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Escrever à mão ajuda no aprendizado, aponta estudo

Estudo norueguês revela que a prática aumenta a atividade cerebral em áreas importantes

  [caption id="attachment_39605" align="aligncenter" width="560"] Estudo diz que aumenta o número de crianças com dificuldades para escrever de forma rápida e legível.[/caption]     Texto Estação do Autor com DW Edição Scriptum   Na rotina digital, escrever à mão com papel e caneta pode parecer cada vez mais incomum. Mas o "antigo método" ainda traz vantagens. Segundo um estudo norueguês de 2024, escrever à mão aumenta a atividade cerebral nas áreas importantes para o aprendizado. Artigo assinado por Alexander Freund para a DW analisa o uso da escrita à mão, que está entre as técnicas culturais mais importantes da evolução humana, e a diminuição dessa prática diante de um mundo cada vez mais tecnológico. A comunicação por meio de canetas e papel tem se tornado rara, enquanto a comunicação por e-mails, mensagens de texto ou, sobretudo entre os mais jovens, por mensagens de voz, se estabelece como regra. Freund explica que desde crianças aprendemos a escrever à mão da forma mais correta e ordenada possível. Embora todas as crianças aprendam as mesmas letras, a escrita de cada um é sempre muito particular. Durante a adolescência e o início da fase adulta, nossa caligrafia costuma mudar significativamente, mas depois disso ela permanece praticamente a mesma para a maioria das pessoas. A Associação Alemã de Educação e Formação vem detectando há anos o declínio das habilidades de escrita. De acordo com o Estudo sobre o desenvolvimento, os problemas e as intervenções na questão da caligrafia (STEP 2022) aumenta o número de crianças com dificuldades para escrever de forma rápida e legível. Há milhares de anos as informações eram esculpidas em argila ou pedra ou escritas com tinta em folhas de palmeira, pergaminho ou papiro. Ao contrário da fala, a escrita antigamente era reservada apenas a uma minoria: a nobreza, os intelectuais e os comerciantes. O fato de tantas pessoas saberem ler e escrever hoje em dia só mudou com a introdução da escolaridade obrigatória no século 20. Em 1820, apenas 12% da população mundial sabia ler e escrever. Hoje, a proporção se inverteu. Segundo a Unesco, apenas 13% das pessoas no mundo não sabem ler nem escrever. Metade dos aproximadamente 765 milhões de analfabetos vive no Sul da Ásia e mais de um quarto na África Subsaariana.

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Guanabara, o efêmero Estado criado por JK e extinto pela ditadura militar

Há 50 anos o Brasil assistiu à unificação de dois Estados; dois governadores entregaram o cargo a um  

Ricardo Westin, da Agência Senado

Edição Scriptum

   

Há 50 anos, em 15 de março de 1975, o Brasil assistiu a uma troca de poder até hoje única em sua história política, com dois governadores simultaneamente entregando os respectivos cargos a um mesmo governador eleito.

Na cerimônia, o mandatário do Rio de Janeiro, Raimundo Padilha (Arena), e o da Guanabara, Chagas Freitas (MDB), transmitiram o poder a Faria Lima (Arena).

Com a posse, os Estados do Rio de Janeiro e da Guanabara foram unificados e Faria Lima se tornou o governador do novo Estado do Rio de Janeiro.

Foi o fim da efêmera Guanabara, estado criado no governo Juscelino Kubitschek apenas 15 anos antes e extinto pela ditadura militar. Na prática, tratava-se de uma cidade-estado, pois era composta apenas da cidade do Rio de Janeiro.

A Guanabara surgiu em 1960, quando Brasília foi inaugurada e a cidade do Rio deixou de ser o Distrito Federal. Em vez de ser integrada ao Estado do Rio de Janeiro, no qual estava encravada, a cidade se transformou num estado à parte.

Ocupando cerca de 1.350 quilômetros quadrados, a Guanabara era o menor Estado do Brasil. Como comparação, o atual Distrito Federal tem quatro vezes essa área.

Documentos da época guardados no Arquivo do Senado, em Brasília, mostram que a fusão proposta pela ditadura foi criticada por praticamente toda a bancada de ambos os Estados. Dos seis senadores cariocas (ou guanabarinos) e fluminenses, cinco combateram até o fim o projeto de lei apresentado ao Congresso Nacional pelo general Ernesto Geisel, o quarto presidente do regime militar.

— É de perfeita irracionalidade, de absoluta falta de fundamento lógico, de flagrante inoportunidade a tese que propõe a fusão dos Estados — avaliou Danton Jobim (MDB-GB), o senador mais aguerrido na luta contra o desaparecimento da cidade-estado.

— A fusão, no meu entender, significaria o colapso da Guanabara e o aniquilamento a médio prazo da província fluminense — prognosticou o senador Benjamin Farah (MDB-GB).

— É preciso mostrar a apreensão de cariocas e fluminenses quando, à nossa revelia, decidem os destinos de nossos estados — afirmou o senador Amaral Peixoto (MDB-RJ).

  [caption id="attachment_39598" align="aligncenter" width="560"] Em março de 1975, Raymundo Padilha, governador do Rio de Janeiro, e Chagas Freitas, da Guanabara, transmitem o poder a Faria Lima, governador do novo estado do Rio de Janeiro[/caption]

Entre os senadores dos dois Estados, o único a defender o fim da Guanabara foi Vasconcelos Torres (Arena-RJ), que afirmou:

— Acho até que a fusão já existe. Na fronteira dos dois Estados, em Vigário Geral, por exemplo, muita gente não sabe se está no Estado do Rio de Janeiro ou na Guanabara. Falta apenas a fusão ser consubstanciada na ordem administrativa.

O MDB, partido da oposição, não tinha força suficiente no Congresso Nacional para deter o rolo compressor do governo, que contava com o apoio da Arena, partido da ditadura. Por essa razão, o projeto de lei prevendo a incorporação da Guanabara ao Rio de Janeiro foi aprovado sem dificuldade.

Diante das críticas do MDB, o senador governista Virgílio Távora (Arena-CE) recomendou aos colegas oposicionistas que seguissem as regras do jogo legislativo e tentassem mudar o projeto do governo por meio de emendas. O senador Amaral Peixoto respondeu:

— Vamos apresentar as emendas, mas confesso a Vossa Excelência que estamos com muito receio do destino que terão, porque temos a experiência aqui no Congresso de que elas geralmente vão para a vala comum.

A proposta foi apresentada em 4 de junho de 1974, avalizada pelos senadores e deputados num piscar de olhos e assinada pelo presidente Geisel em 1º de julho.

Quando a lei foi posta em prática, em março de 1975, a capital do Estado do Rio de Janeiro mudou. A sede do governo fluminense deixou de ser Niterói, rebaixada a município comum, e passou a ser a cidade do Rio.

Os debates no Senado começaram meses antes da chegada do projeto de lei ao Congresso, assim que os jornais passaram a noticiar que a ditadura tinha planos de acabar com a Guanabara.

Os senadores da Arena apontaram motivos econômicos para a fusão. De acordo com eles, a indústria da Guanabara não tinha mais como se expandir em razão do pequeno território carioca. O problema se resolveria, então, acabando com a divisa entre os dois Estados.

Segundo a edição de 1963 da Enciclopédia Delta Júnior, muito popular na época, a Guanabara, mesmo sendo o menor Estado do Brasil, tinha o segundo maior parque industrial, atrás apenas do Estado de São Paulo.

As estatísticas oficiais do governo carioca mostravam que, em 1973, São Paulo respondeu por quase 50% da arrecadação nacional. A Guanabara, por perto de 25% — praticamente o mesmo valor de todos os demais estados juntos.

Os arenistas garantiram que também os fluminenses se beneficiariam da fusão. O argumento era que o Estado do Rio de Janeiro, considerado pobre por ter a economia baseada na agricultura, passaria a receber parte da riqueza produzida pela cidade do Rio.

— A pequena cidade-estado é uma cabeça sem corpo, assim como o Estado do Rio de Janeiro é um corpo sem cabeça — comparou o senador fluminense Vasconcelos Torres. — As duas economias reunidas representarão uma situação melhor para a Guanabara, para o Estado do Rio de Janeiro e para o Brasil. Se olharmos de ângulos estritamente pessoais e regionalistas, jamais poderemos encarar o Brasil no seu conjunto e a Guanabara continuará como uma espécie de Mônaco, com a geografia sendo fluminense e a história também sendo fluminense.

Na defesa da fusão, os porta-vozes da ditadura ainda recorreram a argumentos históricos. Eles lembraram que a cidade do Rio pertenceu à capitania do Rio de Janeiro nos tempos da Colônia e à província do Rio de Janeiro nos primórdios do Império.

Foi em 1834 que a cidade, por ser a capital imperial, foi separada e ganhou o status de Município Neutro (ou Município da Corte). Após a queda da Monarquia, trocou-se o título do Rio para o de Distrito Federal.

A fusão nada mais seria, portanto, que a volta a uma realidade que já existiu.

  [caption id="attachment_39599" align="aligncenter" width="560"] O governador da Guanabara, Chagas Freitas, desce de helicóptero pertencente ao estado[/caption]  

Na visão dos senadores do MDB, todos os argumentos dos colegas da Arena eram balela. Eles entendiam que, por trás da fusão, a verdadeira intenção dos militares era enfraquecer o partido oposicionista.

Na época do projeto de lei, o único Estado que o MDB governava era justamente a Guanabara. Além disso, todos os senadores do pequeno Estado e a maioria dos deputados federais e estaduais pertenciam à oposição.

O senador carioca Danton Jobim lembrou que, quando a ditadura autorizou o MDB a chefiar a Guanabara, com Chagas Freitas, eleito indiretamente pelos deputados estaduais em 1971, muitos arenistas advertiram que se tratava de um tiro no pé. Segundo Jobim, não havia motivo para preocupação porque o governador emedebista jamais se atreveria a entrar em confronto com os generais:

— O MDB da Guanabara reconheceu desde logo que o Estado não poderia fugir à integração nos planos adotados pelo governo federal. Uma atitude diferente seria uma luta inglória e equivaleria fatalmente ao fracasso administrativo. Por mais oposicionista que seja o povo do nosso Estado, ele não perdoará jamais que um oposicionista no Poder Executivo, eleito para governar e administrar, cometa o erro e o crime de sacrificar a eficiência de sua gestão e condená-la à estagnação e à esterilidade apenas para ostentar seu radicalismo oposicionista.

De acordo com o senador fluminense Amaral Peixoto, o MDB também ia relativamente bem no Estado da Guanabara:

— No Estado do Rio, o número de deputados federais do MDB é quase igual ao da Arena. Na Guanabara, é muito grande. Esses dois Estados reunidos num só, em vez de mandarem 44 deputados para a Câmara, mandarão somente 31. Portanto, o desfalque da futura bancada do MDB vai ser muito grande com essa fusão. É o aspecto político que não posso deixar de mostrar.

O senador Nelson Carneiro (MDB-GB) resumiu:

— É o poder ditatorial agindo para que o MDB seja apenas um partido parlamentar, sem possibilidade de assumir as funções do Executivo [nos Estados]. Essa é a realidade a que não se pode fugir.

Para defender seu ponto de vista, os críticos da fusão também mergulharam na história. Eles lembraram que as Constituições de 1891, 1934 e 1946 determinaram com todas as letras que, uma vez transferida a capital brasileira para o centro do País, o velho Distrito Federal se transformaria num Estado. A única Carta que não tratou da questão foi a de 1937. A Constituição de 1946, aliás, estabeleceu que o novo Estado se chamaria Guanabara. O nome se deve à baía que o banha.

— Todas as Cartas constitucionais federais que tivemos desde 1891... — iniciou Danton Jobim, sendo logo interrompido.

— Citaria também todas as Cartas do Estado do Rio de Janeiro, porque fui constituinte fluminense — interveio o governista Vasconcelos Torres. — E nelas constava o seguinte dispositivo: efetivada a mudança da capital, o Estado do Rio de Janeiro reivindicará a área que até 1834 lhe pertencera.

Combatendo o argumento de que a cidade do Rio, no passado, fez parte da capitania e da província do Rio de Janeiro, Danton Jobim comparou:

— Seria então o caso de promover a fusão de São Paulo com o Paraná, que foi a comarca [paulista] de Curitiba até os meados do século passado? Ou devolver a comarca do Rio Negro [atual Amazonas] ao Grão-Pará?

Vasconcelos Torres ironizou:

— Vossa Excelência está se revelando um bom pesquisador.

Danton Jobim devolveu:

— Todas essas pesquisas me foram oferecidas por um grupo de pesquisadores, de professores de história cariocas que pertencem ao Movimento Libertador da Terra Carioca e estão profundamente comovidos com a iminência da fusão.

Ainda segundo os senadores do MDB, era falacioso o argumento de que a industrialização da Guanabara estava comprometida por causa do pequeno território. Danton Jobim novamente pediu a palavra:

— A área geográfica da Guanabara é realmente pequena, mas até há bem pouco tempo dois terços do seu território eram economicamente desaproveitados. Só muito recentemente começou-se a tratar da exploração desses territórios, atraindo para ali grandes indústrias. Particularmente no governo atual, do sr. Chagas Freitas, planejou-se com muito cuidado o desenvolvimento dessa região, a região oeste do Estado, onde poderíamos incluir Jacarepaguá. Os frutos obtidos são extraordinários, mas estamos muito longe ainda de cobrir toda essa área quanto ao seu aproveitamento.

Igualmente falacioso seria o argumento de que a fusão era uma medida imprescindível para eliminar ou minimizar a pobreza do Estado do Rio de Janeiro. A oposição disse que, para efetivamente ajudar o grande Estado vizinho a prosperar, a cidade do Rio de Janeiro precisaria manter-se separada e incentivando sua própria indústria.

Danton Jobim afirmou:

— Estamos encravados na velha província. Somos circundados não propriamente por vizinhos, mas por irmãos que se beneficiam da nossa prosperidade, assim como nos beneficiamos dessa proximidade geográfica. Somos o seu grande mercado consumidor. Somos a sua rede hospitalar na zona periférica da Guanabara. Grande parte dos jovens da Baixada [Fluminense] frequenta a nossa rede de ensino. Nossa presença numa fronteira sem barreiras incentiva-lhe o progresso, absorve-lhe o excesso de mão de obra, cria cidades novas e opulenta as velhas. O intercâmbio econômico se faz sem quaisquer obstáculos.

  [caption id="attachment_39600" align="aligncenter" width="378"] O senador Danton Jobim (à esq.) se posicionou contra o projeto do presidente Ernesto Geisel[/caption]

Os senadores do MDB argumentaram que a Guanabara seria prejudicada financeiramente pela fusão. De acordo com eles, os tributos que a cidade-estado arrecadava, apesar de sua prosperidade econômica, não eram suficientes para fazer frente às obras de infraestrutura em curso e a situação ficaria ainda pior se ela fosse absorvida pelo Estado do Rio de Janeiro, já que seria forçada por lei a destinar ao vizinho uma boa parte de sua arrecadação.

Seguindo esse raciocínio, o senador carioca Benjamin Farah lembrou que, em 1972, a receita tributária do governo carioca fora de 3,2 bilhões de cruzeiros, sendo 1,8 bilhão de cruzeiros destinados ao pagamento dos funcionários públicos estaduais, e que a arrecadação do governo fluminense somara apenas 1,4 bilhão de cruzeiros, dos quais 900 milhões de cruzeiros destinados ao funcionalismo. Ele disse:

— Verificamos aí que, na hipótese da fusão, não haveria como promover a distribuição equitativa de recursos, uma vez que a Guanabara seria forçada a pulverizar sua receita no atendimento administrativo do interior fluminense. Se atualmente a receita carioca não atende ainda às suas necessidades de investimento, obrigando o Estado a recorrer a empréstimos externos, o que dizer então depois da unificação? A ideia é impraticável e inoportuna.

Farah tratou do ordenado do funcionalismo público:

— O da Guanabara ganha mais que o fluminense. A fusão obrigaria o estabelecimento de uma paridade, que certamente teria por base os níveis e padrões cariocas. Se a receita do Estado do Rio atualmente não tem condições de elevar o vencimento dos seus servidores, não o terá também depois da fusão. Teria que recorrer ao Tesouro da Guanabara, que seria forçado a desviar suas verbas para o pagamento dos servidores e não contaria com recursos para a execução de obras.

Os adversários da fusão também citaram as dificuldades técnicas que decorreriam da unificação administrativa e judiciária dos dois Estados.

O senador carioca Nelson Carneiro citou a unificação dos dois Tribunais de Justiça como problemática:

— Serão 53 desembargadores, dos quais 36 da Guanabara e 17 do estado do Rio. Não será um Tribunal de Justiça, mas uma “Assembleia Judiciária”, maior do que a Assembleia Legislativa de quase todos os Estados do País. Quem vive no foro vê a impossibilidade do funcionamento de um tribunal dessa extensão. E o que se fará, será com o sacrifício dos novos ou dos velhos desembargadores? Será com o desestímulo para os que iniciam a carreira ou para os que estão na carreira?

Embora não pertencesse a nenhum dos dois Estados e fosse filiado ao partido governista, o senador Luiz Cavalcante (Arena-AL) entrou no debate para apontar um possível inconveniente:

— Nessa anunciada fusão, o mais desfavorecido será o Estado do Rio de Janeiro. Naturalmente que a imensa metrópole carioca absorverá a quase totalidade das atenções do governador do Estado resultante. A pujante imprensa guanabarina não gritará decerto pelas necessidades de Magé, Cordeiro e Nova Friburgo [municípios fluminenses]. Continuará, isto sim, gritando pelos problemas de Copacabana, do Méier, de Madureira, do Grajaú e por aí afora. Será um Estado macrocéfalo, aleijado, com a cabeça imensamente desproporcional ao corpo.

  [caption id="attachment_39601" align="aligncenter" width="524"] O governador da Guanabara, Chagas Freitas, inaugura ala do Hospital Souza Aguiar, no Rio de Janeiro, em 1974[/caption]  

Os adversários do plano da ditadura mencionaram que os dois Estados tinham culturas diferentes e que as suas populações não desejavam a unificação.

O senador Danton Jobim lembrou que até o fim Império tanto os moradores da cidade do Rio quanto os da província do Rio de Janeiro eram chamados indistintamente de “fluminenses” (flumen significa “rio” em latim) e que isso mudou à medida que as respectivas particularidades foram se desenvolvendo:

— O termo carioca é antigo, mas somente obteve foros de cidadania e passou da linguagem popular para a erudita no período republicano, quando o Município Neutro se converteu em Distrito Federal. A comunidade carioca e a fluminense foram irmãs xifópagas que se separaram através de uma operação cirúrgica na primeira metade do século passado. Com o passar do tempo, cada uma dessas comunidades oriundas do mesmo tronco adquiriu fisionomia própria, peculiaridades, necessidades e interesses que já não cabem numa só juridicidade político-administrativa.

Os senadores do MDB sugeriram que, para verificar a adesão popular à fusão, o governo convocasse os eleitores cariocas e fluminenses para um plebiscito. Os generais, porém, recusaram-se a fazê-lo.

— Num país como o nosso, em que ainda não se baniu o sistema democrático representativo [parlamentar], as populações desses Estados e os seus legítimos governantes e representantes nas duas Casas do Parlamento e nas Assembleias Legislativas devem ter uma palavra a dar sobre o assunto — afirmou Danton Jobim.

— O problema da redivisão territorial do País nada tem a ver com a democracia — retrucou o senador José Lindoso (Arena-AM). — Este governo não é surdo a contribuições da oposição, mas quer crítica responsável. Se a redivisão territorial se impuser, ela será feita na base racional, e não sob o imperativo emocional deste ou daquele Estado; não no respeito de tradicionalismos anacrônicos e emperradores do desenvolvimento, mas dentro da perspectiva de acelerar este desenvolvimento e construir um país na linha da revolução [ditadura].

Não se sabe se, de fato, os fluminenses eram contrários à fusão. Os cariocas, sim, eram. Isso se deduz do fato de que foi apenas com a criação da Guanabara que os governantes e os eleitores da cidade passaram a gozar de verdadeira liberdade política.

Enquanto a cidade do Rio de Janeiro ostentou o status de Distrito Federal, seus prefeitos foram indicados pelos presidentes da República e aprovados pelo Senado e não passaram longos períodos no cargo. Além disso, parte das decisões dos vereadores cariocas precisava do crivo dos senadores.

— Foi a partir de sua autonomia administrativa e política que o povo carioca viu equacionados seus problemas mais vitais — discursou Danton Jobim. — Éramos antes pupilos privilegiados do governo federal, que nos custeava a Justiça, a política e os bombeiros. Nossos prefeitos nomeados cuidavam apenas de problemas edílicos. O governo federal nos presenteava esporadicamente com obras urbanas admiráveis e suntuosas. O sertão carioca [zona Oeste] permaneceu esquecido, o que hoje felizmente já não acontece. Quanto ao governo Chagas Freitas, justiça é reconhecer que enfrentou os problemas com visão de estadista, dando ênfase à Guanabara como Estado, e não como município.

Chegou-se a dizer que os maiores interessados na incorporação do estado da Guanabara ao Estado do Rio de Janeiro eram os industriais cariocas, uma vez que eles lucrariam mais se passassem a pagar os tributos cobrados pelo governo fluminense, provavelmente mais baixos que os recolhidos pelo governo carioca.

— O único lado mau da fusão é a interveniência esdrúxula da Federação das Indústrias do Estado da Guanabara — criticou o senador governista Vasconcelos Torres.

— Nisto estou de pleno acordo com Vossa Excelência — concordou o oposicionista Nelson Carneiro.

— Eles vêm polarizando os seus interesses relativamente à política tributária, à questão dos impostos ou algo que o valha. Vem essa federação, e isso é o que me contrista um pouco, com essas matérias pagas, a defender o interesse pessoal de alguns comerciantes e industriais que não estão olhando para o Brasil, e sim para a sua situação — continuou Vasconcelos Torres.

O senador fluminense Amaral Peixoto citou a inauguração da Ponte Rio-Niterói, realizada em 4 de março de 1974, exatos três meses antes de o governo remeter o projeto da fusão ao Congresso. A cerimônia foi conduzida pelo presidente Emílio Garrastazu Médici, em seus últimos dias de governo. Em carro aberto, o ditador partiu do Rio, onde cumprimentou o governador da Guanabara, e chegou a Niterói, onde saudou o governador do Rio de Janeiro. Amaral Peixoto disse:

— Alguns dos argumentos que têm sido invocados para essa fusão são ridículos. Outros, de má-fé. Chega-se neste momento a falar na fusão por causa da ponte. É ideia antiga ligar através de um túnel no Canal da Mancha a França e o Reino Unido. Pergunto: será que estão cogitando de fazer a fusão dos dois velhos países? A Europa foi ligada à Ásia através de uma ponte sobre o Bósforo. Alguém cogitou da fusão? A ponte é uma grande obra, um grande melhoramento, mas não justifica a fusão.

Como última cartada, os senadores contrários à fusão dos Estados argumentaram que o projeto de lei contrariava frontalmente a Constituição, motivo pelo qual deveria ser logo rejeitado pelo Congresso Nacional. Danton Jobim afirmou:

— O que devemos lembrar neste momento é que a Constituição que deu ao País a revolução de 1964 inscreveu o princípio federativo como dogma político, não permitindo sequer que numa revisão constitucional apresentássemos qualquer emenda que ferisse o sistema federativo e o regime republicano. Mas o fato é que a Federação vem recebendo sérios golpes ultimamente, e um dos maiores é este da fusão sem consulta prévia às populações interessadas.

Os argumentos da oposição de nada adiantaram. A fusão foi aprovada pelo Congresso Nacional tal qual o general Geisel desejava.

Houve também a fusão das duas bancadas no Senado, o que fez com que inicialmente o novo Estado do Rio de Janeiro contasse com seis representantes. Foi apenas em 1983 que passou a ter os três senadores regulamentares.

A historiadora Marieta de Moraes Ferreira, que é professora emérita da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e estudiosa da fusão, avalia que não é verdadeiro o argumento de que a Guanabara foi extinta com o intuito prejudicar o MDB:

— O MDB da Guanabara, naquele momento, não fazia nenhuma oposição consistente ao governo federal, ao contrário do MDB de São Paulo, por exemplo. O emedebista Chagas Freitas, que foi o último governador da Guanabara, era conivente com a ditadura e fez declarações a respeito da fusão muito vagas e nada incisivas.

De acordo com ela, a unificação dos Estados produziu efeitos positivos em termos de desenvolvimento econômico, mas isso acabou sendo ofuscado pela forma como o regime militar a executou:

— O processo foi feito de forma autoritária, como um ato de força do governo, que não permitiu discussões aprofundadas nem ouviu as populações interessadas. A fusão nasceu com esse pecado original que acabou contaminando todo o processo.

A historiadora aponta que há muita gente que atribui as atuais mazelas políticas e sociais da capital e do Estado à fusão feita 50 anos atrás, mas avalia que essa também é uma interpretação equivocada:

— Defende-se até mesmo a “desfusão” como solução. Isso é uma bobagem. É preciso olhar a história com mais cuidado para identificar a raiz dos problemas. Um dos desafios atuais é a escassez de políticos verdadeiramente comprometidos com os problemas do Estado e da capital, e isso tem origem, na realidade, no golpe de 1964. A ditadura foi particularmente dura com os políticos da Guanabara. Entre os cassados, por exemplo, figuraram Leonel Brizola e Carlos Lacerda. Esse golpe contra a Guanabara barrou o surgimento de novos grandes líderes. Foi um profundo esvaziamento político, que permaneceu mesmo depois da fusão.

[caption id="attachment_39602" align="aligncenter" width="640"] Chagas Freitas, o último governador da Guanabara, visita as obras do Viaduto Paulo de Frontin em 1974[/caption]

O cientista político Christian Lynch, pesquisador da Fundação Casa de Rui Barbosa, professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) — que já se chamou Universidade do Estado da Guanabara (UEG) — e organizador do livro Rio 2º Distrito Federal: Diagnóstico da Crise Estadual e Defesa da Federalização (Editora Jaguatirica), faz uma interpretação distinta. Segundo ele, a ditadura acabou com a Guanabara para que a cidade do Rio de Janeiro deixasse de ocupar o papel de capital paralela do Brasil que vinha ocupando até então.

Ele lembra que uma parte considerável da máquina estatal continuava baseada no Rio de Janeiro mesmo passados mais de dez anos da transferência para Brasília. O famigerado Ato Institucional nº 5 (AI-5), por exemplo, foi assinado pelo presidente Arthur da Costa e Silva no Palácio Laranjeiras. No Rio, os deputados e senadores davam entrevistas à imprensa nos Palácios Tiradentes e Monroe, respectivamente as antigas sedes da Câmara e do Senado. As embaixadas continuavam funcionando na Guanabara.

— A ditadura tinha uma visão de capital ainda mais burocrática e autoritária que a de Juscelino Kubitschek. A capital deveria estar no centro geográfico do País, e não no centro demográfico, porque a alta concentração populacional era vista como um perigo para os governantes em razão de possíveis protestos e sublevações populares. De fato, as grandes manifestações de rua contra a ditadura ocorreram em 1968, no Rio de Janeiro.

De acordo com Lynch, foi com o intuito de apagar a memória de capital do Rio de Janeiro e enfim consolidar Brasília que o general Geisel demoliu o Palácio Monroe e transferiu o Palácio Tiradentes para a Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro e o Palácio Laranjeiras para o governo fluminense.

Além disso, segundo ele, os militares que chegaram ao poder com o golpe de 1964 haviam sido os rebeldes tenentistas da década de 1920 e na época da ditadura ainda tinham más recordações da Revolução Constitucionalista de 1932, em que o Estado de São Paulo tentou derrubar o governo de Getúlio Vargas e a ideologia política do tenentismo.

— Para esses militares, era importante criar um Estado forte que conseguisse fazer frente ao poderoso Estado de São Paulo. Esse Estado forte seria o novo Rio de Janeiro resultante da fusão. Enquanto São Paulo seria poderoso em razão das empresas privadas, o novo Rio de Janeiro seria forte em razão das empresas estatais nele instaladas pelo governo militar.

Na avaliação de Lynch, a fusão deixou um legado negativo para o novo Rio de Janeiro como um todo, entre outros motivos, porque não foi possível criar uma relação orgânica entre os políticos da capital e os do interior, que até hoje não conseguem dialogar e agir adequadamente para enfrentar os problemas do Estado.

— Isso fica claro quando se vê que muitos governadores, eleitos pelo interior, não gostam da capital e que muitos prefeitos da capital não conseguem se tornar governadores porque não são aceitos pelo interior — ele exemplifica.

Uma curiosa reminiscência do antigo Estado da Guanabara se vê ainda hoje. No futebol, o campeonato estadual do Rio de Janeiro mantém a Taça Rio e a Taça Guanabara, atualmente entregue ao time com melhor desempenho na primeira fase. Criada em 1965, a Taça Guanabara, como o nome indica, era originalmente destinada apenas aos times da cidade-estado da Guanabara.

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A 17ª Cúpula do BRICS será no Brasil

Economistas Luiz Alberto Machado e Paulo Galvão Jr. analisam o cenário internacional antes da reunião do Rio de Janeiro

  Luiz Alberto Machado e Paulo Galvão Jr, economista e colaborador do Espaço Democrático Edição Scriptum   Embora a maior parte das atenções da mídia esteja voltada para os preparativos da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, a COP30, prevista para ocorrer entre os dias 10 e 21 de novembro de 2025, em Belém, no Pará, o Brasil sediará, antes disso, outro importante evento internacional. A 17ª Cúpula do BRICS será realizada nos dias 6 e 7 de julho de 2025, no Rio de Janeiro. O BRICS é um grupo econômico de países emergentes, inicialmente composto por Brasil, Rússia, Índia e China, e posteriormente, pela África do Sul. Nos últimos anos, o grupo expandiu-se para incluir novos membros, como Egito, Etiópia, Emirados Árabes Unidos (EAU) e Irã, e, mais recentemente, a Indonésia. É preciso revelar que a Arábia Saudita foi convidada a juntar-se ao grupo econômico em 2023, mas ainda não oficializou sua entrada como o 11º país membro do BRICS. A Arábia Saudita é o líder da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) e o príncipe herdeiro, Mohammad bin Salman, poderá ampliar os seus investimentos e comércio exterior com os dez países membros do BRICS. Já a Argentina foi convidada a ingressar no grupo durante a gestão do ex-presidente Alberto Fernández, na 15ª Cúpula do BRICS, em Johanesburgo, na África do Sul, entre 22 a 24 de agosto de 2023, mas, o presidente argentino Javier Milei não aderiu ao grupo em 22 de dezembro de 2023, após uma carta explicando que não considerava oportuna a incorporarão do país como membro pleno a em 1 de janeiro de 2024. A presidência rotativa do BRICS, em 2025, está a cargo do Brasil, que tem enfatizado a importância de promover a reforma das instituições de governança mundial (ONU, FMI e Banco Mundial) e fortalecer a cooperação entre os países do Sul Global. A cúpula ocorrerá em um momento de desafios geopolíticos, incluindo tensões com a guerra comercial iniciada pelo presidente americano Donald Trump. Recentemente, o cessar-fogo entre a Ucrânia e a Rússia por 30 dias é um grande caminho para a paz duradoura na Europa Oriental, proposta liderada pelo presidente Trump ao líder ucraniano Volodymyr Zelensky e ao líder russo Vladimir Putin. A 17ª Cúpula Sob a liderança brasileira, o grupo planeja discutir, na 17ª Cúpula do BRICS, uma variedade de temas críticos, tais como: combate à fome e à pobreza; redução das desigualdades; promoção do desenvolvimento sustentável; enfrentamento as mudanças climáticas; avanço da inteligência artificial (IA); e mais empréstimos do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB) para os países emergentes. A expansão do BRICS também será um dos principais focos da cúpula. A inclusão da Indonésia, oficializada como membro pleno em janeiro de 2025, destaca o interesse crescente de nações emergentes no grupo econômico. No entanto, nem todas as adesões foram bem-sucedidas. Em outubro de 2024, o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva vetou a entrada da Venezuela, justificando que o presidente Nicolás Maduro não apresentou resultados eleitorais presidenciais transparentes. O BRICS almeja a criação de um sistema de pagamentos utilizando moedas dos países membros. Recentemente, o presidente Lula sinalizou que o grupo quer propor a tecnologia da criptomoeda para o comércio exterior entre os dez países membros, com o uso da blockchain, reduzindo a dependência do dólar americano. Mas, o presidente norte-americano Donald Trump já ameaçou aplicar tarifas protecionistas de 100% contra os países do BRICS se isto ocorrer. Panorama econômico dos 10 membros Na atualidade, o grupo BRICS representa 36% da superfície terrestre do planeta, 48% da população mundial, 28% do Produto Interno Bruto (PIB) nominal global, 26% do comércio internacional e 72% das reservas internacionais do mundo. O BRICS tem se consolidado como uma força econômica global e a entrada de novos membros fortalece ainda mais sua influência mundial, sobretudo no Sul Global. É importante analisar alguns indicadores dos dez países integrantes na atualidade.     Esses dez países emergentes, juntos, têm PIB nominal de cerca de US$ 30 trilhões, população total de cerca de 4 bilhões de habitantes e reservas internacionais de cerca de US$ 7 trilhões, e, principalmente, buscam ampliar sua influência comercial. Entre os BRICS+ existem nove países parceiros: Cuba, Uganda, Tailândia, Cazaquistão, Bolívia, Uzbequistão, Malásia, Bielorrússia e Nigéria. Recentemente, o presidente turco Recep Tayyip Erdogan revelou publicamente grandes interesses da Turquia em ingressar no grupo, sendo um país estratégico geograficamente na Europa e na Ásia. É preciso explicar que o BRICS Plus inclui os dez países membros do grupo BRICS, mais os nove países parceiros. Portanto, o BRICS, é formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, um grupo econômico de grande relevância no cenário global. Recentemente, o grupo expandiu-se para o BRICS Plus, que agora inclui 10 países membros — com a adição do Egito, EAU, Etiópia, Irã e Indonésia — e nove países parceiros estratégicos (Cuba e Bolívia, na América; Uganda e Nigéria, na África; Tailândia, Cazaquistão, Uzbequistão e Malásia, na Ásia; e Bielorrússia, da Europa). Essa ampliação pode ter impactos no comércio agropecuário mundial, criando novas oportunidades no BRICS+ para os exportadores brasileiros, por exemplo. A possível entrada do México O presidente Lula convidou o México, juntamente com o Uruguai e a Colômbia, para participarem da 17ª Cúpula. Embora esses países latino-americanos não sejam membros plenos do grupo, o presidente rotativo do BRICS destacou a importância de sua participação para ampliar o diálogo internacional. A Cúpula do BRICS reunirá líderes de dez países membros e doze países parceiros para discutir temas relevantes ao desenvolvimento sustentável e à cooperação internacional. Além de países convidados, como o México. Hoje, gera um debate interessante sobre as vantagens e desvantagens para a possível entrada do México no BRICS, considerando o contexto econômico e geopolítico vigente. Vantagens para o México no BRICS A diversificação das relações econômicas, pois o México tem uma forte dependência dos Estados Unidos, devido ao Tratado México-EUA-Canadá (T-MEC). Participar do BRICS poderá ampliar suas relações comerciais com economias emergentes, reduzindo essa dependência. O acesso a novos mercados e investimentos em plena Quarta Revolução Industrial. Com economias como China e Índia no grupo, o México poderá atrair investimentos em infraestrutura, tecnologia e energia, além de fortalecer suas exportações para novos mercados. O maior papel geopolítico, porque o BRICS busca ser um contraponto à influência ocidental liderada pelos EUA e União Europeia (UE). O México poderá ter mais peso diplomático ao integrar um grupo econômico que defende um mundo multipolar. E o fortalecimento do peso mexicano. A criação de mecanismos financeiros alternativos ao dólar americano poderá beneficiar a economia mexicana ao reduzir sua vulnerabilidade às flutuações da moeda americana. Desvantagens para o México no BRICS A possível tensão com os EUA, vizinho e maior parceiro comercial. O México poderá enfrentar pressões políticas e econômicas ao se aproximar demais do BRICS, especialmente da China e da Rússia, que têm relações tensas com Washington. Os desafios internos de integração, pois o México já está inserido em diversas alianças regionais, como a Aliança do Pacífico, desde 2012. Uma entrada no BRICS poderá criar conflitos estratégicos e dividir suas prioridades diplomáticas. As diferenças de modelo econômico vigente. O México tem uma economia mais alinhada com o livre mercado ocidental, enquanto países como China e Rússia têm modelos econômicos fortemente influenciados pelo Estado. E a falta de um consenso interno. Não há um posicionamento claro dentro do governo da presidenta Claudia Sheinbaum, dos empresários mexicanos e da sociedade mexicana sobre entrar no BRICS. O país latino-americano poderá preferir manter relações com o grupo sem formalizar uma adesão. O convite para participar da Cúpula do BRICS mostra que há um interesse em aproximar o México do grupo. No entanto, a decisão de ingressar oficialmente dependerá de uma análise cuidadosa dos impactos na relação com os EUA e do equilíbrio entre vantagens comerciais e riscos políticos. Se o México conseguir manter boas relações com ambos, T-MEC e BRICS, poderá se beneficiar economicamente sem prejudicar sua posição estratégica. Por outro lado, um alinhamento mais forte com o BRICS poderá gerar reações adversas de Washington, o que poderá afetar sua economia altamente integrada com os EUA, mas já sofrendo com as tarifas protecionistas de 25% dos produtos oriundos do México. Desafios e oportunidades A 17ª Cúpula do BRICS representa, portanto, uma oportunidade para os países membros reforçarem sua cooperação e influenciarem a agenda global. A expansão do grupo econômico e a inclusão de novos membros, como EAU e Indonésia, por exemplos, demonstram a relevância crescente do BRICS no cenário internacional. Finalizando, desafios persistem, como a necessidade de equilibrar interesses divergentes e responder a pressões externas, especialmente de potências como China e Índia. Portanto, o sucesso da cúpula dependerá da capacidade dos líderes em promover um diálogo construtivo e implementar ações concretas que beneficiem não apenas os países membros e países parceiros, mas também do Sul Global. Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

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A redemocratização em dez atos

Eventos importantes marcaram o processo de redemocratização do Brasil, que começou em 1974 e se consolidou em 1985

  [caption id="attachment_39559" align="aligncenter" width="560"] Posse do presidente José Sarney completa 40 anos[/caption]   Edição Scriptum com Agência Senado   Em 15 de março de 1985, José Sarney tomou posse como presidente da República. A data, que está completando 40 anos, é um dos pontos de maior destaque da redemocratização do Brasil e irrigou a esperança de novos tempos, após 21 anos de ditadura militar. A transição do regime militar para o governo dos civis foi um processo longo e marcado por importantes eventos políticos e sociais. Desde a vitória da oposição nas eleições legislativas de 1974 até a posse de um presidente eleito pelo voto popular em 1990, o Brasil passou por intensos debates, manifestações populares e reformas institucionais que pavimentaram o caminho para as eleições diretas. Veja os marcos fundamentais que simbolizam a luta do povo brasileiro pela reconstrução da sua democracia.

  1. 1974: Vitória da oposição na eleição para o Congresso
A eleição de 1974 é considerada um marco importante para o início da redemocratização do País. Foram escolhidos, por voto direto, um senador por Estado, além de deputados federais e estaduais. Na ocasião, apenas dois partidos estavam na disputa: a Arena, governista, e o MDB, de oposição. Os emedebistas conseguiram aumentar consideravelmente suas bancadas. No Senado, venceram 16 das 22 cadeiras em disputa e passaram a ter 20 dos 66 senadores — antes da eleição, eram apenas sete. Aquele pleito trouxe para o Senado nomes que marcariam a política brasileira, como Itamar Franco (MG), Paulo Brossard (RS), Roberto Saturnino (RJ) e Mauro Benevides (CE). Na Câmara, o MDB elegeu 160 dos 364 deputados — na legislatura anterior, tinha 87. O número de parlamentares eleitos pelo MDB alterou a correlação de forças no Congresso Nacional. A oposição agora podia propor comissões parlamentares de inquérito (CPIs) e dificultar a aprovação de proposições que exigissem maioria qualificada, como as propostas de emenda à Constituição (PECs) — que, na época, precisavam de dois terços dos votos para serem aprovadas.
  1. 1977: Pacote de Abril
No dia 1º de abril de 1977, o presidente da República, general Ernesto Geisel, usou o Ato Institucional nº 5 (AI-5) para colocar o Parlamento em recesso. Duas semanas depois, Geisel anunciou um conjunto de medidas que ficou conhecido como "Pacote de Abril", composto por uma emenda constitucional e seis decretos, e reabriu o Congresso. O pacote foi uma reação ao bom desempenho eleitoral do MDB em 1974, e seu objetivo era impedir que o regime perdesse o controle sobre a transição política que o País começava a experimentar. Uma das providências foi o alongamento do mandato presidencial seguinte ao de Geisel, que passaria de cinco para seis anos e terminaria em 1985. Com outras medidas, o governo buscava manter a sua maioria no Legislativo — e, consequentemente, no Colégio Eleitoral. O pacote aumentou as bancadas de estados do Norte e do Nordeste (regiões onde a Arena era forte) na Câmara dos Deputados. Também instituiu a eleição indireta de um terço dos senadores, que seriam escolhidos por colégios eleitorais dominados pela Arena. Eles ficaram conhecidos como "senadores biônicos". O principal efeito do Pacote de Abril foi evitar que o MDB conquistasse a maioria no Senado nas eleições seguintes. Na Câmara, o aumento do número de deputados teve um impacto reduzido, com apenas quatro vagas a mais para a Arena.   [caption id="attachment_39550" align="aligncenter" width="560"] O presidente Ernesto Geisel usou o Ato Institucional nº 5 (AI-5) para colocar o Parlamento em recesso.[/caption]  
  1. 1978: Fim dos Atos Institucionais
Um dos maiores símbolos do autoritarismo durante a ditadura foram os Atos Institucionais. Os governos militares se valeram deles para tomar decisões sem a participação do Congresso Nacional e sem o respaldo da Constituição. Em outubro de 1978, após articulação liderada pelo presidente do Senado, Petrônio Portella, os parlamentares aprovaram a Emenda Constitucional nº 11, revogando todos os 17 Atos Institucionais do regime militar. O fim dos Atos restabeleceu o direito ao habeas corpus, limitou o estado de sítio e aboliu a pena de morte, a prisão perpétua e a pena de banimento. Além disso, a emenda reenquadrou a presidência da República dentro dos limites da Constituição, retirando os poderes do presidente para cassar mandatos, suspender direitos políticos e interromper as atividades do Congresso Nacional. O relator da emenda, senador José Sarney, destacou em seu parecer que o texto não extinguia o autoritarismo, mas representava "o início de um longo processo".   [caption id="attachment_39551" align="aligncenter" width="560"] O presidente do Senado, Petrônio Portella, liderou articulação pela aprovação da Emenda Constitucional nº 11, que revogava todos os 17 Atos Institucionais do regime militar.[/caption]  
  1. 1979: Lei da Anistia
A anistia era uma das grandes reivindicações da sociedade civil durante a ditadura. Em 1975, mães, mulheres e filhas de presos e desaparecidos criaram o Movimento Feminino pela Anistia (MFPA). Em 1978, surgiu o Comitê Brasileiro pela Anistia (CBA), com representações em diversos estados e até em Paris, onde viviam muitos dos exilados. A pressão desses e de outros grupos, e também da classe política, forçou a mão do regime. Em 28 de agosto de 1979, o presidente João Figueiredo — sucessor de Geisel — concedeu perdão aos perseguidos políticos, pavimentando o caminho para sua reincorporação à vida pública no Brasil. Por outro lado, a lei também concedeu anistia aos militares que cometeram abusos em nome do Estado desde o golpe de 1964, incluindo crimes como tortura e execução. O projeto que deu origem à Lei da Anistia foi redigido pela equipe de Figueiredo e aprovado pelo Congresso Nacional em apenas três semanas. Um senador teve papel crucial nas negociações: Teotônio Vilela, presidente da comissão encarregada de analisar o projeto, visitou presos políticos e defendeu-os perante a opinião pública. Foram anistiados tanto aqueles que simplesmente haviam feito críticas públicas aos militares quanto os que haviam pegado em armas contra o regime. Graças à lei, exilados e banidos puderam retornar ao Brasil, clandestinos deixaram de se esconder da polícia, réus tiveram seus processos nos tribunais militares anulados e presos políticos foram libertados.   [caption id="attachment_39552" align="aligncenter" width="560"] Sociedade civil se mobilizou pela anistia em 1979[/caption]  
  1. 1982: Eleições estaduais
Em junho de 1982, o Congresso Nacional promulgou a Emenda Constitucional nº 22, que retomava as eleições diretas para os governos estaduais e prefeituras (exceto em capitais). Os pleitos foram realizados em 15 de novembro daquele ano. O Brasil escolheu senadores, deputados federais e estaduais, prefeitos e vereadores. Vários anistiados, inclusive alguns que retornaram do exílio, participaram da disputa, como Leonel BrizolaMiguel Arraes e Mário Covas. Aquelas foram também as primeiras eleições após o fim das regras que impunham um bipartidarismo ao Brasil. A Arena e o MDB se reorganizaram como PDS e PMDB. Novas legendas emergiram, com destaque para o PDT de Brizola, que tentava arregimentar a herança política de Getúlio Vargas e João Goulart; e o PT, fundado por sindicalistas. O PDS venceu as disputas em mais Estados, mas o PMDB, ainda o principal partido de oposição à ditadura, prevaleceu em vários centros importantes de poder. Entre os governadores eleitos pela legenda estavam Tancredo Neves em Minas Gerais, Franco Montoro em São Paulo, Iris Rezende em Goiás e Jader Barbalho no Pará. Leonel Brizola, no Rio de Janeiro, foi o único eleito de fora dos dois maiores partidos. Como os governadores tinham a prerrogativa de indicar os prefeitos das capitais, a oposição também passaria a governar algumas das principais cidades do Brasil.   [caption id="attachment_39553" align="aligncenter" width="560"] No dia seguinte ao pleito de 1982, o jornal Tribuna da Imprensa noticiava a vitória de governadores da oposição[/caption]  
  1. 1984: Movimento Diretas Já
O ano de 1984 foi marcado por uma série de manifestações populares a favor da aprovação da proposta de emenda constitucional (PEC 5/1983) que tinha o objetivo de restabelecer as eleições diretas para a Presidência da República. A proposta foi popularmente batizada como Emenda Dante de Oliveira, nome do deputado federal que a apresentou. O movimento, batizado como Diretas Já, uniu a população brasileira em torno do mesmo objetivo: o retorno de eleições livres e democráticas. Líderes políticos e sociais e personalidades da cultura nacional organizaram grandes comícios que levaram milhões de pessoas às ruas. Após meses de mobilizações em todo o País, a proposta foi à pauta da Câmara dos Deputados e conquistou uma maioria estrondosa de votos — mas não o suficiente para prevalecer. Por se tratar de uma mudança na Constituição, a Emenda Dante de Oliveira precisava de 320 votos. Teve 298. Derrotada na Câmara, ela não chegou a ser votada pelo Senado. A rejeição da proposta, e por uma margem tão estreita, provocou grande frustração popular. Apesar da derrota, a campanha enfraqueceu a ditadura militar e deu ânimo ao projeto de transição democrática.   [caption id="attachment_39554" align="aligncenter" width="560"] Proposta por Dante de Oliveira (em discurso na Câmara), a emenda que estabelecia eleições diretas para presidente contou com mobilizações em todo o país[/caption]    
  1. 1985: Eleição de Tancredo Neves no Colégio Eleitoral
Em 15 de janeiro de 1985, o Colégio Eleitoral, composto por deputados, senadores e delegados das assembleias legislativas dos Estados, se reuniu para eleger o sucessor de João Figueiredo. Conforme o plano da abertura, o governo não indicou um candidato militar dessa vez. O próximo presidente seria necessariamente um civil. A escolha se deu entre Tancredo Neves, do PMDB, e o deputado Paulo Maluf, do PDS. Graças às manobras políticas e legais dos anos anteriores e aos resquícios do seu poder autoritário, o governo tinha a maioria no Colégio Eleitoral. Mas a erosão da ditadura já era irreversível. Tancredo conseguiu atrair para seu campo a Frente Liberal, uma dissidência do PDS descontente com a indicação de Maluf como candidato. A união formou a Aliança Democrática e deu a Tancredo seu vice, o senador José Sarney, que havia sido presidente da antiga Arena. Sarney migrou para o PMDB, enquanto a Frente Liberal formou seu próprio partido, o PFL. A Aliança Democrática levou Tancredo e Sarney a uma vitória inapelável. Foram 480 votos contra 180 de Maluf e seu vice, Flávio Marcílio, presidente da Câmara dos Deputados. O resultado marcou o fim do ciclo militar, levando um presidente civil ao governo do Brasil pela primeira vez desde 1964, e pelas mãos da oposição. O 15 de janeiro trouxe esperança renovada para a conclusão da transição democrática do país.   [caption id="attachment_39555" align="aligncenter" width="560"] Vitória da chapa Tancredo e Sarney no Colégio Eleitoral encerrou duas décadas de governos militares[/caption]    
  1. 1985: Morte de Tancredo e posse de Sarney
Na noite de 14 de março de 1985, véspera de sua posse, Tancredo Neves foi internado devido a problemas de saúde e ficou impedido de assumir o cargo. Coube ao vice-presidente eleito, José Sarney, tomar posse como presidente da República em exercício. Uma articulação política delicada garantiu a transição de poder, uma vez que a Constituição não era clara sobre aquela situação, e temia-se uma investida da linha dura militar. Depois de uma longa internação, sete cirurgias, 42 boletins médicos e muitas informações desencontradas sobre seu estado de saúde, Tancredo de Almeida Neves faleceu em 21 de abril no Instituto do Coração, em São Paulo. Apesar de nunca tomar posse do cargo para o qual foi eleito, ele é considerado pelos registros oficiais como um dos presidentes do Brasil. Com a morte de Tancredo, Sarney assumiu definitivamente a Presidência, o que criou um arranjo inusitado: apesar de eleito pelo partido da oposição, o novo presidente havia sido um dos principais líderes do governo no Congresso durante a ditadura militar, antes do rompimento de seu grupo político no Colégio Eleitoral. Sarney foi fiel a Tancredo, manteve o gabinete de ministros que o companheiro de chapa havia montado e seguiu em frente com a missão de completar a transição democrática. Ecoavam, como lema, as palavras proferidas por Tancredo durante seu último discurso à nação, na data em que foi eleito: "Não vamos nos dispersar".   [caption id="attachment_39556" align="aligncenter" width="560"] Com Tancredo internado na véspera, coube a Sarney tomar posse como presidente em exercício. Tancredo faleceu pouco mais de um mês depois[/caption]    
  1. 1987 e 1988: Assembleia Constituinte
Em junho, três meses depois da sua posse, Sarney cumpriu a principal promessa do mandato e enviou ao Congresso Nacional a convocação de uma assembleia que reescreveria a Constituição do Brasil. A proposta foi aceita e promulgada em novembro, na forma da Emenda Constitucional nº 26. No dia 2 de fevereiro de 1987, foi instalada a Assembleia Nacional Constituinte, composta pelos próprios membros do Congresso Nacional. Eram 559 parlamentares, sob a presidência do deputado Ulysses Guimarães. A Assembleia teve a opção de ratificar um texto pronto, elaborado por uma comissão de intelectuais. Ela rejeitou a ideia em favor de um processo com a participação de todos os seus membros, distribuídos em comissões temáticas, e aberto às sugestões da sociedade. No final, uma comissão de redação organizaria o texto final, com relatoria do senador Bernardo Cabral. As regras mudaram no meio do caminho, tirando o texto final das mãos da comissão de redação e levando as decisões para o Plenário, mas a Constituinte cumpriu o seu trabalho. A população levou aos constituintes 122 emendas, que foram apoiadas por mais de 12 milhões de pessoas, além de enviar quase 73 mil cartas manifestando seus anseios, desejos e reivindicações. Depois de um ano e meio de atividade, a nova Constituição foi promulgada em 5 de outubro de 1988.   [caption id="attachment_39557" align="aligncenter" width="560"] Após um ano e meio de trabalhos e intensa participação popular, o país tinha uma nova Constituição[/caption]    
  1. 1989: Eleições diretas para presidente
O texto da Constituição trazia a data para o evento mais esperado de todo o processo de redemocratização: a eleição presidencial pelo voto direto, pela primeira vez desde 1960. Os brasileiros voltaram às urnas para escolher o seu presidente no dia 15 de novembro de 1989, centenário da Proclamação da República. O tamanho do eleitorado dava uma medida da nova fase democrática em que o país embarcava. Na última eleição presidencial aberta, o Brasil tinha 15,5 milhões de eleitores. Em 1989, esse número mais que quintuplicou — eram 82 milhões aptos a votar, graças à Constituição, que garantiu o sufrágio universal. Outra grande novidade era a possibilidade do segundo turno, caso nenhum dos candidatos obtivesse mais da metade dos votos. Com 22 candidatos no páreo, essa perspectiva era quase certa. Seriam 23, mas o apresentador Silvio Santos teve a sua candidatura indeferida a seis dias do pleito. O governador de Alagoas, Fernando Collor de Mello, candidato pelo pequeno PRN, despontou como favorito durante a campanha e terminou em primeiro lugar. Seu adversário no segundo turno foi o líder sindical e deputado constituinte Luiz Inácio Lula da Silva, do PT. Lula superou por pouco o ex-governador Leonel Brizola, do PDT, que finalmente estreava em uma disputa presidencial. Em quarto lugar apareceu o senador constituinte Mário Covas, pelo recém-criado PSDB. Os maiores partidos do País tiveram resultados tímidos. O PDS ficou em quinto lugar, com Paulo Maluf; o PMDB foi sétimo, com Ulysses Guimarães; e o PFL, nono, com o ex-vice-presidente Aureliano Chaves. A campanha do segundo turno foi longa, durou mais de um mês. Em 17 de dezembro de 1989, Fernando Collor reuniu 53% dos votos e foi eleito o primeiro presidente por voto direto, após 21 anos de ditadura militar. Sua eleição e, em 15 de março do ano seguinte, sua posse completaram a lenta caminhada do Brasil de volta para o poder civil e democrático.   [caption id="attachment_39558" align="aligncenter" width="560"] rimeira eleição direta para presidente após o regime militar teve 22 candidatos; Fernando Collor foi eleito no segundo turno[/caption]

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