Pesquisar

Taxonomy - Destacão

Piora da saúde mental e o desencanto do mundo

O sociólogo Tulio Kahn analisa o crescente número de casos de transtorno de ansiedade e depressão

Tulio Kahn, sociólogo e colaborador do Espaço Democrático Edição Scriptum   Existem diversos indícios de piora da saúde mental dos brasileiros nos últimos anos, em especial dos transtornos de ansiedade e depressão. É possível captar essa degradação de diversas formas. Assim, por exemplo, vemos um aumento nas buscas do Google por “remédios para ansiedade”, dos gastos com diárias pagas pelo SUS com internações por transtornos fóbicos ansiosos ou outros transtornos ansiosos e um crescimento acelerado dos benefícios concedidos pela Previdência como auxílios por incapacidade temporária. Os auxílios-doença concedidos por transtornos de ansiedade atingiram o maior número em dez anos e pelo quarto ano consecutivo são a principal causa de afastamentos no Brasil, segundo o Ministério da Previdência Social. Corroborando os indícios anteriores, observamos um aumento nas vendas de antidepressivos e estabilizadores de humor na indústria farmacêutica, que crescem cerca de 10% ao ano nos últimos anos. Um dos resultados trágicos deste crescimento tem sido o aumento dos suicídios, que pelos dados do Sinesp/MJ passaram de 2.759 casos no primeiro quadrimestre de 2015 para 5.296 casos neste primeiro quadrimestre de 2025, projetando 15.900 caso no ano. Fenômeno parecido tem sido observado em outros países, principalmente após a epidemia de COVID, mas no Brasil o problema dos transtornos mentais parece se apresentar com especial intensidade. A OMS identifica o Brasil como um país com sérios problemas de saúde mental, com altos níveis de depressão e ansiedade, especialmente na América Latina. O Brasil ocupa um lugar de destaque em rankings globais de saúde mental ruim, muitas vezes figurando entre os países com as piores taxas de depressão e ansiedade. (Leia mais aqui) Existem algumas tentativas de explicação para o crescimento do problema, que começa antes da epidemia. Entre elas estão o uso intenso de celulares e das redes sociais, a instabilidade econômica, precarização das condições de trabalho, a polarização política, o aumento da sensação de insegurança com relação aos crimes, o isolamento do trabalho remoto e do ensino EAD, a piora da crise climática, a eclosão de conflitos internacionais, etc. Some-se a isso o dado de que, segundo o IBGE divulgou essa semana, temos 9 milhões de jovens que nem trabalham nem estudam (nem-nem), o que tampouco deve contribuir para a saúde mental. Não se pode descartar também uma eventual melhora na conscientização sobre os problemas mentais, bem como no diagnóstico e notificação dos casos pelo sistema de saúde. Gostaria de explorar outro veio e adicionar aqui a questão do “desencanto” que parece atingir níveis elevados no país. Alguns dados da sétima onde (2017-2022) do World Value Survey são bastante ilustrativos deste ponto. Segundo a pesquisa, 59,5% dos brasileiros estão insatisfeitos com o sistema político, em contraste com 10,8% da média mundial e 24,5% dos latino-americanos. Somente 25% dos brasileiros dizem ter muito “orgulho nacional”, ao passo que a média mundial é de 58,8% e a latino-americana a 71,3%. Apenas 18,6% dos brasileiros se sentem muito “próximos do país”, bem menos que a média mundial (47,8%) ou latino-americana (50,7%). Os brasileiros – além de estarem submetidos às fontes de stress comuns aos demais países e época – não tem orgulho nem apego ao país, como ilustra também a grande porcentagem de jovens entre 16 e 35 anos (67%) que afirmam que sairiam do país se pudessem e os milhões de brasileiros que já vivem em outros países (Veja aqui, para assinantes). Temos então a tempestade perfeita para o crescimento das doenças mentais, que junta milhões de jovens desocupados, isolamento social, crescimento do tempo-online, polarização política, aumento da insegurança, precarização do trabalho, etc. e uma desconfiança profunda nas instituições e no país. O brasileiro perdeu a esperança de que algum dia o Brasil venha a dar certo. Quem pode vai embora, os mais sensíveis, adoecem. Como já foi observado, um resultado como esse não é obra do acaso, exige décadas de esforço de uma elite descompromissada e incompetente. Pra aguentar o Brasil, só tomando rivotril.     Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

Card link Another link
Dirigentes da Internacional Democrata Centrista visitam PSD

Presidida por Andrés Pastrana, entidade está presente em 83 países e tem 113 partidos associados

 

Edição Scriptum com Assessoria de Comunicação do PSD

 

O PSD Nacional recebeu na segunda (30) e terça-feira (1), em São Paulo, a visita de Andrés Pastrana, presidente da IDC-CDI (Internacional Democrata Centrista), e do coordenador da organização, Luis Blanco. Principal instituição global de partidos políticos, a entidade recebeu a adesão do PSD no final do último ano, e os dirigentes mantiveram nos dois dias desta semana uma série de reuniões com o presidente nacional do partido, Gilberto Kassab, dirigentes da sigla e da Fundação Espaço Democrático e lideranças de entidades setoriais e empresariais.

A visita de Pastrana e Blanco a São Paulo incluiu também um encontro com o governador paulista Tarcísio de Freitas no Palácio dos Bandeirantes, que teve ainda a participação do secretário e fundador do PSD Guilherme Afif Domingos e o líder do partido na Câmara, Antonio Brito.

Na terça-feira, na sede paulista do PSD, os dirigentes do IDC assistiram a uma apresentação sobre a história do partido, desde a fundação, em 2011, até a atualidade, quando se consolida como força da política brasileira, com o maior número de prefeitos eleitos no último ano, governadores de Estado, bancadas na Câmara dos Deputados e no Senado, deputados estaduais, secretários e outros gestores públicos nos três níveis federativos.

Também acompanharam uma análise do cenário político e econômico internacional feita por Lucas Ferraz, professor e pesquisador da Fundação Getúlio Vargas e consultor do Espaço Democrático.

[caption id="attachment_40188" align="aligncenter" width="560"] O líder Antonio Brito, o governador Tarcisio de Freitas, Andrés Pastrana, presidente da IDC-CDI, Gilberto Kassab, presidente nacional do PSD, e o secretário Guilherme Afif[/caption]

Nos dois dias da visita, Pastrana, ex-presidente da Colômbia (1998-2002), fez uma série de análises sobre o cenário político global e da América Latina e ressaltou a importância da pauta da segurança e combate ao crime organizado.

Na segunda-feira, durante reunião na ACSP (Associação Comercial de São Paulo), Pastrana e Blanco debateram aspectos políticos e econômicos. Se encontraram com Roberto Mateus Ordine, presidente da associação, lideranças da entidade e dirigentes e lideranças do PSD e do Espaço Democrático, fundação para estudos e formação política do partido.

As atividades também se deram na Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), onde os dirigentes foram recebidos pelo presidente Josué Gomes da Silva e representantes de federações e outras entidades empresariais.

Entre os participantes estavam dirigentes e conselheiros do PSD e do Espaço Democrático, como o líder do PSD na Câmara dos Deputados, Antonio Brito; o ex-governador do Espírito Santo Paulo Hartung; o embaixador e ex-ministro Andrea Matarazzo; o ex-deputado federal e ex-secretário estadual de Goiás Vilmar Rocha; o ex-senador Heraclito Fortes; Flavio Chuery, Luiz Carlos Boscolo e João Francisco Aprá.

[caption id="attachment_40189" align="aligncenter" width="560"] Pastrana fez uma série de análises sobre o cenário político global e da América Latina e ressaltou a importância da pauta da segurança e combate ao crime organizado.[/caption]

Pastrana destacou a presença do PSD na entidade e lembrou que a IDC-CDI está presente em 83 países, com 113 partidos associados. “Há uma série de vice-presidentes da entidade que são primeiros-ministros e o PSD se soma a esta força”, pontuou.

Gilberto Kassab ressaltou que a IDC-CDI é a “maior instituição política do mundo”. “Nos integramos à entidade que traz lideranças políticas muito importantes em todos os países, vinculados ao centro e à direita e isto é muito importante para o PSD”, afirmou.

Card link Another link
Lições de viagem: São Roque

O economista Luiz Alberto Machado aborda a revitalização da cidade paulista, um exemplo de economia criativa

  Luiz Alberto Machado, economista e colaborador do Espaço Democrático   Diversas cidades passaram por processos de revitalização parcial, com intervenções que as transformaram em exemplos de cidades criativas. Tais intervenções foram de iniciativa do poder público − talvez a maioria −, mas em alguns casos ocorreu o que se convencionou chamar de bottom-up, com iniciativas que tiveram origem na sociedade civil, embora, num segundo momento, o poder público tenha dado sua contribuição. Caso típico dessa segunda forma ocorreu em Parintins, no Amazonas, com a Festa do Boi, uma festividade popular que se transformou num sucesso extraordinário, a ponto de exigir a participação do poder público, dando origem a um dos maiores exemplos de manifestações folclóricas do Brasil, cujo sucesso, de certa forma, permite compará-la com o desfile das escolas de samba do Rio de Janeiro, mundialmente reconhecido.  Examinando os casos de revitalização que permitiram que determinados locais tenham se transformado em espaços criativos, é possível encontrar exemplos de revitalização parcial, como foram os casos, entre outros, de Puerto Madero, em Buenos Aires, e Estação das Docas, em Belém do Pará, nos quais áreas degradadas das referidas cidades foram recuperadas e se tornaram pontos de atração, tanto de turistas como da própria população, que passaram a ter nesses espaços pontos de atração graças à existência de polos gastronômicos e/ou culturais, englobando bares, restaurantes, casas de show, escolas de dança, museus e galerias de arte. Independentemente da presença de atrações dessa natureza, tais localidades passaram a atrair visitantes dispostos simplesmente a passear, desfrutando das belezas lá encontradas. Há casos, porém, em que a revitalização foi mais abrangente, transformando cidades inteiras, que se transformaram em verdadeiros ícones de cidades criativas, internacionalmente reconhecidas. Um exemplo típico deste caso é Barcelona, que se transformou numa das maiores atrações turísticas de todo o mundo, cujo processo de revitalização se inseriu num projeto mais amplo que teve por pano de fundo a realização dos Jogos Olímpicos, em 1992. No Brasil, há diversos exemplos do mesmo tipo, entre os quais Gramado, no Rio Grande do Sul, que deixou de ser uma cidade que atraia visitantes nos meses de inverno, que se notabilizava por um festival de cinema, para se transformar num polo permanente de visitação, com amplo leque de atrações, respaldado por sólido sistema de hospedagem e gastronomia. Esteartigo focaliza uma localidade próxima a São Paulo, cujo processo de revitalização, ainda em curso, é digno de registro. Distante cerca de 60 quilômetros da capital paulista, São Roque se destaca atualmente como excelente exemplo de cidade que se reinventou, ostentando uma série de atrativos que mudaram completamente sua imagem. O ponto de partida da alteração da imagem de São Roque reside na vitinicultura e na gastronomia. A cultura vinícola de São Roque é bastante antiga, tendo origem na própria fundação da cidade, em 1657, ­­­­pelas mãos de um bandeirante. O Estado de São Paulo, nessa época, já produzia vinho há mais de 100 anos (a primeira produção foi em 1551 pelas mãos de Brás Cubas, na vila que viria a ser São Paulo). Durante séculos a produção em São Roque esteve restrita à subsistência e ao comércio local, ganhando força com a chegada dos imigrantes italianos no final do século XIX. Mas nessa mesma época a praga da filoxera (um pulgão que mata a planta pela raiz) se alastrou por toda a Europa e chegou ao Brasil também, devastando completamente os vinhedos. As únicas videiras que não eram atacadas eram as videiras americanas, que produzem uvas para os "vinhos de mesa", e foi através deles que a indústria local conseguiu se expandir. Esses vinhos, de perfil mais simples, quase rústico, foram presença constante em mesas de restaurantes e residências paulistas por várias décadas e são até hoje uma grande fonte de renda e turismo na região. No entanto, o êxodo rural, as diversas crises econômicas do século passado, o baixo valor agregado desses produtos e a especulação imobiliária, puseram fim a dezenas de vinícolas da região e o turismo se concentrou nos caminhos do conhecido Roteiro do Vinho, ainda apoiado nas tradições antigas e nos vinhos simples. Mas a renovação chegaria no começo deste século, com pesquisa, investimentos e a ousadia em acreditar que o consumidor de vinhos do Brasil já estava pronto para beber vinhos diferenciados e de maior valor. Assim, algumas vinícolas, produtores rurais e investidores da iniciativa privada começaram uma lenta revolução, do campo até a mesa e a taça. Na última década surgem novos empreendimentos turísticos, a gastronomia regional se eleva e alguns rótulos produzidos com uvas da região recebem reconhecimento no Brasil e no exterior por sua qualidade, principalmente pelo novo sistema de produção, a Colheita de Inverno, que permite que as uvas finas amadureçam com perfeição nos meses de julho e agosto. Como resultado dessa verdadeira revolução, e da ação integrada de produtores, proprietários de terras e da própria Prefeitura, esse trabalho mostra seus frutos e se expande para além da Estrada do Vinho, indo para a Estrada dos Venâncios e a Rodovia Quintino de Lima, reunindo adegas, vinícolas, restaurantes, hotéis, pousadas e centros de lazer e entretenimento, em meio à natureza abundante da Mata Atlântica preservada. A cidade de São Roque recebeu até um curso de Enologia, no Instituto Federal de Educação, confirmando a vocação da região para a produção de vinhos. Atualmente, as principais uvas finas cultivadas na cidade são a Cabernet Franc e a Tempranillo (tintas) e a Sauvignon Blanc e a Lorena (brancas). Mas dezenas de outras variedades europeias vêm sendo cultivadas nas suaves colinas de São Roque nos últimos anos. Além dos vinhos, São Roque se destaca também pela produção de alcachofra, cuja safra atinge seu ponto alto no mês de setembro. Vários dos restaurantes, alguns dos quais de alta qualidade, incluem a alcachofra em seus cardápios, contribuindo para atrair significativo volume de apreciadores dessa iguaria. Por todas essas razões, São Roque é um perfeito exemplo de cidade que evolui na trilha da economia criativa. Apostando na diversificação, as atrações da cidade deverão crescer ainda mais com o Festival de Inverno a ser realizado a partir de julho, que terá, como um de seus destaques, um festival de jazz, com importantes intérpretes do Brasil e do exterior. [1] Economista, graduado em Ciências Econômicas pela Universidade Mackenzie, mestre em Criatividade e Inovação pela Universidade Fernando Pessoa (Portugal), é sócio-diretor da empresa SAM - Souza Aranha Machado Consultoria e Produções Artísticas e consultor da Fundação Espaço Democrático.   Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

Card link Another link
O alto preço do continuísmo irresponsável

E é necessário fazer uma reflexão sobre a responsabilidade de todos os brasileiros que elegeram democraticamente todos os governantes pelo voto popular, defende Samuel Hanan

  Samuel Hanan, ex-vice-governador do Amazonas, engenheiro especializado em economia e colaborador do Espaço Democrático Edição Scriptum   Todos os presidentes do Brasil nas duas últimas décadas sabiam e sabem da necessidade de cortar despesas, reduzir a gastança do governo e o gigantismo da máquina pública para dispor de recursos destinados a investimentos inadiáveis, por exemplo, em educação em tempo integral, em melhoria da remuneração dos professores, em ampliação das coberturas do Sistema Único de Saúde (SUS) e em universalização dos serviços do saneamento básico, hoje uma das maiores vergonhas nacionais, com impacto direto na saúde pública e na qualidade de vida dos cidadãos. Tais medidas, entretanto, jamais foram implementadas. Essa necessidade, ainda que gritante, foi sempre sufocada pelos interesses eleitorais – especialmente a reeleição – visando à manutenção do poder, como se o País tivesse donatários em pleno século 21. Para isso, nenhuma preocupação em fazer o combate efetivo à corrupção e enorme boa vontade com a concessão de privilégios, generosidade com disponibilização de recursos públicos para parte da mídia e para os influenciadores sociais, com destaque para a área da cultura. A caixa de bondades foi mantida aberta. O preço dessa desastrosa opção, que perdura desde a aprovação do instituto da reeleição, em 1997, tem sido muito elevado, prejudicando a prestação de serviços essenciais com precariedades alarmantes, além do brutal empobrecimento da população brasileira. Não é necessário muito esforço para a comprovação dos desastres causados por essas políticas governamentais que privilegiam poucos em detrimento da grande massa carente, a plutocracia tomando o lugar da democracia. Um bom exemplo são os gastos primários. Em 2002, último ano do governo de Fernando Henrique Cardoso, os gastos primários alcançaram o montante equivalente a 14,7% do Produto Interno Bruto (PIB), segundo dados do Tesouro Nacional, da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Na sequência, ao final dos dois primeiros mandatos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003/2010) esses gastos foram expandidos e chegaram a 17% do PIB. Um aumento de 2,3 pontos percentuais, equivalentes hoje a R$ 269 bilhões/ano. A irresponsabilidade continuou durante os cinco anos e sete meses dos governos da presidente Dilma Roussef e, com isso, os gastos primários atingiram um recorde de 19,5% do PIB, ou seja, mais R$ 292 bilhões/ano, em valores atualizados. No período seguinte, nos governos de Michel Temer e de Jair Bolsonaro, houve recuo de 19,5% para 18% do PIB nesses gastos. Mas voltou a subir no biênio 2023/2024, já no terceiro governo de Lula, atingindo o nível de 20% do PIB. Significa dizer que o aumento entre 2002 até hoje custou para o País 5,3 pontos percentuais do PIB, ou R$ 622 bilhões/ano em valores de hoje. É preciso falar também sobre os privilégios concedidos ao setor privado, por meio de renúncias fiscais – os chamados gastos tributários –, igualmente responsáveis por tornar o Brasil ainda mais desigual e injusto. Em 2001, os gastos tributários da União eram equivalentes a 1,47% do PIB, cerca de R$ 172 bilhões/ano). Em 2010, último ano do segundo mandato do presidente Lula, já era mais do que o dobro. Correspondia a 3,60% do PIB, ou aproximadamente R$ 420 bilhões/ano, em valores atualizados. A farra nos gastos públicos se repetiu com a concessão desses privilégios no último ano da presidente Dilma, quando já tinha atingido o nível de 4,33% do PIB, ou, em valores de hoje, R$ 506 bilhões/ano. O problema permanece em 2024, ano que deve fechar no absurdo índice de 5,50% do PIB. Merece destaque a versão preliminar dos estudos da FGV, de novembro. Amparada nos dados oficiais da Secretaria da Receita Federal e das Leis de Diretrizes Orçamentárias (LDOs) dos Estados brasileiros, essa versão sinaliza que no ano as renúncias fiscais do governo geral atingirão patamar ainda maior, de 6,9% do PIB, o correspondente a R$ 807 bilhões/ano, ou seja, mais de 20% do total da carga tributária nacional. A dimensão da gravidade pode ser aferida por meio da comparação do excesso da gastança da máquina pública (12,8% do PIB) com a média dos 38 países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), de apenas 9,8 do PIB com a mesma despesa. Se somadas as despesas com o gigantismo do setor público, com os gastos tributários, e com a corrupção do setor público (2,5% do PIB, segundo estimativa das instituições), a conclusão é a de que todo esse desperdício que poderia ser evitado chega a 38% de toda a carga tributária nacional, já bastante pesada para as pessoas físicas e jurídicas. Não há defesa para essas priorizações equivocadas dos governos brasileiros pós-1997 quando se olha para os indicadores sociais e se constata sua degradação. Um exemplo é o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), medido a partir das condições de educação, renda e bem-estar da população. Nesse índice, o Brasil caiu da 77ª posição em 2002 para a 88ª ou 89ª colocação mundial em 2024. No coeficiente Gini, que mede a distribuição de renda nas nações, o País está estagnado, nas últimas décadas, entre as dez piores nações do planeta. Vergonhoso também é o desempenho brasileiro no Índice de Retorno de Bem Estar à Sociedade Brasileira (IRBES), estacionado na última posição entre os 30 países de maior expressão econômica e com maior carga tributária. Traduzindo: o Brasil cobra muitos impostos de seus cidadãos, porém devolve a eles muito pouco em qualidade de vida. Também não há nada a comemorar quando a questão é o combate à corrupção porque da 69ª posição mundial em 2002 caímos em 2024 para a 104ª colocação, de acordo com levantamento da Transparência Internacional. A educação é outro exemplo do fracasso administrativo das últimas décadas. Entre 56 países – os 38 membros da OCDE e mais 18 nações convidadas pela instituição –, o Brasil ficou na desonrosa 44ª posição em 2024. E, como se não bastasse, o cidadão brasileiro vive com medo: o País é recordista mundial em número absoluto de homicídios intencionais, índice que retrata bem a situação da segurança urbana. Durante décadas, o discurso do governo foi de que não se via a necessidade de corte de gastos, de que a pressão por essa medida era resultado da insensibilidade dos super ricos que não querem pagar impostos sobre seus ganhos, e outros argumentos do gênero. No início de dezembro, com atraso injustificável, o governo apresentou medidas para o corte de R$ 327 bilhões, nos próximos seis anos, sendo de R$ 70 bilhões no biênio 2025/2026. O mercado reagiu mal porque foi uma decisão tardia, mal explicada e insuficiente. Afinal, se tais medidas tivessem sido anunciadas há nove meses, em março, a taxa de juros Selic não estaria nos níveis de hoje. Com anúncio mais cedo, tampouco o País teria inflação superior a 4,7% ao ano, acima do teto da meta. Isso porque, em março de 2024, o Brasil tinha taxa Selic de 10,50% a.a. e a dívida pública do governo geral (União, Estados e Municípios) não ultrapassava R$ 8,3 trilhões. A demora provocou desconfiança e a escalada dos juros. Será um preço alto a ser pago pelo povo brasileiro por culpa da teimosia e da arrogância dos governantes. Para quem acredita que não haveria outra saída, basta lembrar que o governo poderia fazer cortes no excesso de gasto com o funcionalismo público, hoje consumindo R$ 351 bilhões por ano, ou 3% do PIB. Poderia ainda reduzir os gastos tributários, atualmente de R$ 646 bilhões/ano, que correspondem a 5,5% do PIB. Ou atacar a corrupção, responsável por desvio de 2,5% do PIB que, se reduzido a 1,5%, representaria cerca de R$ 175 bilhões. Somente com essas três frentes a economia seria de R$ 1,17 trilhão por ano. Cabe ao governo entender que melhor forma de governar e administrar é prEver e não prOver. Uma simples troca de vogal mudaria a ação do Estado brasileiro porque significaria a diferença entre planejar e buscar alternativa a uma UTI ou recorrer ao Corpo de Bombeiros. Medidas emergenciais nunca serão capazes de superar os resultados de bom planejamento. Gastança gera déficit, que por sua vez produz dívidas. E essas dívidas implicam em pagamentos adicionais de juros. Esse círculo vicioso vai sangrando o Tesouro, o que significa a redução dos recursos necessários no investimento em serviços essenciais. Os reflexos são inevitáveis: queda na qualidade de vida e empobrecimento da população, que parece condenada a pagar pelos equívocos dos governantes. O Brasil precisa de todos os cidadãos, independentemente de suas condições financeiras e de seu nível de escolaridade. E é necessário fazermos uma reflexão sobre a responsabilidade de todos os 212,6 milhões de brasileiros, que elegeram democraticamente todos os governantes pelo voto popular porque respondemos por nossas escolhas e decisões. Fica o ensinamento de que nas próximas eleições temos que votar com mais consciência e não apenas na base da simpatia ou das promessas do candidato. Afinal, como afirmava corretamente o pensador, orador e líder político norte-americano do século 19 Robert G. Ingersoll, “não há no mundo nem recompensa, nem castigo, o que há são consequências”. Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

Card link Another link

ˇ

Atenção!

Esta versão de navegador foi descontinuada e por isso não oferece suporte a todas as funcionalidades deste site.

Nós recomendamos a utilização dos navegadores Google Chrome, Mozilla Firefox ou Microsoft Edge.

Agradecemos a sua compreensão!