Na atualidade é muito difícil dar-se conta da grande desmoralização da ideia de democracia, à vista dos desacertos da Revolução Francesa. De um modo geral, na primeira metade do século XIX era avaliada negativamente porquanto nenhum dos ideais que proclamara haviam sido alcançados. A par disto, a desordem que instaurou na França – e em diversos outros países europeus – era atribuída à democracia, na época autêntico sinônimo de anarquia e desordem.
O sistema representativo consolidado na Inglaterra durante o século XVIII significava uma expressiva ampliação da elite com ingerência no poder. Ainda assim, estava longe de corresponder a um sistema democrático, na medida em que a elite proprietária disponha do monopólio da representação, embora se tratasse de mecanismo governamental contraposto ao absolutismo monárquico. Deste modo, naquela fase histórica, o ideal democrático acabaria associado à Revolução Francesa.
Do ponto de vista dos contemporâneos, enquanto o sistema elitista vigente na Inglaterra lograra retirar o país do atoleiro das guerras civis e garantir conjunto expressivo de liberdades públicas (liberdade de imprensa, habeas-corpus, etc.), a democracia – entenda-se a Revolução Francesa – trouxera muitos sofrimentos ao povo francês; se bem tivesse havido inquestionável disseminação da propriedade, no meio rural, seguida da abolição de tributos e encargos de índole medieval.
Ainda que na França, depois da queda de Napoleão, assumido o poder um grupo político (os “ultras”) decidido a restaurar o Antigo Regime, as simpatias todas confluíam para o sistema constitucional, afeiçoado ao modelo inglês. Francamente contraposto ao sistema democrático (Revolução Francesa) essa vertente proporcionaria inclusive elaboração teórica de grande densidade, o chamado liberalismo doutrinário. Mas a questão democrática equivalia a sinônimo de anarquia e desordem.
O curso histórico iria demonstrar que a idéia da adoção de uma constituição, como forma de assegurar a substituição da monarquia absoluta, para grandes contingentes populacionais, iria achar-se associada à idéia de sufrágio universal, sem dúvida alguma oriunda do democratismo. Ganhando força sobretudo nos anos quarenta, essa proposição assumiu, na Inglaterra, a forma chamada de “movimento cartista”. Correspondia a uma espécie de sub-produto do sindicalismo radical, que deu origem à primeira fase das Trade Unions, organizadas para impedir a introdução de máquinas (substitutivas da mão-de-obra) nas manufaturas, forma dominante da atividade industrial que então tinha lugar.
Como reação ao que considerava limitações da Reforma de 1832, a Carta da Liberdades do Povo propugnava, como foi referido antes, em primeiro lugar, o mencionado sufrágio universal, seguido da adoção do voto secreto e de eleições anuais, supressão da exigência de renda como condição para dispor do direito de fazer-se representar e remuneração aos deputados –pontos estes que apontam desde logo para a a condição de não-proprietário de seus postulantes. Tratando-se das idealizações da pessoa humana, presentes à cultura francesa, seriam inevitavelmente ignoradas pala elite inglesa, que, na matéria, prosseguiu na cautelosa experimentação de paulatina ampliação do número de votantes.