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Estadão, 150 anos
A bomba no jornal e outras lembranças do jornalista Sérgio Rondino, que atuou durante 20 anos no grupo de comunicação
Sérgio Rondino, jornalista e coordenador de comunicação do Espaço Democrático Edição Scriptum Charles Lindbergh sorria enquanto o diretor do jornal o apresentava a um grupo de jornalistas. Sim, ele mesmo: o mundialmente famoso piloto norte-americano que, em 1927, 40 anos antes, cruzara pela primeira vez o Oceano Atlântico num arriscado voo sem escalas. O diretor do jornal era ninguém menos que o então patriarca da família que comandava o jornal, Júlio de Mesquita Filho. Era 1967 e eu, 20 anos de idade, repórter iniciante, fazia parte daquela roda, deslumbrado por estar ao lado daquelas figuras históricas. Ah, as memórias... Elas me assaltaram neste 4 de janeiro de 2025, com a leitura do excelente caderno especial do jornal O Estado de S.Paulo, o Estadão, lançado em comemoração pelos 150 anos de sua existência. Lembranças de muitos momentos que vivi durante 20 anos naquela agora sesquicentenária empresa de comunicação. Sou, até hoje, um assinante do Estadão. Daqueles antigos, que gostam de receber em casa de manhã o jornal impresso pelo prazer de ler enquanto tomam o café matinal. É verdade que, atualmente, parte do noticiário eu já li no dia anterior, porque também tenho a assinatura digital, mas era assim também quando eu trabalhava lá na produção e edição do noticiário do dia seguinte. Hoje, mesmo com o mundo da comunicação digital me bombardeando a cada minuto com notícias de todo o planeta, há muito o que ler no meu Estadão de todo dia. Sou, naquela expressão antiga de nossas redações, o tal “leitor assíduo”. E me refiro a “nossas” redações porque eram duas no meu tempo por lá: a do velho Estadão propriamente dito e a do jovem Jornal da Tarde, o vespertino da empresa lançado em 1966 – que fez uma revolução histórica no modo de fazer jornal e que hoje não existe mais, para tristeza minha e de muitos colegas de então. As duas redações ficavam no quinto andar do prédio da rua Major Quedinho, separadas apenas por um corredor. Que chamávamos de “corredor do tempo”, dada a diferença entre as equipes de profissionais. Diferença de idades, de vestimentas, de comportamento e até do próprio tipo de jornal que produzíamos de um lado e de outro. Eu era um jovem de 20 anos, em 1967, quando pisei pela primeira vez no imponente prédio da rua Major Quedinho, no centro de São Paulo, para me candidatar a uma vaga de estagiário na redação do Jornal da Tarde e iniciar uma carreira profissional de comunicação que dura até hoje. É claro que não cabe aqui desfiar tantas lembranças que me vieram à cabeça com esse caderno do Estadão. Mas conto um episódio, se me permitem. Uma bomba na madrugada Madrugada de 20 de abril de 1968. Como o JT era vespertino, o trabalho na redação se estendia até três, quatro da manhã, hora em que a redação do Estadão estava deserta. Quase todas as editorias tinham finalizado suas edições e alguns poucos de nós ainda esperavam outros para comer alguma coisa em uma lanchonete vizinha. Um grupo já estava esperando nos elevadores – se não me falha a memória éramos eu, o repórter Ramon Garcia, os editores Fernando Portela e Fernando Mitre, o redator Nicodemus Pessoa, e o editor Guilherme Duncan, que era meu chefe na Política. Talvez houvesse outros ali, mas já não lembro. Mitre, atual diretor de jornalismo na Rede Bandeirantes, conta que nesse momento alguém da redação avisou que faltava um título em certa página e ele voltou com mais alguém para resolver o problema. Confesso que não me lembrava desse detalhe. Foi tudo muito rápido. O que tenho na memória é que, nesse exato momento, um grupo desceu, enquanto eu e outros ficamos esperando outro elevador. Foi quando ouvimos um enorme estrondo, que parecia ter vindo lá de baixo – de fora, talvez? Ficamos atarantados. Será que o elevador caiu? Mas não. Imediatamente em seguida a luzinha do elevador que descera mostrou que ele estava voltando. A porta se abriu e vimos sair – lívidos – Portela e Nicodemus. Consultei o Portela, que me relatou assim o que lembra: “Estávamos descendo no elevador da direita (é incrível, mas lembro disso, e espero que a memória não me engane), apenas Nicodemus e eu. Imagino que à altura do segundo andar, pois o elevador já havia andado um pouco, a gente não chegou a ouvir um estrondo forte, mas um som abafado e algo como um deslocamento de ar. Ficamos meio "bobos", fora do mundo. Paralisados. Naquele momento, não tivemos ideia do que era. Não nos mexemos, e o elevador, que havia parado, subiu de volta. Quando a porta abriu, no andar da redação, só me lembro da cara apavorada de alguém gesticulando e gritando "Bomba no jornal! Bomba no jornal!". A partir daí não me recordo de mais nada. A não ser que continuei um tempo, alguns minutos, meio bobo. Escapamos por frações de segundos”. Foi uma bomba. Colocada junto a uma das portas metálicas de entrada (que à noite ficava fechada), no lado da rua Martins Fontes, provocou uma explosão tão violenta que arremessou aquela porta em direção à outra entrada, onde ficava o porteiro Mário José Rodrigues, o nosso sêo Mário, figura gentil. Ele não foi atingido, mas jogado violentamente contra a parede. Ficou apenas ferido, ainda bem. E nós? Se houvéssemos descido segundos antes talvez estivéssemos cruzando o saguão da portaria no exato momento em que a pesada porta veio voando do outro lado. É assim que me lembro. O que se seguiu, como não poderia deixar de ser, foi a convocação geral e muito trabalho para todos nós, até o JT sair às ruas com a manchete: “Uma bomba neste jornal”. Naquele momento era presumível imaginar que se tratava de terrorismo da extrema esquerda. Mas não era possível comprovar, o que só ocorreu anos depois. Vale reproduzir um trecho do livro Pedro e os lobos (Ava Editorial), de João Roberto Laque, que conta a história do militar e guerrilheiro urbano Pedro Lobo de Oliveira: “(…) Três da manhã do dia 20 de abril. Pedro Lobo e seus companheiros da esquerda armada estão a postos para mais um atentado. Dessa vez, o alvo é a sede do jornal O Estado de S.Paulo. Desde muito, a família Mesquita é odiada pelas esquerdas. Os proprietários do centenário matutino e do Jornal da Tarde conspiraram contra João Goulart ainda no início do seu governo e chegaram a passar o chapéu entre empresários, visando financiar o golpe que derrubaria João Goulart. E, para a afronta aos Mesquita, Pedro é um dos escalados: “‘A gente parou o carro próximo à entrada do jornal, um companheiro desceu e foi lá na entrada do prédio colocar a bomba, que tinha seis quilos de uma dinamite gelatinosa preta. Dali, o comando desceu para a Praça da Bandeira e cada um seguiu para sua casa.” A violenta explosão no prédio da rua Major Quedinho com a Martins Fontes, centro da cidade, arrebenta a porta de aço, destrói o saguão revestido de mármore, deixa ferido o porteiro do jornal, Mário José Rodrigues, e estilhaça os vidros das janelas de todos os prédios num raio de quinhentos metros”. Um carro explode Pois é... haveria outra bomba, anos depois, em 1983, quando as redações e toda a empresa já haviam se mudado para um novo e imenso prédio na Marginal do Tietê. Dessa bomba, felizmente, só fiquei sabendo no dia seguinte, e a cito apenas para lembrar como o Estadão foi alvo também de terrorismo da extrema direita. Sobre ela, reproduzo trecho do livro Memórias de uma guerra suja (Ed. Topbooks), dos jornalistas Marcelo Netto e Rogério Medeiros, com depoimento do delegado Claudio Guerra, integrante dos órgãos de repressão durante o regime militar: “(…) Um dos jornais mais críticos ao sistema era O Estado de S. Paulo. Perdigão e Vieira (os coronéis da linha dura Fredie Perdigão Pereira e Antonio Vieira) queriam fazer um atentado lá, para chamar atenção, fazer barulho, mas sem vítimas. Eu mesmo idealizei tudo. A bomba seria colocada do lado de fora do prédio do jornal, assim eu teria mais controle para não atingir ninguém. Foi no dia 14 de novembro de 1983. (…) Montei a bomba com um despertador como gatilho, guardei no porta-malas do carro e fui para o estacionamento do jornal O Estado de S.Paulo. Parei o Voyage com a traseira virada para o prédio. O prédio do jornal era grande. Ao lado, havia um viaduto na Marginal, onde eu fiquei esperando o momento da explosão. Tive o cuidado de preparar a bomba com o mesmo tipo de explosivo que o pessoal de Cuba usava, mas era para ficar caracterizado que a autoria era da esquerda. Ficamos observando para se ver se alguém encostaria no carro. Ninguém apareceu. Aí aconteceu a explosão, foi aquele fogaréu”. E assim foi. Haveria muito mais o que contar – a noite do AI-5, o confisco da edição com o editorial Instituições em frangalhos, último redigido pelo próprio doutor Julinho, os censores e as receitas publicadas nas matérias censuradas, as grandes coberturas como as da tragédia de Caraguatatuba e do incêndio no edifício Joelma, do congresso da UNE em Ibiúna... Longa história. Continuo gostando do velho jornalão (hoje menor, formato Berliner), com sua tradição, seus acertos e seus erros. Há quem não goste. Mas como negar a relevância de seu papel na história do País? Fico entre aqueles que o aplaudem. Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.
Card link Another linkBrasil precisa elevar o nível das avaliações educacionais
Para Alexandre Schneider, quando aumentamos a exigência, criamos um círculo virtuoso: as escolas se adaptam, os professores se capacitam
Alexandre Schneider, doutor em administração pública e governo, foi secretário municipal de Educação de São Paulo e é secretário estadual de Educação de Pernambuco Edição Scriptum A mais importante avaliação internacional de matemática e ciências acaba de revelar um quadro preocupante sobre a educação brasileira. O Trends in International Mathematics and Science Study (TIMSS) — que há mais de 20 anos avalia o desempenho de estudantes do 4º e 8º ano em diversos países — contou pela primeira vez com a participação do Brasil em 2023. Os resultados soaram como um alarme: ficamos entre as últimas posições. No 4º ano, o País ocupou o 64º lugar em matemática e o 61º em ciências, entre 66 nações. No 8º ano, o cenário não foi muito diferente: 45ª posição em matemática e 43ª em ciências, entre 47 países. Mais que lamentar esses resultados, precisamos entender por que chegamos a tal ponto e como podemos mudar esse cenário. Uma das respostas está na forma como avaliamos nossos estudantes. Compare duas questões de matemática. Em nossa avaliação nacional, o Saeb, um aluno típico encontra problemas como calcular quantos litros há numa caixa-d’água com três quartos de sua capacidade total de mil litros. Uma pergunta direta, que exige basicamente a aplicação de uma fórmula. No TIMSS, esse mesmo aluno depararia com um desafio mais instigante: calcular as novas dimensões de um jardim retangular cuja área precisa ser aumentada em 25%, mantendo a forma original. A diferença é gritante — enquanto um teste cobra a mera reprodução de conhecimento, o outro exige raciocínio, criatividade e aplicação prática. Em ciências, o contraste é ainda mais revelador. Enquanto pedimos a nossos estudantes que expliquem mecanicamente o processo de fotossíntese, o TIMSS os desafia a entender por que a água se comporta de maneira única ao congelar, relacionando o fenômeno a sua estrutura molecular. É a diferença entre memorizar e verdadeiramente compreender. As avaliações educacionais são mais que instrumentos de medição — são poderosas ferramentas de transformação. Redes públicas e escolas privadas organizam seus currículos e metodologias para responder às exigências dessas avaliações. Quando mantemos avaliações com baixo nível de complexidade, inadvertidamente sinalizamos que esse é o padrão aceitável de aprendizagem. Alguns argumentarão que elevar o nível das avaliações pode resultar em notas ainda mais baixas no curto prazo. Sim, é uma possibilidade real — e necessária. Resultados mais baixos inicialmente não seriam um fracasso, mas um retrato mais fidedigno de nossa realidade educacional. É preferível encarar essa verdade incômoda a nos contentarmos com uma falsa sensação de progresso. A história da educação nos mostra que os sistemas educacionais tendem a responder às expectativas que estabelecemos para eles. Quando definimos metas mais ousadas e elevamos o nível de exigência, criamos um círculo virtuoso: as escolas se adaptam, os professores se capacitam, e os alunos são desafiados a alcançar patamares mais altos. É como um atleta que progressivamente aumenta a intensidade de seus treinos para competir em níveis mais elevados. Elevar o nível de complexidade do Saeb não significa abandoná-lo, mas fazê-lo evoluir. Nossa educação precisa dessa progressão para formar jovens capazes de competir globalmente e encontrar soluções criativas para problemas complexos. A mudança exigirá preparo dos professores, adaptação das escolas e uma mudança de mentalidade. Mas o custo de não mudar é muito maior: continuarmos formando estudantes despreparados para os desafios de um mundo cada vez mais complexo. Os resultados do TIMSS são um mapa do caminho que precisamos percorrer. O primeiro passo é elevar a complexidade de nossas avaliações, mesmo que isso signifique enfrentar resultados inicialmente desconfortáveis. O futuro de nossa educação — e, consequentemente, de nosso País — depende dessa mudança corajosa e necessária.
Artigo publicado no jornal O Globo em 20 de dezembro de 2024
Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. Card link Another linkEntrega acima das expectativas
Para Luiz Alberto Machado, o custo social e político do primeiro ano de mandato de Javier Milei foi alto, mas o saldo para a economia é positivo
Luiz Alberto Machado, economista e colaborador do Espaço Democrático Edição Scriptum Em 21 de novembro de 2023, apenas dois dias depois das eleições presidenciais e antes, portanto, da posse de Javier Milei ocorrida em 10 de dezembro, publiquei neste mesmo Espaço Democrático o artigo A aposta dos argentinos, tomando por base algumas análises e comparações surgidas tão logo foram conhecidos os resultados das eleições. Voltei a abordar o assunto na reunião semanal do Espaço Democrático, alertando para o fato de que, ao contrário do que afirmava a maior parte das matérias sobre o presidente eleito da Argentina, e apesar de seu jeito histriônico, Javier Milei era mais preparado do que muitos imaginavam. Ousei afirmar também que acreditava que ele poderia fazer um bom governo, levando a uma melhora considerável da situação do país vizinho. Repeti a mesma afirmação em diversas entrevistas concedidas na época a diferentes redes de rádio e televisão e fui, aberta ou veladamente, bastante criticado por essa posição. Passado mais de um ano da posse de Milei, o que se constata é que ele vem conseguindo resultados acima das expectativas, embora haja um longo caminho a percorrer para que a Argentina supere os obstáculos ainda existentes. Um dos fatores favoráveis a Milei, desde o princípio, foi sua sinceridade, jogando claro com seus compatriotas sobre a gravidade do quadro econômico argentino e sobre os momentos difíceis que seriam enfrentados nos meses iniciais de seu governo, até que os primeiros resultados começassem a aparecer. Isso foi fundamental para que parte da sociedade, a princípio cética, passasse a dar crédito ao governo, à medida que percebia mudanças acentuadas na comparação com os governos de Alberto Fernández e de Cristina Kirchner. Depois de começar desvalorizando substancialmente a moeda nacional para eliminar o câmbio artificial, de cortar ministérios, de demitir 31 mil servidores, de extinguir renúncias fiscais e de reduzir em mais de 30% as despesas públicas, Milei passou a pôr em prática algumas das ideias divulgadas durante a campanha, sem contudo partir para a dolarização como previsto no livro Dolarización: una solución para la Argentina (Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Claridad, 2023), escrito por Nicolás Cachanosky e Emilio Ocampo, apontado na época como principal favorito para ocupar o Ministério da Economia. Com o apoio do Fundo Monetário Internacional, que aceitou a renegociação da dívida e despejou dinheiro novo, a política econômica começa a produzir resultados e sinalizar para o início da virada. Tentando negociar um novo empréstimo do FMI, para o que conta com o apoio do presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, a política econômica de Milei tem recebido elogios do Fundo por estar conseguindo colocar ordem no caos que caracterizou o país ao longo deste século. Julie Kozack, porta-voz do FMI, afirmou que "durante o último ano as autoridades argentinas vêm implementando seu programa de estabilização econômica e têm conseguido resultados impressionantes, que incluem uma redução considerável da inflação, superávit fiscal e uma melhor cobertura das reservas internacionais". A inflação, que atingira 25,5% ao mês na sua posse, caiu para 2,4% em novembro e o dólar paralelo, chamado de "blue" cada vez mais se aproxima do câmbio oficial. Apesar desses avanços, a previsão é de que a inflação anual feche em 140%, bem abaixo dos 211% registrados em 2023. Evidentemente, segue sendo um número muito alto, mas a redução vem sendo obtida sem congelamentos ou tabelamentos de triste lembrança para nós brasileiros. O FMI prevê para 2025 uma inflação de 45%, o que se deve em grande parte à queda do gasto público primário, que não inclui os juros, de 35,3% em 2023 para 30,2% este ano. Como reconhecera Milei desde o início de seu governo, o preço social e político é alto. A pobreza extrema alcançou cerca de 50% da população, o consumo caiu, muitas empresas quebraram e o desemprego está elevado, registrando 6,9%, embora tenha caído 0,7% ponto percentual em relação ao trimestre anterior. Milei entra em seu segundo ano de mandato com um saldo positivo. Mesmo pessoas que não votaram nele reconhecem a importância da estabilidade e estão dispostas a dar um crédito por enxergarem algo diferente do que testemunharam nos últimos anos. Milei começa agora a ser reconhecido no exterior como alguém capaz de reordenar o caos. Esse fortalecimento político interno e externo será essencial para que ele aprofunde o ajuste em 2025, com cortes significativos nos impostos, sem comprometer a saúde das contas públicas. Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.
Card link Another linkEspaço Democrático faz retrospectiva de 2024 e traça perspectivas para 2025
Mesa redonda na reunião semanal da fundação do PSD debateu fatos que foram destaque no Brasil e no mundo
[caption id="attachment_39142" align="aligncenter" width="560"] Reunião semanal de colaboradores do Espaço Democrático[/caption]
Redação Scriptum
Consultores e colaboradores do Espaço Democrático – a fundação para estudos e formação política do PSD – fizeram uma mesa-redonda de análise dos eventos mais importantes de 2024 e das perspectivas para o Brasil e o mundo em 2025. Os debates do terceiro encontro semanal de dezembro tiveram a participação do superintendente da fundação, João Francisco Aprá, dos economistas Luiz Alberto Machado e Roberto Macedo, do advogado Roberto Ordine, do sociólogo Tulio Kahn, dos cientistas políticos Rubens Figueiredo e Rogério Schmitt, do gestor público Januario Montone, do médico sanitarista e ambientalista Eduardo Jorge, da secretária do PSD Mulher nacional, Ivani Boscolo, e dos jornalistas Eduardo Mattos e Sérgio Rondino, coordenador de comunicação do Espaço Democrático.
Gargalos da economia
Luiz Alberto Machado e Roberto Macedo chamaram a atenção para as grandes pressões que a economia brasileira sofrerá no próximo ano, especialmente em razão do viés de alta dos gastos públicos.
“O presidente Lula acredita que gastar é governar, mas é necessário conter a escalada”, disse Machado. Ele apontou que o Brasil deve crescer entre 3,5% e 4% em 2024, contrariando as previsões mais pessimistas feitas no início do ano, “mas a sustentabilidade deste crescimento é a grande incógnita para o próximo ano”. Para o economista, “a combinação de inflação, juro alto e câmbio é uma ameaça difícil de contornar”.
Macedo destacou que muitas empresas estão recuando em seus planos de investimento por causa do juro alto. “E o Brasil ainda pode enfrentar mais problemas com a posse de Donald Trump nos Estados Unidos, especialmente com a ameaça de aumento de tarifas de importação dos nossos produtos”.
Roberto Ordine, presidente da Associação Comercial de São Paulo, relatou que o empresariado está assustado: “Há muita intranquilidade e quem tem dinheiro está tirando do País, um movimento que é acompanhado pelo capital especulativo”, afirmou. Ele citou o que considera um agravante neste quadro: as declarações infelizes do presidente Lula sobre a economia. “São populismo”, disse.
O ano que está terminando, porém, trouxe uma surpresa para a economia da América Latina, segundo Machado: a gestão de Javier Milei na Argentina. “Ele entregou muito e teve o mérito de não ter mentido”, afirmou o economista. “Avisou que o primeiro ano seria muito difícil e o resultado macroeconômico é inegavelmente ótimo”.
Crime digital em alta
O sociólogo Tulio Kahn, especialista em segurança pública, destacou a tendência de crescimento dos crimes digitais ao longo de 2024, ao mesmo tempo em que, com a melhora da economia, os crimes violentos de rua continuaram caindo. “O criminoso é racional: sabe que o estelionato é mais compensador, pois a punição é menor e o butim, maior”, afirmou.
Kahn destacou outros dois importantes fenômenos registrados em 2024 na área da segurança pública. O primeiro deles é que o crescimento rápido e desordenado da Amazônia Legal, formada por 772 municípios – localizados nos Estados do Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins e parte do Maranhão – já provoca o aumento da criminalidade da região, onde é grande a atividade que promove o desmatamento, como a mineração legal e ilegal, as queimadas para aumentar a área de plantio e de pecuária e a extração legal e ilegal de madeira. O outro é o crescimento da letalidade policial em São Paulo aos níveis pré-pandemia de Covid-19.
O plano do golpe e as eleições
Os cientistas políticos Rubens Figueiredo e Rogério Schmitt analisaram a conjuntura política brasileira já com o pano de fundo da próxima eleição presidencial.
Figueiredo, que definiu o plano de golpe descoberto pela Polícia Federal como iniciativa digna “do Agente 86 ou do Inspetor Clouseau”, personagens trapalhões e cômicos da televisão e do cinema, acredita que o episódio terá impacto na eleição de 2026. “A queda na intenção de voto de Jair Bolsonaro já está aparecendo nas pesquisas”, disse. Os novos lances do embate quase permanente entre os poderes também foi um tema destacado pelo cientista político. “No Brasil, Executivo Legislativo e Judiciário se movimentam para aumentar o próprio poder”, apontou. “Por isso sou pouco otimista em relação a 2025”.
Avaliando já o cenário da próxima eleição, Schmitt falou sobre a dificuldade da oposição ao petismo. “Qualquer candidato que dependa da herança política do Bolsonaro terá de se reposicionar diante dos últimos eventos”. Do lado governista, ele aposta que a meta de Lula será perseguir o grau de investimento para o Brasil. Schmitt lembrou da importância da troca de comando na Câmara e no Senado para a disputa de 2026. E não descartou uma reforma ministerial já com este horizonte eleitoral em vista.
Vacinas e dengue
2024 foi o ano em que O Brasil venceu a desinformação contra a vacinação. “Mesmo com toda a campanha anti-vacina do governo Bolsonaro, conseguimos recuperar as metas e adquirir, por exemplo, a certificação de área livre do sarampo, que havia sido perdida em 2019, enfatizou Januario Montone, gestor público na área de saúde. “Tivemos uma grande vitória das bases do SUS: a cobertura vacinal para BCG, tríplice viral e pólio atingiu mais de 90%”.
Mas nem tudo funcionou bem. Ele apontou o avanço da dengue, decorrente da falta de prevenção no ano anterior. “Todos sabemos que não dá para combater o mosquito depois que ele voa”, disse. “Foram cerca de 6,5 milhões de casos”. A esperança, afirmou, é a vacina que foi desenvolvida pelo Instituto Butantã, em São Paulo, e que já está sendo analisada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). “É a primeira do mundo, já com eficiência comprovada, e estará disponível em 2026”.
Mais espaço à mulher
A secretaria do PSD Mulher nacional, Ivani Boscolo, chamou a atenção para o intenso trabalho de formação política que o núcleo feminino do partido vem fazendo, fruto de uma parceria com o Insper. “Já fizemos eventos em vinte e uma capitais, cada um deles com grupos entre 30 e 90 mulheres”, lembrou. Os professores são do Insper e só podem participar do curso mulheres que sejam filiadas ao PSD.
O empenho do polo feminino é para aumentar a participação feminina na política. Em 2024, o PSD elegeu 102 prefeitas, 125 vice-prefeitas e 1.141 vereadoras em todo o País.
O planeta pede socorro
Médico sanitarista e ambientalista, Eduardo Jorge falou sobre a emergência climática: em 2025 este continuará sendo um dos principais temas no mundo e em especial no Brasil, que sediará a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, a COP 30.
Jorge lembrou que o Acordo de Paris previa metas para as emissões de forma que a temperatura média não subisse mais que dois graus em relação à média de meados do século 19. “Neste ano já temos aumento de 1,5 grau”, disse. Segundo ele, todas as iniciativas mostram que a humanidade caminha no rumo certo, mas em ritmo inadequado.
Como pontos positivos, lembrou o avanço que o Brasil teve na redução do desmatamento este ano, 20%, mas apontou que se deve mais à fiscalização, que cresceu, que em uma opção pela preservação. E destacou que a transição energética brasileira vem avançando: hoje, 25% de nossa energia é eólica e solar.