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{ BREVE HISTÓRIA DO PENSAMENTO POLÍTICO }

Capítulo 2 – Aristóteles, figura central do chamado “milagre grego”

Filósofo grego foi aluno de Platão, professor de Alexandre, o Grande, e fundador do Liceu

Antonio Paim, filósofo e historiador (*)

 

Pela obra monumental que realizou, no sentido do ordenamento geral do saber, Aristóteles é a figura central do período histórico chamado “milagre grego”, que compreende aproximadamente de meados do século V antes de Cristo, quando se inicia o governo de Péricles em Atenas, aos fins do século IV a.C., quando a Grécia perde a independência para a Macedônia.

Costuma-se indicar que Aristóteles teria nascido no ano de 384, em Estagira, na Macedônia (sendo por isto, às vezes, chamado de “o Estagirita”). Tornou-se discípulo de Platão, em Atenas, durante cerca de vinte anos. Quando este faleceu (em 348), viajou pela Ásia Menor, estabelecendo-se finalmente na Corte do rei Felipe da Macedônia, onde foi preceptor de seu filho Alexandre, conquistador do mundo que tornou-se conhecido em sua época como O Grande.

Em 335, Aristóteles regressou a Atenas, onde fundou a sua própria escola, o Liceu. Em 323 foi obrigado a abandonar a cidade devido à perseguição que lhe moviam os inimigos do ocupante macedônio. Faleceu no ano seguinte, com presumíveis 62 anos de idade.

Com a perda de independência da Grécia, primeiro para os macedônios e depois para Roma, vitimada também pelas subsequentes invasões bárbaras, a obra de Aristóteles virtualmente desapareceu. Os árabes é que se ocuparam de sua reconstituição, reintroduzindo-a na Europa através da Espanha.

A tradução de textos gregos ao latim inicia-se no século XI, pelas obras relacionadas à medicina. A versão de textos aristotélicos começa no século XII, em Toledo. Por volta de 1165, chega àquela cidade Geraldo de Cremona, de quem se sabe pouco além do fato de que, sozinho, traduziu 71 textos gregos de Aristóteles, Euclides, Arquimedes, Galeno e outros.

A familiaridade adquirida com a filosofia aristotélica por pensadores árabes e judeus obrigaria, finalmente, os cristãos a tomarem conhecimento dela. Este processo se dá sobretudo a partir do século XIII.

Segundo a informação que nos foi legada por Cícero, Aristóteles escreveu dois livros sobre O Político, inspirados pela obra de Platão, e quatro volumosos livros sobre A Justiça, todos desaparecidos. Também não se preservaram as memórias que teria escrito em tom de diálogo ou o livro sobre a monarquia, que Werner Jaeger imagina ter sido destinado à formação de Alexandre, de que se incumbira, a fim de, segundo afirma, “dar um novo conteúdo ético e espiritual à ideia tradicional do rei”.

Aristóteles colecionou e comentou Constituições, segundo os registros, em número de 158. Esses comentários iniciavam-se com o exame da Constituição de Atenas, único dos comentários que chegou até nós e que adiante se resume, sob a denominação de Política.

A obra está subdividida em oito livros, que por sua vez se subdividem em capítulos. Esquematicamente, o primeiro trata do conceito da política e da significação que deve ter o seu estudo. Diz-se ali que a cidade faz parte das coisas da natureza, que o homem está destinado a viver em sociedade, sendo um animal político, e somente os seres vis ou muito superiores se excluem da cidade. Nesse capítulo é patente a ausência de um conceito geral de “pessoa humana”, porquanto o que dignifica o grego é a condição de cidadão, que não pode ser alcançada, seja pelos bárbaros, seja pelos escravos.

Os Livros II e III têm sobretudo uma característica histórica porquanto se trata da obra de Platão e dos diversos homens públicos e dos próprios costumes políticos das diversas comunidades (Livro II), seguindo-se uma espécie de síntese acerca dos deveres dos cidadãos e dos governos. O fato de que o Livro III se encerre com indicações acerca do conteúdo do livro seguinte, que na verdade somente são retomadas nos últimos, levou a que se discutisse a ordem adequada.

Werner Jaeger – que proporcionou uma contribuição fundamental ao melhor entendimento do que se preservou de sua obra, no livro “Aristóteles: bases para a história de seu desenvolvimento intelectual” (trad. espanhola, México, 1946) – não enxerga maiores méritos nesse empenho de encontrar a ordem ideal, achando que mais importante seria compreender as razões pelas quais o livro acabou sendo ordenado da forma que se preservou. Ao seu ver, os Livros II e III não se constituem numa introdução à teoria geral do Estado, mas se propõem descrever o Estado ideal segundo pressupostos platônicos, com o propósito de encontrar uma posição independente do mestre.

Os Livros IV e V tratam da virtude e da educação, temas entremeados com problemas relacionados à organização das cidades. O que a posteridade entendeu como sendo a doutrina política de Aristóteles encontra-se basicamente no Livro VI. Ali descreve ele as formas clássicas de governo e procura indicar qual a melhor dentre elas. Coloca-se desde logo em polo oposto àqueles que procuram fixar, poderíamos dizer, abstratamente, a melhor constituição, quando o importante seria descobrir “o que é praticável”.

Nos capítulos iniciais aborda os tópicos adiante mencionados. A primeira regra seria conhecer as diversas formas de governo e as combinações possíveis. Contemporaneamente diríamos que Aristóteles trata não das formas de governo (de que decorre a bipartição clássica entre parlamentarismo e presidencialismo) mas das formas de Estado.

Estas distinguem-se pelo poder de um único (monarquia ou realeza), de uns poucos (aristocracia) ou de muitos (república). Na visão de Aristóteles, a diversidade de tais formas advém da diversidade dos grupos sociais existentes. Por isto, concluirá logo adiante: o governo adequado não pode achar-se dissociado da própria constituição da sociedade.

Cada um de tais modelos tem uma forma degenerativa: a tirania, no caso da monarquia; a oligarquia, no que respeita à aristocracia; e, finalmente, a democracia, quanto à república. A seu ver, essas formas degenerativas são todas condenáveis. Como é de seu estilo, Aristóteles quer fundar a própria opinião numa análise de caráter histórico, motivo pelo qual segue-se uma digressão desse tipo.

O caráter negativo da democracia acha-se examinado no capítulo IV e resulta sobretudo da demagogia, que seria inerente à sua prática. No capítulo V estão relacionadas as espécies de oligarquia.

No Livro subsequente (VII), essas mesmas questões estão examinadas mais detidamente. No do Capítulo V está apontada uma característica inferida da análise precedente, de que se valerá para responder à pergunta inicial, isto é, a tese de que o nome de aristocracia é “a única denominação adequada para designar o Estado no qual o poder se confia aos homens mais virtuosos, se se toma este nome no seu sentido absoluto”.

Os capítulos VI, VII e VIII examinam a república e a tirania. No capítulo IX retoma a pergunta inicial sobre a melhor forma de governo. A resposta de Aristóteles não é simples, desde que não se contenta com um modelo ideal, e, no fundo, a questão depende, em última instância, da própria sociedade. O melhor governo seria aquele que combinasse os aspectos positivos da aristocracia e da república, isto é, a presença no governo de pessoas virtuosas, sendo a sociedade composta de homens livres.

Para isto, contudo, seria essencial que não se compusesse de reduzido número de ricos, em presença de excessiva quantidade de pobres, mas contasse com o predomínio das camadas médias. Aqui Aristóteles retoma a sua teoria do justo meio, do equilíbrio entre os extremos, fundamental na “Ética a Nicômaco”. No último livro, Aristóteles examina a motivação que impulsiona as rebeliões e aponta os modos de conjurá-las.

 

(*) Este texto faz parte da série de 10 artigos escritos por Antônio Paim no início de 2021, pouco antes de sua morte

 

Revisão final de Rogério Schmitt


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