Palácio pelo governador. São deputados eleitos, embora sejam nossos adversários. O MST, por exemplo. Temos profunda discordância com ações que o MST promove. O governador já deixou isso claro. Agora, não é por isso que deixaremos de autorizar o uso do Parque Estadual da Água Branca [localizado no bairro da Barra Funda, na capital paulista], onde eles montaram a sua feira de produtos agrícolas, como foi feito no ano passado. O governador Tarcísio já deixou claro, por outro lado, que irá agir com muito rigor contra invasões de terras. São Paulo dá um exemplo de diálogo e a gente quer levar esse modelo para o Brasil. Felizmente, o presidente Lula também pensa assim. O senhor se considera um bolsonarista? Não, não sou! Eu sou da política, mas é importante deixar claro o seguinte: eu não sou contra Bolsonaro. Não posso ser contra ele porque o meu líder, que é o governador de São Paulo, é aliado dele. Aqui em São Paulo, ajudei a eleger Tarcísio, que, por sua vez, ajudou Bolsonaro. A campanha de Tarcísio foi feita dentro da sede do PSD, que levou o nome de Bolsonaro. As reuniões políticas realizadas na minha casa foram inúmeras e em todas elas o Tarcísio fez campanha por Bolsonaro. Qual é a divergência entre o senhor e o ex-presidente? A divergência é que Bolsonaro não é da política e eu sou. Diante das gravações que mostram Bolsonaro supostamente articulando um golpe de Estado antes de deixar a presidência, o senhor não acha que ele representa uma ameaça à democracia? Se ele errou, vai pagar por seus erros. Não estou entre os que torcem para que ele se dê mal. Estou torcendo para que tudo seja esclarecido. Quero que ele tenha argumentos para esclarecer o que aconteceu. Isso é muito melhor para que os brasileiros continuem acreditando na democracia. Tem que dar a Bolsonaro todo o direito ao esclarecimento, isso é importante para o País e eu torço para que o faça, porque ele tem um papel relevante ao liderar a direita no Brasil.  

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Real faz 30 anos. Antes dele, inflação no Brasil chegou a 2.500%

O processo que resultou na conquista da moeda mais duradoura desde 1942 foi deflagrado em fevereiro de 1994

Ricardo Westin, da Agência Senado

Edição Scriptum

 

Há exatos 30 anos, o Brasil começou a executar o Plano Real, um conjunto de medidas que finalmente criou uma moeda forte e pôs fim a um histórico de hiperinflação persistente.

O Plano Real foi deslanchado no fim de fevereiro de 1994, quando o presidente Itamar Franco enviou para votação, no Congresso Nacional, a Medida Provisória (MP) que criou a Unidade Real de Valor (URV), uma espécie de moeda fictícia que antecedeu o real.

A conclusão do plano se deu na virada de junho para julho, quando Itamar mandou para os senadores e deputados a MP que implantou o real — a moeda brasileira mais duradoura desde 1942.

A situação era tão grave que, nos oito anos anteriores ao Plano Real, o País teve quatro moedas diferentes e chegou a registrar, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), um aumento anual de preços de quase 2.500%. Como comparação, a inflação de 2023 foi de 4,6%.

Documentos da época guardados hoje no Arquivo do Senado, em Brasília, mostram que muitos senadores manifestaram otimismo e esperança quanto às chances de sucesso do Plano Real, enquanto alguns, descrentes, prognosticaram que a inflação, após cair no primeiro momento, logo voltaria com força total.

Integrante do segundo grupo, o senador Henrique Almeida (PFL-AP) discursou:

— Apesar de todas as expectativas formadas em torno do plano de estabilização econômica, o fato é que o Brasil está no limite de sua resistência. Tudo indica que a adoção da URV não impulsionará o crescimento. Em minha opinião, como todos os outros planos, este é um pacote traumático, causador de incertezas e estimulador de remarcação de preços.

O senador Pedro Teixeira (PP-DF) foi ainda mais incisivo e atacou o ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, que comandou a equipe responsável por desenhar e executar o Plano Real:

— Abjuro essa política liberalóide, retórica e demagógica do ministro, que é feita de promessas sedimentadas na mitologia de um capitalismo dito democrático, tudo a serviço do sistema financeiro internacional e dos subsistemas dos países submissos a ele, entre os quais estamos nós. Um crime de lesa-pátria a merecer uma CPI! O plano não vai dar certo, senhor Fernando Henrique, e seu sonho será apenas mais um crime que se cometeu contra o povo brasileiro.

Antes de as cédulas e moedas de real começarem a circular, em julho, o pacote econômico era conhecido como Plano FHC.

Na direção oposta, o senador Maurício Corrêa (PSDB-DF) manifestou confiança no Plano Real:

— O presidente Itamar Franco ficará registrado na história como o homem que fez a transição do imobilismo, da descrença, para um país novo, de expectativas. Ele consertará a nossa economia e se credenciará como um dos grandes presidentes desta República.

O senador Albano Franco (PSDB-SE) seguiu a mesma linha do colega. Lembrando que 1994 era um ano de eleição presidencial, ele afirmou:

— Seria mais cômodo para o presidente e seu ministério simplesmente se entregarem à administração do cotidiano, deixando a recuperação da moeda para o próximo governo. Mas decidiram enfrentar o problema e, neste final de mandato, correr os riscos inerentes a um plano de estabilização. Itamar demonstrou mais uma vez sensibilidade humana. Afinal, a inflação é responsável pelo estado de miséria e dilaceração social a que estão submetidas imensas parcelas do povo brasileiro.

Nos tempos da hiperinflação, os funcionários do comércio usavam a todo momento as máquinas de etiquetar preços, substituindo os valores antigos por novos mais altos. Foi na época do Plano Real que começou a se espalhar pelo Brasil a tecnologia da leitura de código de barras.

O senador Epitácio Cafeteira (PPR-MA) resumiu o drama:

— A moeda perde o valor todo dia, tanto que faz parte do noticiário econômico de todas as televisões e rádios o preço do dólar, que às vezes muda três vezes: de manhã, na hora do almoço e de noite, na hora do fechamento do comércio. Quando a moeda não tem valor, basta dormir fora do banco para valer menos. Não quero defender nenhum supermercado ou loja, mas isso naturalmente leva o comerciante a adaptar a sua mercadoria ao preço da moeda, senão ele não pode repor o seu estoque.

Nos discursos, os senadores descreveram comportamentos típicos dos brasileiros dos tempos pré-Plano Real. Jutahy Magalhães (PSDB-BA) disse:

— Para não ver evaporar-se o seu dinheiro, o brasileiro teve que se transformar num financista. Falo da classe média. Abrindo qualquer jornal na seção de assuntos econômicos, temos uma ideia do intrincado cipoal de opções que é oferecido aos investidores. Na verdade, não se trata de investimento no sentido tradicional do termo porque, em geral, não se busca lucro. O que mais deseja o aplicador médio é perder o menos possível. Mesmo os cidadãos mais modestos tiveram que desenvolver um mecanismo de defesa, e esse foi o dos depósitos em cadernetas de poupança.

Ele prosseguiu:

— Tenho que incluir outro segmento, o dos marginalizados, o dos excluídos, o dos que, por não terem emprego nem salário, foram condenados à miséria mais hedionda. Por fim, temos os mais ricos, que se beneficiam do processo inflacionário e da especulação nele embutida.

O senador Pedro Simon (PMDB-RS) citou o seu próprio caso:

— Eu, por exemplo, tenho meu dinheiro na poupança e até tenho conta ativa no “fundão” do Banco do Brasil. Se a inflação é X, o meu dinheiro ali está aumentando. Mas o cidadão, o operário que recebe no fim do mês e paga mensalmente com o que recebe, esse paga a inflação do bolso dele.

 

 

O senador Gerson Camata (PSDB-ES) levou para os colegas uma entrevista publicada na revista Veja com o bilionário empresário Luciano Benetton, dono da multinacional de roupas que leva o seu sobrenome:

— O industrial italiano faz uma crítica, dizendo que o único país organizado em vias de desenvolvimento que tem uma inflação de 30% ao mês é o Brasil, que o primeiro mundo não consegue entender por que não conseguimos acabar com essa inflação e que a maneira de acabar com ela é simples, mas não queremos, porque a inflação tem sócios.

O senador Ronan Tito (PMDB-MG) concordou com a avaliação de Benetton:

— Se no regime inflacionário há aqueles que pagam, por outro lado há também aqueles que ganham. E quem são os sócios da inflação? São os monopólios que a transferem para o preço, os comerciantes que remarcam. Com isso, realimentam a inflação. E há os banqueiros. Peguem os balanços dos bancos e vejam se um deles, só um deles, perdeu dinheiro em todo este tempo de inflação.

Em fevereiro de 1994, às vésperas de o governo mandar para o Congresso a primeira das duas MPs do Plano Real, o senador Nabor Júnior (PMDB-AC) pôs a hiperinflação brasileira em termos concretos e práticos:

— O pãozinho francês de 50 gramas, que é a alimentação básica da população brasileira, na semana passada custava CR$ 38 [cruzeiros reais] e hoje está sendo comprado a CR$ 58. Não podemos admitir que isso ocorra num tempo democrático e fundado nos direitos sociais.

A hiperinflação brasileira teve suas origens em 1979, quando explodiu a segunda crise internacional do petróleo, provocando uma subida dos preços do produto. Os Estados Unidos, fortemente dependentes do petróleo importado, passaram a ter uma inflação considerável. Para contê-la, o Federal Reserve (banco central americano) aumentou as taxas de juros no país. Isso acabou afetando o mundo todo e provocou uma recessão generalizada.

As dívidas que países da África e da América Latina tinham com bancos dos Estados Unidos subiram exponencialmente porque estavam financiadas aos juros ingleses, por sua vez vinculados aos juros americanos, e se tornaram impagáveis. O México, em 1982, decretou moratória, ou seja, o calote da sua dívida externa.

De acordo com o economista Pedro Paulo Zahluth Bastos, professor da Unicamp e coordenador do Centro de Estudos de Conjuntura e Política Econômica, o Brasil havia contraído a dívida externa na ditadura militar para financiar tanto as empresas estatais que orientavam a economia nacional quanto a indústria privada. O dinheiro dos bancos americanos contribuiu com o 2º Plano Nacional de Desenvolvimento (PND), na segunda metade da década de 1970.

— Os Estados Unidos fizeram pressão sobre a ditadura militar para que o Brasil não se transformasse num segundo México, pois, dado o tamanho da dívida brasileira, isso quebraria o sistema financeiro americano. Por orientação do Fundo Monetário Internacional [FMI], o Brasil e os demais países do sul global adotaram políticas de corte de gastos públicos para terem dinheiro para o pagamento dos juros da dívida, e realizaram fortes desvalorizações cambiais, para assegurar superávit comercial, mas isso provocou inflação. Foi por isso que o descontrole inflacionário dos anos 1980 ocorreu ao mesmo tempo no Brasil, na Argentina, na Bolívia, no Equador.

O economista explica que esse mesmo tipo de hiperinflação afetou os países derrotados na Primeira Guerra Mundial, como a Alemanha, que tiveram que desvalorizar suas moedas para fazer frente às dívidas de guerra estabelecidas pelo Tratado de Versalhes.

Zahluth Bastos diz que as orientações do FMI ainda tiveram como efeito indesejado o colapso do setor produtivo brasileiro nos anos 1980, prejudicando o emprego. Elas também reduziram a arrecadação tributária e dificultaram ainda mais o pagamento da dívida. Ele continua:

— Na época, criou-se o discurso de que a alta inflação surgiu porque o Brasil era irresponsável nos gastos públicos. Isso colou, mas não é verdade. A alta inflação surgiu por causa da política econômica orientada para gerar grandes superávits comerciais de modo a pagar o serviço da dívida e proteger os bancos americanos. Foi isso que interrompeu o nosso ciclo de crescimento econômico.

Os documentos do Arquivo do Senado mostram que em 1994 houve especulações a respeito de um possível golpe de Estado decorrente da hiperinflação. Quando o Plano Real foi lançado, fazia apenas nove anos que a ditadura militar havia chegado ao fim.

Da tribuna do Plenário, o senador Affonso Camargo (PPR-PR) leu uma reportagem de jornal em que o presidente da Confederação das Associações Comerciais do Brasil, Guilherme Afif Domingos, candidato derrotado na eleição presidencial de 1989 e hoje filiado ao PSD, afirmava que, na tentativa de baixar a inflação, o presidente da República seguinte poderia “atropelar a democracia e governar sem o Congresso”. O senador disse:

— Afif declarou que a permanência da inflação no patamar de 30% ao mês será fatal para a democracia e que a história mostra que a inflação neste século gerou totalitarismo [como o fascismo na Itália e o nazismo na Alemanha].

O senador Pedro Simon pediu a palavra para dizer que o risco de um golpe de Estado, embora pequeno, não poderia ser desprezado:

— O senhor Armando Falcão [ministro da Justiça na ditadura militar], durante 15 minutos na TV Manchete, pregou o golpe. Sabemos que essas vivandeiras existem, à espera do caos, do que é pior. É natural que numa sociedade haja 3% de birutas, de pessoas excepcionais, que vivem essa realidade. A imensa maioria é democrata e defende um regime de paz. Mas, se não nos prepararmos, se a imensa maioria dos democratas for desorganizada, irresponsável, uma minoria desorganizada terminará avançando.

Para tentar derrotar a hiperinflação, os dois primeiros presidentes do período democrático tentaram de tudo.

Os planos econômicos do presidente José Sarney incluíram o congelamento de preços, com a convocação aos cidadãos para que denunciassem às autoridades os comerciantes que remarcassem os preços ou escondessem as mercadorias. Eles ficaram conhecidos como “fiscais do Sarney”.

Os planos de Fernando Collor de Mello, por sua vez, incluíram o confisco temporário do dinheiro que a população tinha depositado nos bancos.

As experiências foram traumáticas. No caso dos congelamentos, os preços de fato baixaram inicialmente, mas logo em seguida dispararam de novo, num violento efeito rebote.

No caso do confisco bancário, os brasileiros se sentiram traídos, pois Collor havia dito que seria o candidato Luiz Inácio Lula da Silva quem faria isso se vencesse a eleição presidencial de 1989.

O Plano Real que o ministro Fernando Henrique Cardoso prometia não teria nada disso.

— Este é o primeiro plano no Brasil feito às claras, sem pacote, sem feriado bancário. Estou torcendo e rezando para que dê certo — disse o senador Gerson Camata.

— A concepção do plano é boa? — perguntou o senador Ronan Tito, para ele mesmo responder logo em seguida. — Diria até que é mais do que boa. É ótima. Depois de tantas mágicas, as margens de manobra foram diminuindo. Fica difícil, para mim, questionar um plano que respeita contratos, que não sequestra poupança e que, afinal de contas, não comete os desatinos que os planos ou os pacotes anteriores cometeram. Afinal, agrediram a população. Caíram em cima da cabeça da população brasileira.

Alguns dos integrantes da equipe econômica de Fernando Henrique haviam participado da elaboração do Plano Cruzado, no governo Sarney, como os economistas André Lara Resende e Pérsio Arida. Na avaliação do senador Esperidião Amin (PPR-SC), isso era positivo, pois eles, mais do que ninguém, saberiam evitar os erros do passado:

— Hoje [28 de fevereiro de 1994] é o dia do nascimento de outro plano. Há oito anos, nascia o Plano Cruzado. Boa parte da paternidade é a mesma. Comentam alguns que algumas barbas encaneceram, outros fios azularam. E, de uma forma ou de outra, os pais, oito anos depois da última paternidade, devem ser mais responsáveis.

O senador Eduardo Suplicy (PT-SP) fez uma recomendação ao governo:

— Combater a inflação, erradicar esse problema endêmico é prioritário, ainda mais em função das consequências altamente regressivas para a população. Mas esperamos que o governo ataque concomitantemente o problema da miséria, tome medidas com igual vigor para melhorar a distribuição da riqueza. É preciso assegurar a cada pessoa uma renda mínima, o direito à cidadania, que lhe viabilize pelo menos tomar o café da manhã, almoçar e jantar para ir à escola com força e energia para aprender, desenvolver-se e obter remuneração a mais adequada possível no mercado de trabalho.

O Senado teve participação no Plano Real não apenas discutindo e votando as MPs do governo. Pertencia à Casa o artífice da estabilização econômica. Fernando Henrique era senador, eleito pelo PMDB de São Paulo, desde 1983. Ele havia se licenciado do Senado para assumir, no governo Itamar, primeiro o Ministério das Relações Exteriores e depois o Ministério da Fazenda.

O senador Affonso Camargo discursou:

— Sentimo-nos aliviados quando assumiu o Ministério da Fazenda o nosso colega Fernando Henrique Cardoso, cujas qualidades não preciso aqui enumerar, e porque percebemos que Sua Excelência recebeu carta branca do presidente Itamar para administrar os problemas da economia brasileira, além da promessa de que, a princípio, apenas ele falaria sobre economia.

Bem menos otimista, Epitácio Cafeteira preferiu lembrar que o ministro não era economista, mas sociólogo:

— A impressão que tenho é que a boa-fé, a boa-vontade e o caráter do nosso companheiro Fernando Henrique Cardoso desaparecem diante da falta de conhecimentos técnicos para tomar medidas que possam segurar esta inflação. Diria até que a “paulada” que promete dar na inflação não vai ser mais do que uma batida de toalha molhada.

O ministro respondia que o importante era estar rodeado de economistas competentes.

Antes de Fernando Henrique, o presidente Itamar Franco teve três diferentes ministros da Fazenda. Um dos motivos para a escolha do senador para assumir o combate ao descontrole inflacionário foi o seu bom trânsito político com os senadores e deputados decorrente da longa experiência no Senado.

 

 

A partir do momento do anúncio oficial do Plano Real, em dezembro de 1993, Fernando Henrique compareceu algumas vezes ao Senado, tanto ao Plenário quanto à Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), para explicar aos parlamentares os mecanismos da nova moeda e a necessidade de aprovar as duas MPs.

— Estamos convictos de que, dentro de poucos meses, no momento do real, a inflação cairá a zero — assegurou ele numa dessas audiências públicas.

— O aspecto mais dramático da inflação brasileira não é que ela esteja impedindo o crescimento econômico, o que também ocorre. Mas ela, sobretudo, assegura a desigualdade social, garante um padrão de concentração de renda. Fico irritado quando certas pessoas dizem que não estou olhando para o social. Isso é demagogia. Para eu poder olhar para o social para valer, tenho que criar as condições de sustentabilidade do crescimento. Não existe programa de combate à fome sem isso. Dizem também que o programa não olha para o emprego. Como não olha para o emprego? Estamos criando as condições para que haja investimento — afirmou o ministro em outra audiência.

— Vou dizer com franqueza aos membros do Senado, Casa à qual pertenço: preciso de apoio. Não estou pedindo quase nada. Será que o Congresso, que votou o Plano Verão e votou o Plano Collor, não pode agora dar esse mínimo ao País? — pediu Fernando Henrique.

O senador Almir Gabriel (PSDB-PA) avaliou:

— O fato de o ministro e a equipe econômica do governo virem a este Senado debater revela o dado mais importante desse plano, que é o seu conteúdo democrático. O governo, via ministro Fernando Henrique Cardoso, pretende que o plano de estabilização econômica tenha a adesão e a participação da sociedade brasileira.

A Unidade Real de Valor, prevista na medida provisória de fevereiro, era uma espécie de moeda fictícia e transitória que tinha o mesmo valor do dólar norte-americano. Por ser uma moeda forte, o dólar serviu de âncora para a URV. Nunca existiram cédulas dela. A URV não substituiu o cruzeiro real, mas conviveu com ele por quatro meses.

Os preços no Brasil passaram a aparecer nas duas moedas. Os valores expressos em cruzeiros reais (uma moeda podre), por força da hiperinflação, continuaram crescendo diariamente, mas os respectivos valores expressos em URVs (uma pseudomoeda forte) pouco ou nada mudaram com o passar do tempo. O mesmo valeu para os salários, que apareciam tanto em cruzeiros reais quanto URVs.

Até então, os empresários, os consumidores e até o poder público só agiam no dia a dia contando com a inevitabilidade dos aumentos galopantes, o que acabava retroalimentando e perpetuando a inflação. O grande objetivo da URV foi preparar a mentalidade do Brasil para um ambiente novo em que os preços não mudassem incessantemente.

Em 1º de março, o primeiro dia, uma URV equivalia a CR$ 647,50. Em 30 de junho, o último dia, correspondia a CR$ 2.750.

  [caption id="attachment_37843" align="aligncenter" width="860"] "Estamos convictos de que, dentro de poucos meses, no momento do real, a inflação cairá a zero", assegurou o então ministro Fernando Henrique Cardoso.[/caption]  

Houve críticas à âncora cambial. O senador Eduardo Suplicy ponderou:

— Atrelar a URV ao dólar de forma rígida pode representar a dolarização da economia brasileira, de maneira apenas um pouco diferente da que realizaram a Argentina e outros países, que perderam significativamente a autonomia de sua política monetária e cambial. A dolarização implica ficar atrelado às decisões do Tesouro e do Banco Central americanos. Gera, além disso, perda de competitividade internacional e, portanto, dependência de financiamentos externos, obtidos muitas vezes em condições adversas de prazo e custo. O pior está na dificuldade de reverter o processo uma vez iniciado.

Incisivo, o senador Magno Bacelar (PDT-MA) se disse indignado:

— Nunca ao longo da minha vida política assisti a uma promoção tão grande, a tanto subterfúgio para dolarizar a economia do nosso País.

Pedro Simon, que era o líder do governo no Congresso, disse que não se tratava da dolarização do Brasil e acrescentou:

— Não temos de ligar o nosso destino ao dólar. O atrelamento não pode ser definitivo. Quando o programa der certo e eventualmente o valor da nossa moeda diminuir, tomaremos providência no sentido de desvinculá-la do dólar. Creio que será feito isso.

Em 1º de julho, quando o País já estava devidamente acostumado com a URV, o cruzeiro real foi substituído pelo real, moeda prevista na segunda medida provisória do Plano Real. A URV também deixou de existir. Naquele dia, uma URV equivalia a R$ 1.

Nos debates das medidas provisórias no Congresso, um parlamentar propôs uma emenda para que as importâncias em dinheiro fossem grafadas com o símbolo BR$, numa referência direta ao Brasil. Ele argumentou que os Estados Unidos usam US$ para sua moeda (US significa United States). A emenda não foi aprovada.

O lançamento do real não coube a Fernando Henrique Cardoso. Confiando nos bons resultados que o plano produziria, ele deixou o Ministério da Fazenda na virada de março para abril, ainda na fase da URV, para se candidatar à Presidência da República pelo PSDB. Quem lançou o real foi seu sucessor no ministério, Rubens Ricupero.

Muitos senadores não aprovaram a saída do ministro Fernando Henrique em plena transição.

Numa audiência pública, o senador Eduardo Suplicy perguntou aos economistas que assessoravam Fernando Henrique:

— Se sair o ministro, que cara terá o Plano FHC? Os membros da equipe hoje têm segurança de qual será a fórmula tomada pelo plano de estabilização com a saída do ministro daqui a 15 dias, se ocorrer? Essa pergunta é importantíssima para a sociedade brasileira.

O economista Edmar Bacha respondeu:

— Atravessaremos esse [rio] Rubicão quando a ele chegarmos. Sua Excelência tem declarado que não é ministro.

O senador Magno Bacelar se indignou:

— Sua Excelência não engana mais ninguém com a mídia que tem utilizado. O programa [Plano Real] é o pré-lançamento de sua candidatura e o país já tem consciência disso.

O senador Ney Maranhão (PRN-PE) pediu:

— Ministro Fernando Henrique Cardoso, acima de sua candidatura está o Brasil. Não saia do ministério, senão o barco irá ao fundo e o plano econômico não dará certo. O povo acredita em Vossa Excelência!

Assim que Fernando Henrique oficializou a candidatura presidencial, as críticas ao plano aumentaram, partindo principalmente daqueles que seriam seus adversários na eleição. Pedro Simon analisou os ataques:

— Sejamos sinceros. Não vamos querer que o senhor Luiz Inácio Lula da Silva, o senhor Leonel Brizola, o senhor Orestes Quércia, o senhor Esperidião Amin e outros candidatos estejam por aí a endeusar o plano, a dizer que ele é fantástico e daí a pouco achem que o Fernando Henrique vai ganhar. A crítica é normal. E digo que não estou vendo nos presidenciáveis um sentido de bater para destruir ou para fazer com que o plano não dê certo. Hoje sabemos que, para o ano que vem, ele terá mais ou menos garantidas a sua ação e a sua administração.

Tanto na véspera da criação da URV quanto na da implantação do real, o Brasil assistiu a aumentos desenfreados de preços, tanto por quem quis se aproveitar do momento de mudança para lucrar mais quanto por quem estava escaldado com os planos econômicos anteriores e dessa vez não desejava ter novas surpresas desagradáveis.

Os senadores se indignaram.

— Constatamos, de forma insofismável, a existência de inflação em URV. Minha preocupação é a de que, com o anúncio da entrada em vigor do real em 1º de julho, ocorram ainda remarcações muito mais acentuadas nos preços dos produtos, principalmente daqueles que compõem a cesta básica do trabalhador brasileiro — discursou Nabor Júnior.

— Começamos a entender que há muita gente neste País que não quer realmente que a inflação acabe. Há bancos e empresas que vivem desse tipo de especulação. Há setores do comércio que são irresponsáveis, impatrióticos — disse Gerson Camata.

— Eu disse ao ministro Fernando Henrique que ele tinha que agir e, se for o caso, colocar na cadeia, porque esses setores estão roubando. Aliás, está nos jornais de hoje que o ministro declarou que aumentar em URV é roubar. É isto que tem gente fazendo: roubando! É fundamental que o governo tome providências — cobrou Pedro Simon.

— Será preciso ter muita cadeia neste País. Será preciso reservar alguns estádios de futebol para prender os que abusaram violentamente e cometeram crimes contra a economia popular. O ideal seria não anunciar as prisões [com antecedência]. Seria melhor agir durante a noite — sugeriu o senador Mansueto de Lavor (PMDB-PE).

O temor dos senadores era que, por causa desse combustível extra jogado na inflação, o Plano Real acabasse naufragando. Não foi, felizmente, o que ocorreu. Os preços em real rapidamente se ajustaram à nova realidade. A estabilização econômica foi um sucesso.

Conforme havia projetado a equipe econômica do governo, a inflação começou a despencar de imediato. Em junho de 1994, último mês do cruzeiro real, inflação mensal medida pelo IPCA foi de 47,5%. Em julho, primeiro mês do real, ficou em 6,8%.

E a queda continuou. Nestes 30 anos desde o início do Plano Real, a inflação mensal quase nunca passou de 1,5%. Alguns meses chegaram a registrar inflação zero e até deflação. O Brasil ganhou uma moeda estável.

Em contraste, nos dias mais sombrios da hiperinflação o aumento mensal bateu na casa dos 82%. Esses tempos enfim ficaram no passado.

O economista Pedro Paulo Zahluth Bastos, da Unicamp, explica que um pacote semelhante ao Plano Real dificilmente poderia ter surgido e dado certo nos anos 1980:

— Em 1994, vivíamos um contexto muito específico. O governo Collor já havia promovido a abertura financeira e comercial do Brasil para o mundo. Com a abertura financeira e a redução dos juros nos Estados Unidos, os dólares voltaram a entrar no Brasil e a moeda nacional se valorizou. Dadas a facilitação da compra de produtos importados e a valorização cambial, o preço das mercadorias caiu em termos reais. Como os juros no mundo voltaram a ficar muito baixos, o Brasil pôde renegociar a dívida externa em condições mais favoráveis. O controle da inflação naquele momento não ocorreu apenas no Brasil, mas em todos aqueles países que haviam sido tragados pela crise dos anos 1980.

Um dos efeitos colaterais, dada a entrada de produtos importados a preços competitivos, foi o enfraquecimento da indústria nacional, que nunca mais conseguiu voltar aos patamares anteriores aos da década de 1980, com reflexos no desemprego.

Por outro lado, o fim do descontrole crônico de preços permitiu que o poder público deixasse de voltar todas as suas atenções para o pagamento de uma dívida externa impagável e também para combate à inflação e o pagamento da dívida externa e começasse a olhar outras áreas, como a social.

De acordo com os papéis históricos do Arquivo do Senado, os brasileiros logo se deram conta de que o real tinha chegado para ficar. Dois meses após o lançamento da nova moeda, o senador Eduardo Suplicy discursou:

— O povo brasileiro dá extraordinário valor ao fato de que os preços estão crescendo menos do que em junho último. A cesta básica diminuiu desde 1º de julho, quando estava em torno de R$ 107. Hoje encontra-se em torno de R$ 99. Mas ainda bem acima dos R$ 85 de março último.

O senador Maurício Corrêa afirmou:

— Ontem li no Correio Braziliense os resultados de uma pesquisa segundo a qual o índice de aceitação do governo Itamar Franco está em 71%. As pesquisas davam 44% em outubro do ano passado e março deste ano. Além disso, 68% dos brasilienses acreditam que o Brasil caminha bem e que a política está dando certo. Esse reflexo de Brasília transpira para o Brasil inteiro. É o que a nação está sentindo.

Na eleição de outubro de 1994, três meses após o lançamento do real, Fernando Henrique Cardoso foi o vencedor das eleições presidenciais logo no primeiro turno.

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Debate político transbordou para o cotidiano e criou o fenômeno da calcificação

Cientista político Rubens Figueiredo, consultor do Espaço Democrático, fez palestra na reunião semanal da fundação

[caption id="attachment_37833" align="aligncenter" width="560"] O cientista político Rubens Figueiredo: "É a calcificação, que produz endurecimento e rigidez; é muito mais difícil as pessoas se afastarem de suas convicções"[/caption]

Redação Scriptum

 

Polarização é pouco para definir a oposição de ideias no cenário político brasileiro. O debate transbordou para o cotidiano e para as relações interpessoais e a palavra que melhor se ajusta para traduzir o que acontece é calcificação. O termo foi cunhado pelos cientistas políticos americanos John SidesChris Tausanovitch e Lynn Vavreck, autores do livro The Bitter End: The 2020 Presidential Campaign and the Challenge to American Democracy (O fim amargo: a campanha presidencial de 2020 e o desafio à democracia americana, em tradução livre), na qual mostram como a disputa entre o republicano Donald Trump e o democrata Joe Biden, nos Estados Unidos, extrapolou os limites do debate político para se instalar nas discussões do dia a dia dos americanos.

O cientista político Rubens Figueiredo, consultor do Espaço Democrático, falou sobre o tema na reunião desta terça-feira (6) da fundação para estudos e formação política do PSD. Ele usou como referência para a sua exposição o livro Biografia do abismo: Como a polarização divide famílias, desafia empresas e compromete o futuro do Brasil, de autoria do também cientista político Felipe Nunes, sócio-fundador do instituto de pesquisa Quaest, e do jornalista e consultor Thomas Traumann, que foi porta-voz da presidência da República e ministro da Secretaria de Comunicação Social no governo de Dilma Rousseff.

“O debate entre Lula e Bolsonaro, entre lulistas e bolsonaristas, derramou da política para a sociedade”, disse Figueiredo. “É a calcificação, que produz endurecimento e rigidez; é muito mais difícil as pessoas se afastarem de suas convicções”, apontou ele. “Fatos novos, por mais dramáticos que sejam, não alteram o comportamento dos eleitores e um exemplo disto é que, apesar de todas as notícias negativas sobre Bolsonaro, o percentual de bolsonaristas não mudou, como demonstram as pesquisas”. Na mão inversa, também não mudam as convicções de lulistas com o noticiário adverso sobre o presidente.

  [caption id="attachment_37835" align="aligncenter" width="560"] Reunião semanal de colaboradores do ED[/caption]    

Figueiredo destacou que as pesquisas mostram como a calcificação se deu na sociedade brasileira: “17% das pessoas reconheceram que romperam relações com amigos e familiares e 54% afirmaram que conheciam quem tivesse rompido amizades ou laços familiares por conta do debate político”.

Ele ressaltou que “os dois grupos, petistas e bolsonaristas, têm visões bastante uniformes e cada vez mais distintas um do outro e os dois segmentos, além de estarem mais distantes do que nunca, estão mais parecidos internamente”. Figueiredo acredita que os choques de curto prazo disparados por Bolsonaro aceleraram o processo que levou o debate para o caminho da calcificação. “E há também as questões identitárias, que ganharam cada vez mais importância entre os eleitores de ambos os campos, exacerbando ainda mais as divisões e atraindo políticos para a discussão”, disse.

Participaram da reunião semanal do Espaço Democrático, os economistas Roberto Macedo e Luiz Alberto Machado, o cientista político Rogério Schmitt, o superintendente da fundação, João Francisco Aprá, os jornalistas Eduardo Mattos e Sérgio Rondino, coordenador de comunicação do Espaço Democrático, e, remotamente, o sociólogo Tulio Kahn e o gestor público Januario Montone.

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