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1. As origens do democratismo: Jean-Jacques Rousseau

Não se tratava de modalidade democrática, mas de retórica em nome da democracia. O centro da proposta de Rousseau consistia na convicção de que a democracia poderia ser imposta de cima e resultaria de um novo modelo de sociedade.

 

Durante muito tempo, a doutrina criada por Jean-Jacques Rousseau (1712/1778) foi denominada de liberalismo radical. Entretanto, detendo-se sobre  o curso histórico das idéias políticas no país natal e ao verificar a influência que ali exerceu, o renomado historiador português Joel Serrão (1919/2008) considerou inapropriada a denominação. Levou em conta que o processo de gestação da doutrina que viria a merecer o nome de liberal, na Inglaterra, só muito tardiamente  enfrentou o problema da democratização da representação política bem como a circunstância de que o tema de que se ocupava (determinar experimentalmente como deveria estruturar-se o governo representativo, depois denominado de monarquia constitucional) não figurava na pauta da doutrina de Rousseau.

Ocorreu-lhe denominá-lo de democratismo porquanto o centro da proposta de Rousseau consistia na convicção de que a democracia poderia ser imposta de cima e resultaria de um novo modelo de sociedade, modelo este experimentado no curso da Revolução Francesa, revelando-se  incapaz de criar instituições capazes de substituir a luta armada pela negociação entre os interesses em conflito. Não se tratava portanto de modalidade democrática mas de retórica em nome da democracia. Assim, chamou-a de democratismo, que lhe pareceu destacaria desde logo tratar-se de outra coisa e não da ideia de democracia que acabaria firmando-se no seio da cultura ocidental. Entre outros textos dedicou ao tema o ensaio “Democratismo versus liberalismo” (in O liberalismo na península Ibérica na primeira metade do século XIX. Lisboa. Sá da Costa, 1982. vol. 1).

Rousseau somente se interessaria pela política, entendida como mecanismo de reforma social, quanto estava próximo dos quarenta anos de idade. Em 1754 publica Discursos obre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens e, em 1762, O contrato social, livros que contêm o essencial de sua doutrina. A esse projeto reformador acha-se vinculado o texto pedagógico que intitulou Emílio ou sobre a educação (1862).

Como se tratava de uma pregação abertamente revolucionária, isto é, incitadora da violência, o governo decide proibi-la. Até então não se assinalam indícios de aceitação ou popularidade. Depois de sua morte (1778) é que passa a ser considerado. Nos anos oitenta procede-se à reedição de seus livros. A Revolução Francesa lhe proporcionaria uma verdadeira consagração. Em 1790 seu busto é triunfalmente carregado pelas ruas de Paris.

Rousseau popularizaria a ideia de que os sentimentos humanos seriam originalmente bons, devendo-se sua corrupção à sociedade. Para  superar esse estado de coisas deve-se partir daquilo que o coração tem de evidente. Recorrendo-se a esse expediente, o primeiro passo para estabelecer relação adequada com o Deus infinitamente potente e sábio cumpre eliminar toda intermediação das tradições sedimentadas pelas religiões estabelecidas. Chegará assim a um modelo de religião a ser adotada pela nova sociedade a ser erigida. Para tanto, será necessário eliminar todas as instituições que impedem a legítima expressão do homem natural, não corrompido pela cultura. É preciso chegar ao que chama de democracia completa e radical.

Tanto a Revolução Francesa como as manifestações do democratismo em diversos países do Ocidente mostraram onde pode conduzir o tipo descrito de idealização.


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