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Calma sob pressão

Luiz Alberto Machado escreve sobre a biografia de Henrique Meirelles, o engenheiro que se transformou em executivo do mercado financeiro e destacado ocupante de cargos públicos da grande relevância

Luiz Alberto Machado Edição Scriptum   O título deste artigo corresponde à autobiografia de Henrique Meirelles, recém-lançada pela editora Planeta. Em depoimentos feitos aos jornalistas Karla CorreiaLeandro Loyola e Thomas Traumann, o engenheiro que se transformou em executivo do mercado financeiro e destacado ocupante de cargos públicos da grande relevância narra o que aprendeu comandando o Banco de Boston, o Banco Central e o Ministério da Fazenda. As 191 páginas, divididas em 14 capítulos, foram digeridas por mim em apenas três dias, o que se deve em grande parte à redação fluida que transforma até as partes que, em tese, tratam de temas mais áridos, em leitura agradável e acessível, mesmo para leigos em assuntos econômicos como as políticas monetária, fiscal e cambial. Elogiado na quarta capa por dois ex-presidentes aos quais serviu, Luiz Inácio Lula da Silva, como presidente do Banco Central, e Michel Temer, como ministro da Fazenda, Meirelles descreve nos capítulos iniciais aspectos de sua biografia envolvendo duas mudanças: de Goiás para São Paulo; e da engenharia à economia. Destaco, dessa fase inicial, o relato de Meirelles sobre sua experiência na política estudantil no ensino médio goiano, que será decisiva para o ingresso mais tarde na vida política. Nos capítulos seguintes, debruça sobre a carreira no Banco de Boston, inicialmente trabalhando no Brasil, de 1974 a 1996, e, posteriormente, nos Estados Unidos, de 1996 a 2002, onde se tornou o primeiro estrangeiro a ocupar a presidência mundial de um dos mais antigos e tradicionais bancos norte-americanos. Voltando ao Brasil, optou pela carreira política, retomando a trajetória de seu avô, que havia sido prefeito de Anápolis, do tio, que fora governador do Estado, e do pai, secretário de governo e procurador-geral do Tribunal de Contas de Goiás. Na época, conversou com diversas pessoas, valendo a pena reproduzir seu diálogo com o então presidente Fernando Henrique Cardoso, bem como o desfecho de sua candidatura a deputado federal. “Ele [FHC] me sugeriu começar pela via parlamentar nas eleições de 2002. ‘Se o PSDB ganhar a eleição, tem uma boa possibilidade de você ser escolhido ministro. E, caso contrário, você já estaria no Congresso’, argumentou o presidente. ‘E qual o partido que você sugere?’, perguntei. ‘Sugiro que você escolha o partido que tenha um líder... Um líder que tenha poder e que tenha palavra.’ ‘Muito bem, qual é o partido e quem é o líder?’, insisti. ‘O partido é o PFL e o líder é o Jorge Bornhausen.’ Depois disso, conversei com outras pessoas como Octávio Frias, dono da Folha de S.PauloCiro GomesAnthony Garotinho e com Lula, que me recomendou a entrar no PSDB. Agradeci as orientações e conselhos de todos eles, mas ainda estava priorizando a ideia do PFL. Dias depois, conversei com o senador Jorge Bornhausen, presidente do então PFL, e ficou tudo acertado. No último dia de inscrição, Fernando Henrique me liga às 7 horas e diz que a melhor opção era o PSDB. Eu o lembrei da conversa anterior e perguntei: ‘Mas quem é o líder lá que cumpre palavra?’. ‘Serei eu’, me garantiu Fernando Henrique. Por vias transversas, acabei acatando a sugestão inicial de Lula e saí candidato a deputado federal pelo PSDB. Depois de tantos anos de Estados Unidos, a campanha em Goiás foi um banho de Brasil. Visitei todas as regiões do Estado, e as lições que aprendi então me ajudam até hoje a entender o que é a política de fato”. Eleito deputado federal com uma votação impressionante, Meirelles nem chegou a assumir sua cadeira no Congresso, pois foi convidado por Lula, que foi eleito presidente com 61% dos votos no segundo turno contra José Serra, a assumir a presidência do Banco Central. Aceitou o convite, mesmo sabendo que o contexto era adverso, diante da concordância de Lula de não interferir nas decisões do banco. Em outras palavras, Meirelles conseguiu a autonomia do Banco Central alguns anos antes de ela ser garantida em lei, tornando-se matéria constitucional. De sua passagem pelo Banco Central, Meirelles enfatiza a alegria de constatar que é plenamente possível a boa convivência de um ex-banqueiro com um ex-operário, bem como o grande entrosamento com a equipe do início do primeiro mandato de Lula, capitaneada por Antonio Palocci, período em que houve harmonia entre as políticas monetária e fiscal, fator fundamental para o bom desempenho da economia. Permanecendo na presidência do Banco Central até transmitir o cargo em janeiro de 2011, Meirelles enfrentou uma série de desafios internos, com destaque para o fogo amigo de alas radicais do PT que jamais engoliram totalmente sua presença na equipe econômica, e externos, entre os quais se destaca o enfrentamento da crise do subprime, considerada a mais grave crise econômica desde a Grande Depressão da década de 1930. Nos capítulos seguintes, Meirelles detalha o convite de Michel Temer para assumir o Ministério da Fazenda após o impeachment de Dilma Rousseff. Apesar de reconhecer que o momento econômico era ainda mais difícil do que o enfrentado no início do governo Lula, em razão de dois anos seguidos com crescimento negativo, aceita o desafio e empenha-se a fundo, de comum acordo com o presidente, na elaboração e aprovação da PEC 95, conhecida como PEC do Teto de Gastos, imprescindível para recolocar a casa em ordem. Com a decisão de Michel Temer de não concorrer à reeleição, Meirelles resolveu disputar a presidência com o objetivo de dar continuidade à bem-sucedida política econômica que conseguira, além do teto de gastos, aprovar a reforma trabalhista e a Lei das Estatais. Com a vitória de Jair Bolsonaro, que derrotou Fernando Haddad nas eleições de 2018, Meirelles pretendia voltar para a iniciativa privada, mas acabou aceitando o convite de João Doria, governador eleito de São Paulo, para ser responsável pela economia do Estado. Como secretário da Fazenda, foi fundamental para que o Estado enfrentasse com sucesso o terrível período da pandemia de Covid-19. Falando nas entrevistas que "o nome do crescimento econômico em 2021 é vacina", tinha a firme convicção de que quanto mais rápido fosse o processo de vacinação, maior seria a taxa de crescimento. Isso se revelou verdadeiro, tanto que a economia de São Paulo, de fato, cresceu mais do que a economia brasileira em 2021. No capítulo final, Meirelles faz um balanço de sua contribuição para o País, concluindo que, em que pese a existência de dificuldades, o Brasil vem avançando: não é mais assombrado pela frase de Mario Henrique Simonsen "a inflação aleija, mas o câmbio mata"; está muito menos vulnerável a crises como as dos anos 1970 e 1980, causadas por falta de dólares para pagar importações e dívidas; existe certo consenso em torno da independência do Banco Central, do controle fiscal e da inflação. Por tudo isso, para Meirelles, "foi uma trajetória difícil, mas saímos mais fortes. Aprendemos com os nossos erros". Bem antes da leitura de Calma sob pressão, eu já admirava Henrique Meirelles, reconhecendo nele um raro exemplo de sucesso tanto na iniciativa privada, como nas funções governamentais. O livro me permitiu conhecer outras de suas facetas meritórias, como as relacionadas ao seu interesse por temas culturais e acentuada preocupação social. Como acadêmico e idealista, meu único reparo se refere à pouca afinidade de Meirelles a um determinado partido político. Filiado desde 2022 ao União Brasil, ele flertou com o PFL, foi eleito deputado federal pelo PSDB, passou duas vezes pelo PSD e foi candidato à presidência pelo MDB. Na minha ingenuidade, acredito no fortalecimento dos partidos e na fidelidade partidária como fatores de consolidação e aperfeiçoamento da democracia. Quem sabe um dia... Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

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Saúde, economia e política em debate no Espaço Democrático

Crise na saúde do Rio, BRICs e o desempenho da esquerda nas eleições foram principais temas da reunião semanal

[caption id="attachment_38903" align="aligncenter" width="560"] Reunião semanal de colaboradores do Espaço Democrático[/caption]

Redação Scriptum

 

A mais recente crise no sistema de saúde do Rio de Janeiro, exposta com a revelação de que seis pacientes foram infectados com HIV após transplantes de órgãos em razão da negligência do laboratório responsável para fazer analisar o sangue de doadores, foi um dos temas da reunião semanal do Espaço Democrático – a fundação para estudos e formação política do PSD. Na reunião desta terça-feira (22) também foi abordado o encontro dos chefes de Estado dos países que são parte dos BRICs na Rússia e o desempenho das esquerdas nas eleições municipais.

O consultor na área de saúde Januario Montone, que foi secretário de saúde do município de São Paulo entre 2007 e 2012, considera que embora o episódio envolvendo o laboratório PCS Lab Saleme pudesse colocar em risco a credibilidade do Programa Nacional de Transplantes, isto parece não ter ocorrido. “Precisamos avaliar agora o impacto sobre doadores e familiares”, disse ele.

Montone destacou que o programa de transplantes é um dos mais vitoriosos do SUS. “Só em 2023 foram feitos 6.766 transplantes no Brasil e é a primeira vez que uma ocorrência grave como esta é registrada”, afirmou. “Foi um problema localizado e identificado.” Ele lembrou ainda que esta é mais uma mancha no sistema público de saúde do Rio de Janeiro. “Confirma a reputação de um sistema corrompido no Estado, que frequenta mais as páginas policiais dos jornais que as técnicas”.

BRICs

O economista Luiz Alberto Machado fez um retrospecto histórico sobre a evolução dos BRICs, reunido neste momento, em Kazan, na Rússia, para discutir, entre outros temas, a admissão de novos países parceiros – entre os quais os latino-americanos Cuba, Venezuela e Nicarágua – e a adoção de uma moeda alternativa ao dólar como referência para transações internacionais.

Machado lembrou a adesão recente de Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes, Etiópia e Irã ao grupo, segundo ele um reflexo das mudanças nas relações internacionais. E destacou que é possível, pelo perfil dos países que estão sendo agregados, perceber que o bloco vem ganhando um forte viés geopolítico. “Alguns deles são reconhecidas ditaduras e outros se opõe fortemente à influência ocidental do mundo; mais do que a influência ocidental, a influência americana”.

Esquerdas

O cientista político Rubens Figueiredo fez uma análise sobre o desempenho dos partidos de esquerda nas eleições municipais e projetou como este resultado pode refletir na disputa de 2026. Segundo ele, o Partido dos Trabalhadores é cada vez mais dependente do carisma e da liderança do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “O PT é uma coisa e o Lula é outra, muito diferente”, afirmou.

Ele apontou que o discurso do partido, desde a eleição presidencial de 1989, continua o mesmo, sem evoluir. “É um discurso surrado: o Lula de 1989 é o mesmo de 2024”, disse. Figueiredo destacou que o ciclo de consumo registrado ao longo do primeiro mandato de Lula lustrou a imagem do PT, mas não foi obra dele, e sim do fato de a economia brasileira ter surfado no boom das commodities. Por fim, o cientista político disse que a sociedade brasileira perdoou todos os grandes escândalos nos quais o PT se envolveu – mensalão, petrolão, lava-jato – e continuou votando em Lula, mas não há nada de novo na esquerda. “Não há formuladores”, enfatizou.

Participaram da reunião semanal do Espaço Democrático o advogado Roberto Ordine, o sociólogo Tulio Kahn, os cientistas políticos Rubens Figueiredo e Rogério Schmitt, o gestor público Januario Montone, os economistas Luiz Alberto Machado e Roberto Macedo e os jornalistas Eduardo Mattos e Sérgio Rondino, coordenador de comunicação do Espaço Democrático. Todos consultores e colaboradores da fundação do PSD.

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