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Como pensar como um economista
Luiz Alberto Machado escreve sobre o mais recente livro do economista Robbie Mochrie
Luiz Alberto Machado, economista e colaborador do Espaço Democrático Em 2019, o Espaço Democrático publicou o livro Viagem pela economia, de minha autoria, saudado por Guilherme Afif Domingos como "um interessante passeio pela história do pensamento econômico, pelo desenvolvimento dos países e pelas ideias e políticas predominantes nas diferentes fases da evolução econômica". No prefácio, Manuel Enriquez Garcia, presidente da Ordem dos Economistas do Brasil, assinalou que "a abordagem do livro não se encerra com John Maynard Keynes e seus contemporâneos como a maior parte dos livros sobre o tema; vai além, por isso esta obra passa a ser mais cativante". Surgiu agora, em 2025, outro livro que também se propõe a explorar a evolução das ideias e do pensamento econômico de suas origens à atualidade, e o faz com enorme competência. Escrito por Robbie Mochrie, colunista no The National, que dá aulas de economia há mais de trinta anos para estudantes, CEOs e adultos interessados no tema, Como pensar como um economista, publicado neste ano pela editora Astral Cultural, vai muito além de outros livros do gênero, não apenas pelo texto extremamente acessível, mas por também incluir expressivo número de economistas contemporâneos, razão pela qual focaliza tópicos que a teoria econômica só passou a explorar recentemente. A acessibilidade do texto se explica pela larga experiência do autor que, como jornalista e professor, precisa se preocupar permanentemente com a escolha precisa das palavras, de tal forma que, sem perder o grau de profundidade adequado, possibilite ao leitor ou ao aprendiz a rápida compreensão do que está lendo ou ouvindo. Quanto ao conteúdo, Mochrie cobre extenso período, iniciando antes mesmo do aparecimento do estudo sistemático da economia, o que só viria a ocorrer na segunda metade do século 18, como ramificação do pensamento iluminista, que teve forte influência na primeira metade do século em toda a Europa, contrapondo-se ao absolutismo político e intervencionismo econômico típicos da visão mercantilista, que predominava desde o final da Idade Média. Tendo como propostas básicas a defesa da liberdade em todas as suas dimensões (liberalismo), a afirmação dos direitos individuais (individualismo) e a supremacia da razão (racionalismo), o Iluminismo deixou extenso legado que se espalhou pelos campos do direito, da política, da economia, da filosofia e das ciências em geral. Sendo assim, os dois primeiros capítulos, versando sobre Aristóteles e Tomás de Aquino, focalizam ideias e ações econômicas que prevaleceram na Antiguidade e na Idade Média, quando as prioridades eram de caráter político, social, místico ou religioso. A partir do terceiro capítulo, o autor expõe as contribuições de conhecidos economistas que influenciaram o pensamento e inspiraram teorias e políticas econômicas até meados do século 20, tais como Adam Smith, David Ricardo, Thomas Malthus, John Stuart Mill, Karl Marx, William Stanley Jevons, Carl Menger, Léon Walras, Alfred Marshall, Joseph Schumpeter e John Maynard Keynes. Esses economistas apresentaram suas ideias no contexto da revolução industrial inglesa (Smith, Ricardo e Malthus) e no período imediatamente posterior (Mill, Marx, Jevons, Menger e Walras), quando se utilizava a expressão economia política (political economy). Na sequência, vem a fase de transição para a teoria econômica (economics), nitidamente presente nas ideias de Alfred Marshall, responsável em grande parte pela incorporação da matemática na economia, como fica claro no trecho que se segue (p. 88): “Essa abordagem gradual do estudo da economia, por meio de uma base sólida em matemática e ética, explica como Marshall se tornou a pessoa adequada para a tarefa de transformar a economia política em uma ciência econômica reconhecidamente moderna. Ele tinha habilidade técnica, então pôde facilmente se basear nos exemplos aritméticos de Ricardo e na exposição de Mill sobre processos econômicos. Também pôde se envolver com a base ética tradicional do argumento econômico enquanto criava as novas técnicas de resolução de problemas que a disciplina precisava para se tornar autônoma e, finalmente, se separar da ética”. Fechando essa parte do livro, as contribuições de Schumpeter com a destruição criativa, e de Keynes propondo uma intervenção parcial do governo na economia com o objetivo de retomar o nível de atividade fortemente abalado pela Grande Depressão. É a partir do décimo primeiro capítulo, dedicado a Friedrich Hayek, que o livro de Mochrie assume seu lado mais inovador, pois se debruça sobre a vida e, principalmente, sobre as contribuições de autores que tiveram e têm impacto considerável na realidade contemporânea, muitos dos quais desconsiderados nos mais conhecidos livros-texto de teoria macro e microeconômica e, em especial, de história do pensamento econômico (HPE). Além de Hayek, outros economistas mencionados por Mochrie são John von Newmann, Ronald Coase, Milton Friedman, Paul Samuelson, Herbert Simon, Thomas Schelling, Robert Solow, Gary Becker, Elinor Ostrom, Daniel Kahneman, Amos Tversky, Robert Lucas, George Akerlof e Esther Duflo. Chama atenção, nessa fase mais recente, a presença de pesquisadores de outras áreas do conhecimento que passaram a interagir com a economia, a ponto de alguns serem laureados com o Prêmio Nobel de Economia, como foram os casos dos matemáticos John Nash (contemplado apenas marginalmente no livro) e John von Newmann e dos psicólogos Daniel Kahneman e Amos Tversky. A esse respeito, vale a pena reproduzir o trecho referente à contribuição conjunta de Kahneman e Tversky, principais responsáveis pela disseminação da economia comportamental (p. 222): “No campo da economia, duas cabeças quase sempre pensam melhor do que uma. Grandes ideias tendem a surgir do trabalho em equipe. Mesmo assim, a parceria entre os psicólogos Daniel Kahneman e Amos Tversky foi excepcional. Em primeiro lugar, foi longeva, durando mais de 25 anos e só terminando com a morte de Tversky, em 1996. Em segundo, foi imensamente produtiva no estabelecimento da economia comportamental moderna. O trabalho dos dois rendeu a Kahneman o Prêmio Nobel de Economia em 2002 (se Tversky estivesse vivo, sem dúvida teriam compartilhado o prêmio). A relação de trabalho era tão próxima que, assim como Lennon e McCartney, nem sempre ficava claro quem havia feito o quê”. Os capítulos 20 e 24 são dedicados respectivamente à norte-americana Elinor Ostrom e à francesa Esther Duflo, as duas primeiras mulheres contempladas com o Prêmio Nobel de Economia, sem dúvida um indicador da democratização e da modernização da própria ciência econômica. Ostrom foi laureada em 2009 (quando dividiu o prêmio com Oliver Williamson) por suas análises de governança econômica, especialmente dos bens comuns. Duflo compartilhou o Nobel em 2019 com Abhjit Banerjee (seu marido) e Michel Kremer por sua abordagem experimental para aliviar a pobreza global. Por tudo isso, recomendo vigorosamente a leitura de Como pensar como um economista, um livro que consegue entregar o que se propõe na chamada de capa: "Grandes economistas que moldaram o mundo e o que eles têm para nos ensinar". Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.
Card link Another linkTrês cenas rápidas
O Brasil é um lugar onde as coisas mais bizarras podem acontecer, escreve o cientista político Rubens Figueiredo
Rubens Figueiredo, cientista político e colaborador do Espaço Democrático Edição Scriptum Cena 1. “Vamos supor que Trump fosse presidente aqui no Brasil” e resolvesse aplicar um tarifaço planetário, especula o articulista Pedro Fernando Nery, do jornal O Estado de S.Paulo (8/4/2025). Não iria dar certo. Um juiz federal de alguma cidade minúscula suspenderia em todo o País a taxação de fertilizantes, a pedido dos produtores rurais goianos que se sentiriam lesados. Outras liminares se multiplicariam na primeira instância, agora invocando direito tarifário adquirido ou dignidade da pessoa humana consumidora. Racionalização dos gastos públicos, o chamado Doge de Elon Musk? Nem pensar, explica Nery. “O Doge brasileiro iria avaliar servidores que seriam demitidos por mau desempenho, mas eles seriam reintegrados, pois o nosso Doge precisaria de lei complementar para fazer isso, e a que FHC enviou nos anos 1990 ainda não foi aprovada”. Seria criada a Assedoge, associação dos servidores da Doge, já que a nossa Doge, criada para enxugar os gastos do Estado brasileiro, necessitaria de seu próprio corpo de funcionários, provavelmente muito maior e mais caro do que o contingente que seria demitido. Cena 2. Estamos acostumados com nomes e sobrenomes italianos, árabes, alemães, japoneses, judeus, espanhóis. Alguém que se apresenta como Giovanni Brunello de Montalcino de la Piastra Chianti Mastroianni podemos até aceitar sem grande esforço. Mas o que pensar de um brasileiro ter grafado em sua carteira de identidade o improvável nome Edward Albert Lancelot Dodd Canterbury Caterham Wickfield? É algo digno de uma criação de Spielberg. E mais: esse descendente de ingleses, que teria vindo parar aqui impulsionado só Deus sabe por quais correntes marítimas, viesse a ser juiz de Direito, julgando provavelmente, entre outros, delitos parecidos com o seu? Pois é: Edward Lancelot falsificou seu nome e o usou na nossa operosa Justiça por mais de 30 anos. Pode? Cena 3. O Brasil é superlativo. Tem 418 empresas estatais, o maior contingente entre as nações da OCDE. Em 2024, as estatais federais registraram um déficit de R$ 6,73 bilhões, recorde da história, segundo o Relatório das Estatísticas Fiscais do Banco Central. São 1.800 apetitosos cargos de livre provimento. Várias estatais têm Conselho e os Conselhos são formados por conselheiros. É uma festa. Tem historiador no Hospital de Clínicas de Porto Alegre, especialista em regulação de telecomunicações na Companhia das Docas da Bahia, filósofo na Securitizadora do Banco do Brasil, doutor em ciências da saúde na Companhia Docas do Rio Grande do Norte e por aí vai. Quase todos ligados ao PT. Poderíamos pensar, em uma reflexão mais açodada e com alguma carga de maldade, que essas nomeações desconexas estariam relacionadas à influência política ou preferências partidárias. Ledo (e Ivo) engano! As estatais dão prejuízo que afeta a todos nós, mas têm conselhos holísticos, “transprofissionais”. Quem acompanha os debates sobre os trabalhadores do futuro, certamente está informado de que o aspecto interdisciplinar será decisivo. Diploma se tornará algo acessório. Daqui a 30 anos, qual será a utilidade de um sapateiro, por exemplo? Será conselheiro de estatal, certeza. Pensamento crítico, enxergar conexões, visão social, abordagem holística, isso é que vai fazer a diferença. Com essas nomeações, as estatais brasileiras, na verdade, dão um exemplo ao mundo de sua capacidade de antecipar tendências na busca permanente da eficiência e do bem-estar da população. Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade de seus autores e não representam necessariamente a opinião do PSD e da Fundação Espaço Democrático. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.
Card link Another linkPalestra: a proibição de celulares nas escolas
Hubert Alqueres, membro do Conselho Estadual de Educação de São Paulo, falou sobre o tema no Espaço Democrático
Redação Scriptum
A proibição do uso de celulares nas escolas de ensinos fundamental e médio — sancionada em dezembro pela Assembleia Legislativa de São Paulo e, em janeiro, pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em âmbito nacional — já começa a apresentar efeitos positivos. Ainda assim, o uso pedagógico dos dispositivos móveis não deve ser descartado. “Esse é um tema importante, que preocupa não apenas as escolas, mas toda a sociedade”, afirmou o educador Hubert Alqueres, presidente da Academia Paulista de Educação e integrante do Conselho Estadual de Educação.
Durante palestra no Espaço Democrático — fundação para estudos e formação política do PSD — Alqueres, que foi secretário estadual da Educação em São Paulo e é vice-presidente da Câmara Brasileira do Livro, ressaltou que “o trabalho pedagógico com tecnologia digital é indispensável na educação contemporânea”. Diretor do Colégio Bandeirantes, uma das mais tradicionais escolas particulares de São Paulo, ele relatou que parte do conteúdo hoje é transmitido aos alunos por meio de tablets. “Mas sempre sob controle e orientação dos professores.”
Ao abordar os efeitos do uso excessivo de celulares por crianças e adolescentes, Alqueres citou o psicólogo e professor norte-americano Jonathan Haidt, autor do livro Geração ansiosa. “Ele apresenta evidências sólidas do impacto negativo da hiperconectividade na saúde mental e no processo de aprendizagem.”
Entre os problemas mais recorrentes, o educador destacou a perda de concentração: “O celular, se usado sem controle, é inimigo do aprendizado. Não faz sentido que um estudante, durante a aula, acesse o aparelho para buscar assuntos alheios ao conteúdo do que está sendo trabalhado pelo professor.” Outro aspecto preocupante é a redução das interações sociais nos intervalos. “Temos visto menos crianças brincando em grupo e mais alunos isolados, cada um vidrado na própria tela.”
Alqueres também mencionou os riscos associados à exposição nas redes sociais, especialmente sem supervisão. “É um ambiente onde circulam conteúdos nocivos e perigosos, com registros inclusive de incentivo à automutilação ou participação em jogos de azar ou em grupos de ódio.”
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Segundo ele, muitas escolas particulares paulistas já haviam adotado regras para restringir o uso de celulares antes mesmo das leis entrarem em vigor. As primeiras informações recebidas pelo Conselho Estadual de Educação indicam efeitos positivos. “Casos de abstinência digital, como ansiedade ou irritabilidade, têm sido raríssimos, e os professores relatam melhora no ambiente escolar.”
A reunião semanal do Espaço Democrático foi coordenada pelo jornalista Sérgio Rondino e contou com perguntas e comentários de diversos participantes, entre eles: João Francisco Aprá (superintendente da fundação), os economistas Felipe Salto, Luiz Alberto Machado e Roberto Macedo, os cientistas políticos Rubens Figueiredo e Rogério Schmitt, o sociólogo Tulio Kahn, os gestores públicos Mário Pardini e Januario Montone, o médico e ambientalista Eduardo Jorge, o advogado Roberto Ordine, a secretária nacional do PSD Mulher Ivani Boscolo e o jornalista Eduardo Mattos.
Card link Another linkO salto de fé e a administração pública
Para Tulio Kahn, às vezes falta ao gestor público a coragem de um Indiana Jones para perseguir seus objetivos